E se, de repente, um urso cruzar o seu caminho?
Pé ante pé, provavelmente mais cedo do que se esperaria, é possível que tenhamos outra vez ursos em Portugal dentro de dez a 20 anos.
Neste momento, não sendo impossível, é altamente improvável encontrar um urso em estado selvagem em Portugal, mas todos os dias essa improbabilidade diminui mais um bocadinho.
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Neste momento, não sendo impossível, é altamente improvável encontrar um urso em estado selvagem em Portugal, mas todos os dias essa improbabilidade diminui mais um bocadinho.
O que está a acontecer explica-se rapidamente. A partir do fim dos anos 50 do século XX, uma forte corrente migratória deixou campos e campos por trabalhar e explorar.
Este processo não é exclusivo de Portugal, desde a segunda guerra mundial que o abandono agrícola se vinha a processar de forma intensa em toda a Europa.
O processo não é uniforme em toda a parte, pelo contrário: a par do abandono em muitos sítios, há intensificação agrícola em muitos outros. Mas globalmente há uma diminuição da intensidade de uso do solo, permitindo à natureza europeia estar a recuperar há mais de 50 anos.
Este processo já permitiu, por exemplo, que o lobo tenha recolonizado a Alemanha, depois de duzentos anos sem registo de criação naquele país, ou que os lobos italianos tenham refeito a ligação com os lobos da Península Ibérica.
As primeiras áreas a ser abandonadas são sempre as menos produtivas, as que se localizam mais longe das aldeias, mas aos poucos os processos de recuperação alargam-se a áreas mais extensas.
Esta recuperação tem muitas consequências.No nosso caso, por exemplo, está na origem da alteração do problema do fogo. Onde antes tínhamos muitas queimadas, pouco intensas e em áreas mais ou menos delimitadas, temos hoje fogos muito extensos, severos e de elevada intensidade.
Mas, para o que agora aqui me interessa, a consequência mais visível é a expansão das matas, incluindo os carvalhais. Atrás da recuperação da vegetação vêm as espécies que dependem mais deste tipo de sistemas: corços, gaviões, esquilos, martas, lobos e, voltando ao princípio, ursos.
Na Península Ibérica subsistiam duas pequenas populações de ursos, que se supõe que tivessem contactos esporádicos e que têm vindo a crescer a taxas bastante interessantes e a aparecer cada vez mais longe dos núcleos duros conhecidos.
Para já, se encontrar um urso, dos verdadeiros, dos legítimos, em estado selvagem em Portugal, o que ainda é muito pouco provável, será com certeza um indivíduo divagante de uma destas populações em expansão.
Mas, pé ante pé, provavelmente mais cedo do que se esperaria, é possível que tenhamos outra vez ursos em Portugal dentro de dez a vinte anos.