Souto de Moura: "Faço croquis para me convencer de que o projecto é bom"

Pritzker da arquitectura expõe 42 desenhos na galeria João Esteves de Oliveira, em Lisboa. Vários são dos seus projectos mais marcantes, como o Mercado Municipal de Braga e Casa das Histórias

Foto
Burgo, Porto, tinta da China s/papel, 30 x 21 cm, assinado, 2004

Mas a escolha de desenhos, que foi da responsabilidade do galerista, contempla também esquisssos de projectos ainda por realizar, como o edifício City Life, em Milão, que será erguido junto a uma obra de outro Pritzker da arquitectura, a iraniana Zaha Hadid, ou mesmo croquis feitos para concursos que o arquitecto português perdeu, como o do Palácio de Congressos de Palma de Maiorca. E ainda esboços para um faqueiro e para uma caneta.

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Mas a escolha de desenhos, que foi da responsabilidade do galerista, contempla também esquisssos de projectos ainda por realizar, como o edifício City Life, em Milão, que será erguido junto a uma obra de outro Pritzker da arquitectura, a iraniana Zaha Hadid, ou mesmo croquis feitos para concursos que o arquitecto português perdeu, como o do Palácio de Congressos de Palma de Maiorca. E ainda esboços para um faqueiro e para uma caneta.

Souto Moura menoriza a relevância estética destes desenhos, sublinhando que os croquis de arquitectura servem um propósito técnico e “não são arte”, mas quando se propõe definir esses primeiros esquissos que faz de um projecto, chama-lhes “flashes visuais”, expressão que foi buscar a Herberto Helder, de quem é um apaixonado leitor, e explica que estas imagens, ou iluminações, lhe “chegam por intuição”. Um processo que parece ter bastantes semelhanças com o da criação artística, apesar de o arquitecto comparar os seus desenhos a “exercícios de aquecimento”, como “aqueles sons que os músicos fazem atrás do pano antes do concerto”, ou os passos e ritmos que os bailarinos treinam antes de subir ao palco.

Concede, contudo, que “os esquissos de arquitectura podem ser muito bonitos quando o arquitecto desenha bem, como o Álvaro Siza Vieira”, a quem, aliás, afirma ter ficado a dever os seus próprios progressos no desenho. “Quando comecei a trabalhar com ele, sempre que lhe dizia que queria fazer isto ou aquilo de determinada maneira, ele mandava-me desenhar, queria que eu mostrasse, visualmente, a solução que estava a sugerir.” João Esteves de Oliveira acha que Souto Moura está apenas está a ser modesto. “Em desenho livre, posso aceitar que Siza seja superior, mas os esquissos de arquitectura de um e de outro valem-se bem.”

“Faço esses croquis iniciais para eu próprio ver o projecto”, explica Souto Moura. Em certo sentido, começa pelo fim, pelo resultado a que gostaria de chegar. E isso, diz, é precisamente a razão pela qual os esquissos dos arquitectos costumam ser visualmente sedutores: “Os croquis são bonitos, porque queremos convencer-nos a nós próprios de que o projecto é bom, que a ideia vai resultar e que aquilo vai ficar bonito.”Os esquissos de Souto Moura são geralmente em formato não muito grande, porque os desenha nuns cadernos de formato A5, de capa dura e com folhas bastante grossas. “Gostei deles e comprei logo uns 30 ou 40.” Quando o desenho o exige — por exemplo o esquisso de um prédio alto, como a torre Burgo — usa duas páginas em plano. Além destes, também tem uns caderninhos mais pequenos, de capa preta, que andam no bolso e que se podem dobrar sem criar vincos. Nuns e noutros, não se limita a desenhar, mas aponta compromissos, anota contactos, organiza a sua agenda. O que, aliás, lhe criou alguns dissabores quando, na Suíça, lhe pediram para reproduzir um dos seus cadernos em fac-simile. “Houve arquitectos que me disseram que eu não tinha nada que estar a publicar os contactos deles...”

Confessa que “essa coisa de rasgar páginas dos cadernos” lhe faz “alguma impressão”, mas já cedera, há pouco tempo, quarenta desenhos ao Centre Georges Pompidou, em Paris, de modo que já não foi tão difícil aceder agora ao pedido de João Esteves de Oliveira.

Nesta sua crescente aposta no desenho de arquitectura, o galerista português diz ter sido uma referência importante a experiência da galeria nova-iorquina Max Protetch, que tendo ganho nome expondo artistas como Andy Warhol, Roy Liechtenstein ou Sol LeWitt, entre muitos outros, se voltou depois para o desenho de arquitectura, mostrando trabalhos dos grandes arquitectos contemporâneos, de Rem Koolhaas e Frank Gehry a Zaha Hadid ou Tadao Ando. Ironicamente, esta galeria acaba de fechar portas, mas aparentemente não devido à sua opção pelo desenho de arquitectura, que terá tido sucesso comercial, mas porque o seu fundador, Max Protetch, a vendeu e os novos proprietários não terão sabido prosseguir o projecto.<_o3a_p>
 
Uma das potencialidades comerciais dos esquissos de arquitectura, face a outro tipo de desenho, diz João Esteves de Oliveira, é a novidade: “Um coleccionador que tenha obras dos desenhadores mais consagrados dificilmente tem um desenho do Souto de Moura”. E se no desenho tradicional, são fundamentalmente a celebridade do autor e a qualidade da obra em causa que ditam o valor comercial, no desenho de arquitectura há que somar ainda um terceiro critério fundamental: a notoriedade do projecto a que deram origem. “Dois desenhos podem ter exactamente o mesmo valor plástico”, observa o galerista, “mas se um diz respeito a um projecto que nunca foi construído e o outro se transformou na Casa das Histórias, ou no Estádio do Braga, o segundo vale mais”.
 

Notícia corrigida no dia 23 de Novembro: altera a localização da Casa do Cinema de Manoel Oliveira