"A Farsa da Rua W" está de regresso a Lisboa

As personagens são figuras essencialmente cómicas por um efeito caricatural burlesco e estranho, o que as torna obviamente grotescas

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(Jorge Gonçalves)

No espectáculo “A Farsa da Rua W” percebe-se o cuidado com o significado das palavras, a farsa aparece numa duplicidade de sentidos: assiste-se a um embuste que a família encena de forma sistemática e no qual vive rotineiramente e, simultaneamente, valoriza-se a dimensão corporal das personagens em cena, os momentos de riso e de diminuição da tensão intercalam-se, a contracena é rápida, recursos à mímica, caretas e trocadilhos deixam claríssimo o género dramático dominante. As personagens são figuras essencialmente cómicas por um efeito caricatural burlesco e estranho, o que as torna obviamente grotescas.

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No espectáculo “A Farsa da Rua W” percebe-se o cuidado com o significado das palavras, a farsa aparece numa duplicidade de sentidos: assiste-se a um embuste que a família encena de forma sistemática e no qual vive rotineiramente e, simultaneamente, valoriza-se a dimensão corporal das personagens em cena, os momentos de riso e de diminuição da tensão intercalam-se, a contracena é rápida, recursos à mímica, caretas e trocadilhos deixam claríssimo o género dramático dominante. As personagens são figuras essencialmente cómicas por um efeito caricatural burlesco e estranho, o que as torna obviamente grotescas.

Uma família irlandesa reside em Londres sem que nunca saia de casa, passando os seus dias a encenar uma história de si mesmos, da sua própria família. A encenação é comandada pelo pai que altera a história conforme lhe vai convindo, prometendo até um prémio de melhor actor a quem mais se esforçar naquele dia. Esta encenação – a da acção – serve para camuflar crimes cometidos por aquele pai (uma figura quase ditatorial) e apaziguar as questões que os filhos têm sobre as suas recordações de infância. A dimensão política do espectáculo é clara naquilo que se pretende transmitir com a ocultação, a farsa e as directrizes de um criminoso detentor do poder.

Pretende-se claramente que o público reflicta na sua própria situação política, no binómio governante/governado, a fim de encontrar eventuais culpados. Curiosíssimo é o facto de, nos materiais de divulgação deste espectáculo, o nome do encenador não aparecer, fazendo essa ausência como que uma espécie de ponte entre a dimensão política do espectáculo e o prenúncio de morte nele impresso, quer seja na representatividade dos caixões na cena, pela menção constante de mortos ou mesmo pela clara consciência de que para haver salvação para alguma daquelas personagens, alguém terá de morrer.

A destruição do espaço físico e da sanidade mental das personagens aliam-se no momento em que surgem as dúvidas de que aquela rotina continue a fazer alguma espécie de sentido. Isto combina-se com a chegada da quarta personagem que traz com ela todas as diferenças: é negra, tem uma vida social, um trabalho e a ambição de ser feliz.

Quando realidade e ficção se confundem, a intrusa passa a fazer parte do perverso jogo da família e é imperativo que surja algum momento de purificação que, embora anunciada a sua urgência desde o início, só se pode dar com a chegada desta quarta personagem.

O teatro dentro do teatro, as luzes a aquecerem durante a encenação, a aproximação da morte nesta orgânica cénica de acentuado cunho político não se faz disfarçar pelas gargalhadas que provoca. A essência da mensagem estará precisamente neste oscilar entre o riso e a estupefacção provocados no espectador, é um rir de si mesmo criticando costumes e rotinas que não se espelham exactamente na situação ali exposta, mas que encontra paralelos seríssimos na esfera de acção de cada um dos cidadãos que compõe o público do espectáculo.

A Farsa da Rua W

” de Enda Walsh regressa ao Teatro da Politécnica em Lisboa já a partir do próximo dia 15 de Novembro e até 15 de Dezembro (3ª e 4ª às 19h00

5ª e 6ª às 21h00

sáb às 16h00 e às 21h00)