Castro Caldas refere dificuldades de Amaro da Costa para obter informações sobre venda de armas

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Júlio Castro Caldas Daniel Rocha

“A preocupação que Amaro da Costa me transmitiu era sobre a dificuldade de obter informação fidedigna sobre os mecanismos, sobre as sociedades que existiam, sobre a capacidade de tutela que o Ministério da Defesa tinha sobre a indústria militar que funcionava nessa altura”, disse.

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“A preocupação que Amaro da Costa me transmitiu era sobre a dificuldade de obter informação fidedigna sobre os mecanismos, sobre as sociedades que existiam, sobre a capacidade de tutela que o Ministério da Defesa tinha sobre a indústria militar que funcionava nessa altura”, disse.

Júlio Castro Caldas, ouvido esta terça-feira na X Comissão Parlamentar de Inquérito à Tragédia de Camarate, referiu que a conversa com Amaro da Costa decorreu no Parlamento, “num período de votação orçamental, algures em Outubro e Novembro”, pouco tempo antes da queda do avião que vitimou o então ministro da Defesa, Amaro da Costa, e o primeiro-ministro, Sá Carneiro, a 4 de Dezembro de 1980.

O ex-governante sublinhou que mais tarde, quando tutelou a pasta da Defesa, percebeu o quanto teria sido difícil, 20 anos antes, “tentar interferir em questões que estavam inclusivamente a coberto de regras de segredo de Estado e militar” e em que havia uma grande garantia de “reserva”.

“O Amaro da Costa teria tido essa conversa comigo porque não era fácil: o poder militar que existia na altura, as ligações que existiam às empresas privadas que operavam no sector da importação e exportação de armamento, estabelecer o exercício de uma tutela, esforço que ele fez e que me asseverou que estava a fazer”, disse.

Questionado sobre se tinha conhecimento da venda de armas para a guerra Irão-Iraque, tendo em conta que existia um embargo internacional, Castro Caldas disse que “mais tarde” veio a ter conhecimento de que “houve exportações para o teatro de guerra Irão-Iraque, designadamente da Extra, fábrica de explosivos da Trafaria, e dos invólucros de artilharia que eram fabricados na altura pela Cometna”. “Essa exportação, Portugal fê-la com grande lucro”, disse, acrescentando que não teve acesso a documentação que permita afirmar que existiu ou não um despacho autorizando essas exportações.

“A minha convicção, sem factos, é que o material foi exportado quer para o Iraque, quer para o Irão, através daquele que era o veículo tradicional de exportação que era desembarcar a mercadoria no Líbano e o acesso ser feito a partir daí aos beligerantes”, disse. Essa exportação, disse acreditar, era lícita, uma vez que “não havia embargo” à exportação dos “explosivos separados dos invólucros”.

Castro Caldas, que tutelou a pasta da Defesa em 1999 e foi relator da I Comissão Parlamentar de Inquérito à Tragédia de Camarate, criada no Parlamento para apurar as causas da queda do avião, respondeu a algumas das perguntas dos deputados afirmando que pode avançar com “conjecturas, mas não com factos”.