França abre debate sobre suicídio assistido

Relatório encomendado por Hollande aconselha legislação sobre suicídio assistido para combater "medicina sem alma". Mais de metade dos franceses admitem "ajuda médica para morrer melhor".

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Quase 10% dos doentes internados ficam com uma infecção hospitalar Fernando Veludo/Nfactos

O estudo da Comissão de Reflexão sobre o Fim da Vida em França, que demorou seis meses a ser feito e que foi dirigido pelo professor Didier Sicard, é considerado um primeiro passo em direcção a uma nova “lei da eutanásia” e já está nas mãos de Hollande.

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O estudo da Comissão de Reflexão sobre o Fim da Vida em França, que demorou seis meses a ser feito e que foi dirigido pelo professor Didier Sicard, é considerado um primeiro passo em direcção a uma nova “lei da eutanásia” e já está nas mãos de Hollande.

O documento, que foi divulgado pelo jornal francês Le Monde e que contou com debates e 80 entrevistas directas, diz que é necessário regular a assistência médica para todos aqueles que pretendam “terminar a vida com dignidade”, insistindo que esta é uma das expectativas dos cidadãos. “É uma petição profunda de pessoas que não querem ver-se submetidas a um período de extrema vulnerabilidade e a uma medicina sem alma”, resumiu Sicard.

Poder interromper os tratamentos e utilizar formas de sedação terminal, em que os medicamentos conduzam ao coma e à morte, é um dos caminhos apontados pelo relatório. Mas o documento deixa claro que o doente deve fazer pedidos reiterados neste sentido e lamenta que a classe médica tenha evitado uma legislação sobre um tema que 80% a 90% da população quer que tenha linhas claras.

“Privilegiar as sedações ligeiras e curtas, por interesse do médico que não quer ser acusado de eutanásia, pode ser uma crueldade contra as pessoas”, diz o estudo. Isto porque, para Sicard, “a morte é o momento da vida em que a autonomia da pessoa deve ser mais respeitada”.

O que se faz na Europa
Por outro lado, é também sugerida regulamentação sobre o suicídio assistido, dizendo o relatório que o Estado deve “assumir a responsabilidade” de ajudar os doentes terminais que estejam conscientes de que não querem viver mais. Porém, o suicídio assistido só seria permitido a “pessoas afectadas por doenças degenerativas e incuráveis em estado terminal, para quem a perspectiva de viver a sua vida até ao final lhes pode parecer insuportável”. 

O suicídio assistido é actualmente permitido na Bélgica, no Luxemburgo, na Holanda e na Suíça. Na Alemanha existe uma proposta nesse sentido. Em Portugal foi este ano aprovado o testamento vital, que cria um registo nacional e regula o direito dos cidadãos sobre a prestação de cuidados de saúde em caso de incapacidade.

O estudo destaca também algumas desigualdades existentes em França no que diz respeito às decisões de fim de vida, nomeadamente os diferentes tratamentos que recebem os doentes no sector público e no sector privado, sendo que no primeiro caso ainda faltam unidades de cuidados paliativos que dêem resposta à actual procura.

O relatório, que foi elaborado por especialistas de várias áreas, como filósofos, juristas e médicos, sublinha que a responsabilidade por este tipo de decisões não pode ficar nas mãos de associações militantes a favor do direito de morrer e que deve ser o Estado a assumir este papel com regras claras. Apesar disso, o estudo deixa, para já, de fora a eutanásia activa, ou seja, as situações em que é o próprio médico a administrar directamente a medicação letal ao doente e recomenda apenas o suicídio assistido em que o doente é capaz de, sozinho, cumprir o último gesto.

Hollande pretende enviar ao Parlamento uma proposta de lei sobre o tema em Junho de 2013 e pediu um parecer ao Comité Consultivo Nacional de Ética de França sobre o relatório liderado por Didier Sicard. O Presidente pediu que o comité avaliasse três pontos específicos: as declarações antecipadas de vontade que os doentes deixam escritas; as condições em que se deve permitir que um doente consciente e autónomo ponha fim à sua vida; e as formas de tornar os últimos momentos de vida mais dignos depois do tratamento ter sido interrompido por vontade do doente.

No final de Novembro foi apresentado um outro estudo europeu que indica que mais de metade dos cidadãos de 12 países europeus inquiridos afirma que as pessoas devem ter a possibilidade de decidir quando e como morrer. Portugal está entre os dez países em que 75% ou mais têm essa opinião, segundo o documento encomendado por uma sociedade de advogados suíça. A direcção da Swiss Medical Lawyers Association (SMLA) justificou a realização do inquérito online com a necessidade de confirmar que, na maior parte dos países, as leis não reflectem a opinião dos cidadãos e também de contribuir, com dados, para eventuais iniciativas legislativas.

Para encontrar respostas foram ouvidas cerca de 12 mil pessoas do painel Isopubli, a empresa que elaborou o estudo em 12 países (Dinamarca, Alemanha, Finlândia, França, Grécia, Reino Unido, Irlanda, Itália, Áustria, Portugal, Suécia e Espanha). A versão resumida e gráfica dos resultados permite perceber que a ideia de que as pessoas devem ter o direito de decidir quando e como morrer é apoiada por mais de metade dos inquiridos de todos os países. Em Portugal, 79% apoiam a ideia e 16% discordam dela. A Alemanha e a Espanha aparecem como aqueles em que há maior percentagem de respostas positivas — 87% e 85 %, respectivamente — e no pólo oposto estão os gregos, 52% dos quais concordam com o direito à escolha e 37% desaprovam-no.