Jorge Miranda defende que é “indispensável” fiscalização do Orçamento

Painel de quatro constitucionalistas debateu os direitos sociais e os modelos de Estado Social permitidos pela Constituição. Catedrático Gomes Canotilho alerta para perigo de cidadania transformada numa lógica do "cliente".

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Constitucionalista teme "projecto neoliberal" de refundação do Estado social Enric Vives-Rubio

Acompanhado de outros três constitucionalistas – Gomes Canotilho, Jorge Reis Novais e Carlos Blanco de Morais –, que compunham um painel de debate sobre o Estado social, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Jorge Miranda acrescentou que a situação económica e financeira tem de se compaginar com a existência de direitos fundamentais. E que, em sua defesa, “a última palavra deve ser dos tribunais, não da classe política nem da classe dos banqueiros”.

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Acompanhado de outros três constitucionalistas – Gomes Canotilho, Jorge Reis Novais e Carlos Blanco de Morais –, que compunham um painel de debate sobre o Estado social, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Jorge Miranda acrescentou que a situação económica e financeira tem de se compaginar com a existência de direitos fundamentais. E que, em sua defesa, “a última palavra deve ser dos tribunais, não da classe política nem da classe dos banqueiros”.

Jorge Miranda voltou a insistir na necessidade de o Presidente da República solicitar a fiscalização preventiva de algumas normas do OE para 2013 e disse que pode estar em causa um “projecto de refundação do Estado neoliberal”.

O professor catedrático de Direito Constitucional voltou a defender, no âmbito da Educação, o ensino obrigatório como gratuito – sob pena de violar a Constituição –, e disse que o problema básico de sustentabilidade do Estado social é um problema de natalidade e não financeiro.

O também professor catedrático Gomes Canotilho, que se referiu à Constituição como “um amplo catálogo de direitos económicos, sociais e culturais”, defendeu que há uma falta de sintonia entre os discursos económicos e constitucionais. Canotilho disse ainda que, no “linguajar económico”, direitos económicos, sociais e culturais são “excepcionalmente públicos” e não “fundamentalmente públicos”.

Numa intervenção em que colocou a questão sobre como articular o Estado social com a crise fiscal do Estado, o professor de Coimbra criticou ainda os “intelectuais” que deixaram de questionar se uma medida é boa ou má, mas inquirem apenas se é eficaz, numa visão da política económica que se restringe a gerar recursos e não a redistribuir riqueza. Para Gomes Canotilho, a discussão pressupõe responder se há ou não jurisdição estatal e se estamos ou não ainda num Estado constitucional e democrático. “A pergunta é importante, porque, às vezes, parece que não”, disse.

Gomes Canotilho disse que o Direito Constitucional deve acompanhar o esforço de racionalização dos recursos, o que é diferente, disse, de “estar na transição para um Estado pós-social com subversão de alguma justiça social.” E justificou: “Não há cidadania que pressuponha o cidadão como cliente, utente e consumidor”. “Basta ver quem paga impostos: são trabalhadores e pensionistas”, acrescentou, em defesa da sua tese.

Direitos sociais custam dinheiro, diz Blanco de Morais
Já o constitucionalista Carlos Blanco de Morais criticou a maioria governamental, que não apresentou “uma ideia” para a reforma do Estado Social e disse acreditar que está em causa apenas “um corte de quatro mil milhões de euros sem critério” que não seja o dos credores internacionais.

O também catedrático de Direito defendeu, no entanto, que a Constituição está “hiperinflacionada” de direitos sociais, que “custam muito dinheiro”. Para o professor, houve um crescimento não sustentado do Estado Social e é necessário pensar o modelo de Estado tendo em conta os recursos financeiros disponíveis.

O constitucionalista defendeu ainda que terá de ser repensado o modelo de gratuitidade dos ensinos básico e secundário e que uma revisão das tarefas do Estado deve englobar sectores como as autarquias, o ambiente, as obras públicas e “até a cultura”.

O catedrático Jorge Reis Novais foi mais duro em relação às opções políticas do actual Governo de maioria e defendeu o Tribunal Constitucional (TC) como o garante dos direitos sociais como direitos fundamentais. Reis Novais disse que o TC deve intervir não para dizer se a carga fiscal deve incidir mais nos rendimentos do trabalho, na Saúde ou na Educação, mas se, dentro do quadro constitucional, o poder político tomou uma decisão que fere ou não os princípios constitucionais.

O constitucionalista exemplificou com o acórdão de 2012 e disse que, apesar de concordar com a decisão de inconstitucionalidade do corte dos subsídios de férias e de Natal aos funcionários públicos e pensionistas, discordou da sua fundamentação jurídica. E avisou que, se o OE for para o TC, a decisão pode não ser a mesma: “No acórdão de 2012, o TC disse que estava a fazer um controlo de evidência, a desigualdade não é tão ostensiva neste Orçamento”.

“Há um grande défice de funcionamento democrático, neste momento”, disse Jorge Reis Novais, acrescentando que, quando os cidadãos não encontram respostas no poder político, têm o TC.