Reinventando o conceito de pobreza escondida
Desperdiçou-se a oportunidade de aproximar da realidade os dados sobre os sem-abrigo, para pensar medidas de apoio e poupar este grupo a uma segunda forma de exclusão.
Habituámo-nos nos últimos anos a chamar às pessoas da classe média que caem na armadilha do desemprego os "novos pobres". Falamos, a propósito de muitas dessas situações, desconhecidas às vezes de familiares, amigos ou vizinhos, de "pobreza escondida". Mas, soubemo-lo esta semana, nos Censos de 2011 o Instituto Nacional de Estatística acabou por dar um novo significado a essa última expressão, pela forma como desperdiçou a oportunidade de radiografar a verdadeira dimensão do fenómeno dos sem-abrigo no nosso país.
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Habituámo-nos nos últimos anos a chamar às pessoas da classe média que caem na armadilha do desemprego os "novos pobres". Falamos, a propósito de muitas dessas situações, desconhecidas às vezes de familiares, amigos ou vizinhos, de "pobreza escondida". Mas, soubemo-lo esta semana, nos Censos de 2011 o Instituto Nacional de Estatística acabou por dar um novo significado a essa última expressão, pela forma como desperdiçou a oportunidade de radiografar a verdadeira dimensão do fenómeno dos sem-abrigo no nosso país.
Os velhos pobres - de número engrossado, diz quem anda no terreno, pela situação do país - são então a novíssima face da pobreza escondida, porque a outra, a envergonhada, sempre existiu. Pelo INE, sabemos que, em todo o país, serão 696 os sem-abrigo. Mas, só em Lisboa, o número é bem maior. E até no Porto, onde instituições no terreno falam num intervalo de 500 a mil pessoas sem casa, dificilmente será mais pequeno.
Em meados da década, admitia-se que o país tivesse 2500 a 3500 pessoas nessa situação. Ou seja, no nosso mais poderoso instrumento de produção de estatísticas que retratem a realidade dos portugueses, desperdiçou-se a oportunidade de, pelo menos, diminuir estes intervalos, de os aproximar de um número mais chegado à realidade, a partir do qual pudessem ser montadas, no terreno, com os recursos devidos, acções de minimização do sofrimento a que os sem-abrigo estão sujeitos.
Escondidas em fábricas ou prédios abandonados, alojadas transitoriamente em casas-abrigo, centenas de pessoas ficaram, então, de fora. Porque o conceito internacional usado pelo INE implica que elas estejam em jardins, estações de metro, paragens de autocarro, pontes, viadutos ou arcadas de edifícios. No Porto, bastaria entrar em algumas fábricas abandonadas de Campanhã, para perceber como o conceito, de tão redutor, acaba por falhar. Redundando numa outra forma de exclusão.