Violência e videojogos
Historicamente os videojogos têm uma ligação com assuntos bélicos praticamente desde o inicio da indústria
Sempre que acontece (infelizmente) uma tragédia envolvendo tiroteios urbanos em sociedades ocidentais, não demora muito tempo para que os meios de informação procurem justificações para este tipo de acontecimentos. Entre uma das várias causas apontadas, estão os videojogos.
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Sempre que acontece (infelizmente) uma tragédia envolvendo tiroteios urbanos em sociedades ocidentais, não demora muito tempo para que os meios de informação procurem justificações para este tipo de acontecimentos. Entre uma das várias causas apontadas, estão os videojogos.
Particularmente, é nos EUA que estes eventos ganham mais força e não são raros os casos deste tipo de violência urbana. Mas, então, onde é que os videojogos e estas histórias de violência se enquadram?
Tudo começou
Historicamente os videojogos têm uma ligação com assuntos bélicos praticamente desde o inicio da indústria. Afinal tudo começou após a segunda guerra mundial, com as simulações de guerra feitas nos megas computadores que ocupavam edifícios inteiros, onde diversos engenheiros tentavam fazer predições sobre o resultado de futuras batalhas da guerra fria.
Quando finalmente a indústria comercial arrancou em 1972 nos EUA, o foco era na competição desportiva ou trivial, e não em assuntos bélicos. Pong ou Tennis foram os dignos representantes desta época. No entanto, a primeira consola doméstica (Magnavox Odyssey), inspirada em alguns brinquedos da época e na cultura popular dos Westerns, vinha igualmente com um periférico semelhante a uma espingarda.
Já perto do final dos anos 70, o foco direcciona-se para uma galáxia não muito distante. Apoiados pela popularidade de filmes como "Star Wars", os jogos centram-se na temática espacial, utilizando algum tipo de mecanismo relacionado com armas para a sua resolução (casos de Asteroids e Space Invaders). Curiosamente em 1977, irrompe a primeira polémica com jogos violentos. Death Race da Exidy, baseado no filme com o mesmo nome, é considerado ultra violento e as campanhas para banir o jogo nos EUA amontoam-se com alguns efeitos práticos.
Na década seguinte com o crash dos videojogos nos EUA, dá-se o apogeu da indústria japonesa e europeia, apoiadas em estilos inovadores. Do lado nipónico, popularizam-se nomes como Super Mario, Final Fantasy ou Zelda, enquanto da Europa, existem outros nomes sonantes, como Populus ou Tetris. Somente mais tarde, já dentro dos anos 90, o uso da arma-de-fogo em videojogos começa novamente a popularizar numa escala considerável. Não é por isso surpreendente que um dos jogos mais famoso desta época seja o norte-americano Doom. Um FPS inspirado em filmes como "Alien" e "Evil Dead II".
Na última década, com a massificação do 3D, a ficção científica recebe um impulso em vários pontos do entretenimento. E claro, Halo da Microsoft é reflexo desta nova tendência. É notável que a cada nova sequela do jogo, as vendas disparam e estabelecem recordes, ofuscando inclusive os maiores blockbusters do cinema. Já nos últimos anos, series como Call-of-Duty ou Medal of Honor, não lhe ficam muito atrás, tornam-se na face mais visível dos videojogos em diferentes médias e muitas vezes apoiam-se em conflitos bélicos onde os EUA estejam actualmente envolvidos.
Recentemente, segundo um estudo da University of Texas realizado em 2011, é igualmente curioso notar que desde o aparecimento dos jogos considerados ultra-realistas, sangrentos e violentos a taxa de criminalidade nos EUA tem decrescido consecutivamente.
Se existe realmente uma correlação entre videojogos e violência, é que estes não são iniciadores de comportamentos violentos, mas sim reflexo duma sociedade e da sua cultura. Quanto muito, as únicas provas concretas apontam que estes têm contribuído para a redução de crimes.
Tudo parte da educação
Ao contrário do que se possa pensar, tudo parte da educação, afinal um lápis, ou uma pedra também podem ser usados num contexto violento, mas, não são esses os iniciadores de comportamentos violentos. Vai sempre haver a mão por detrás do objecto. E é essa mão que necessita de ser educada para ter senso comum.
Os videojogos não serão certamente um meio tão influenciador como muitos pregam. Se isso fosse assim tão rigoroso, um jogador que dominasse o Tetris poderia ser igualmente influenciado a arrumar toda a sua casa da melhor forma possível. Mas, com toda a certeza isso não acontece. Os jogos são um reflexo da nossa cultura, apoiam-se nos nossos conceitos, não nos influenciaram severamente para outros. Está na nossa psique individual, afinal, existe uma boa razão por preferimos um determinado estilo ou género de jogo. Ou será um mero acaso que muitas mães nos anos 90 roubavam os Game Boy’s dos filhos só para desfrutarem deste popular jogo? Simplesmente, nós procuramos nos videojogos o reflexo das nossas expressões, não vamos construir alternativas extremamente distintas da nossa individualidade, só por causa destes.
Sim, existe uma relação entre videojogos e violência. É um facto. Mas afirmar que há violência por causa dos jogos é pouco rigoroso. O que temos é um meio de expressão artístico que é influenciado pela sociedade, e não o contrário.