Governo húngaro muda lei eleitoral para garantir reeleição

A oposição já disse que “as próximas eleições não serão livres nem justas”. Especialista húngaro ouvido pelo PÚBLICO diz que nova lei é manobra do Governo para ser reeleito. Viktor Orban, que governa com uma maioria de dois terços, quer voltar a vencer em 2014.

Foto
Orban é acusado pela oposição de querer manipular os resultados eleitorais Bernadett Szabo/ REUTERS

 

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

 

O Governo húngaro defende esta nova lei como uma maneira de prevenir fraudes eleitorais, mas a oposição rejeita este argumento, evocando que as listas de eleitores na Hungria estão actualizadas.

A lei foi aprovada na tarde de quarta-feira, mas toda a gente já sabia que ia ser assim: o Fidesz, o partido do Governo húngaro, liderado pelo direitista Viktor Órban, tem uma maioria parlamentar de dois terços, o que lhe permite aprovar todas as leis que propuser.

Também vai passar a ser proibido fazer campanha eleitoral nos canais de televisão privados, que atraem grandes números de audiências. A campanha ficará, então, reservada para a televisão pública da Hungria, a Magyar Televízió, à rádio e à imprensa.

A oposição húngara tem criticado fortemente a nova lei eleitoral húngara. O socialista Ferenc Gyurcsany, que foi primeiro-ministro antes do actual Governo, afirmou que "as próximas eleições não serão nem livres, nem justas". 

Em entrevista telefónica ao PÚBLICO, Péter Krekó, do think tank de Budapeste Political Capital, defende a tese de que esta lei foi feita para facilitar a reeleição do partido que governa a Hungria, mas nada está garantido. "Este sistema é completamente novo, portanto não podemos garantir que o Fydesz vá beneficiar com ele. Ainda é cedo para calcularmos as mudanças que esta lei vai trazer", diz.

Ainda assim, avança algumas hipóteses prováveis. "O maior impacto poderá ser que os jovens se afastem ainda mais das eleições e do panorama político", diz. "Os jovens são por norma os últimos a decidir em quem votar", e o facto de agora terem de se inscrever numa lista eleitoral duas semanas antes das eleições para poderem exercer o direito de voto "vai ter um impacto político forte".

Numa sondagem publicada este mês pela agência Médian, 22% dos eleitores húngaros vão votar no Fidesz, seguindo-se 14% para o movimento "Juntos 2014" do socialista independente Gordon Bajnai. O partido socialista, o MSZP,  e o partido de extrema-direita, o Jobbik, recolhem ambos 10% de votos, segundo a sondagem. A maior fatia, ainda assim, vai para os eleitores indecisos: são ao todo 37%.

"Há um enorme número de eleitores indecisos, e são precisamente esses que o Fydesz quer evitar. O Governo olha para estes eleitores como uma possível ameaça", explica Krekó.

Do outro lado estão os pensionistas, que são eleitores praticamente garantidos pelo partido de Viktor Orban. Segundo avançou Krekó ao PÚBLICO, nas eleições que deram poder ao Fydesz, em 2010, dos 8 milhões de eleitores, 3 milhões eram pensionistas. "O Fydesz já está à espera dos votos de eleitores com rendimentos mais altos, que é a base eleitoral do partido, e dos reformados, que têm recebido vários benefícios durante esta legislatura de Orban. Com estes dois grupos, esperam garantir a reeleição.", refere.

Gordon Bajnai, antigo primeiro-ministros socialista e o maior rival político de Viktor Orban, disse que "a nova lei eleitoral é parcial e manipuladora, e a oposição deve arranjar maneira de fazer frente ao Governo num jogo onde este impôs as regras". Gordon Bajnai é visto como o principal rival político de Viktor Orban.

Impossível parar Orban

A maioria de dois terços no Parlamento por parte do Fydesz permite a este partido de direita aprovar todas as leis sem que as tenha de negociar com a oposição. 

Foi assim quando o Fydesz aprovou a nova Constituição da Hungria, que prevê menos poder para o Tribunal Constitucional. Em rigor desde o início do ano, a nova Constituição húngara torna possível serem tomadas decisões orçamentais no Parlamento sem que para isso tenham de ser aprovadas pelo Tribunal Constitucional.

Krekó, preocupado com o domínio absoluto de Orban e do seu partido, lamenta o bloqueio legislativo húngaro: "Não há maneira de parar esta nova lei eleitoral, nem nenhuma medida do Fydesz. E a partir do momento em que a Constituição da Hungria foi alterada, e o Tribunal Constitucional tem o dever único de defender a Constituição, então não pode dizer que estas medidas são inconstitucionais".
 

 

Notícia corrigida às 18h56: onde se lia "o partido do Governo húngaro (...) tem uma maioria parlamentar de três terços" lê-se agora "o partido do Governo húngaro (...) tem uma maioria parlamentar de dois terços".