Sou "português" em Nova Iorque

Se só “expulsarmos” os jovens portugueses para o estrangeiro com medidas desumanas e politicas extremadas, vamos ganhá-los enquanto emigrantes, mas perdê-los enquanto embaixadores

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Rodrigo Accurcio/Flickr

No ano em que a palavra Emigração foi utilizada até à exaustão, vi-me, por motivos profissionais, num avião rumo a Nova Iorque (vá lá, não se chateiem com a minha sorte que eu também mereço). Viagem curta, de apenas 4 dias, mas que me deu uma nova perspetiva tanto em relação aos portugueses fora de Portugal, como à própria imagem do nosso país. E quem somos nós, segundo uma amostra de Nova-Iorquinos entrevistados?

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No ano em que a palavra Emigração foi utilizada até à exaustão, vi-me, por motivos profissionais, num avião rumo a Nova Iorque (vá lá, não se chateiem com a minha sorte que eu também mereço). Viagem curta, de apenas 4 dias, mas que me deu uma nova perspetiva tanto em relação aos portugueses fora de Portugal, como à própria imagem do nosso país. E quem somos nós, segundo uma amostra de Nova-Iorquinos entrevistados?

 


Nós somos Europa, por isso somos crise e manifestações. Somos sardinha e pastel de nata. Somos gastronomia, mas vinho, só se for do Porto. Somos Cristiano Ronaldo e somos capazes de ter descoberto “um sítio qualquer” no passado. Somos fado, mas pouco. Somos ‘a língua portuguesa’.

 


 A língua portuguesa… estamos enganados quando pensamos que ”o português” é a língua do Brasil, porque aparentemente as pessoas oriundas do Brasil falam brasileiro. Então, e a nossa língua?

 


Terá um valor assumidamente profissional, como língua dos negócios, tal como o Mandarim? Ou será que o seu valor reside na cultura, como o Francês ou o Russo? Numa Nova Iorque construída e fortemente habitada por emigrantes, onde fica o Português?

 


Nesta cidade que nunca dorme, os países também não dormem. Todos os dias, a todas as horas e a todos os minutos surgem novos eventos culturais, que convidam habitantes, visitantes e turistas a “experienciar um pouco de cada país, de cada cultura”. Mas Portugal está adormecido. Na cidade que nunca dorme quase todos têm um ascendente europeu, africano, caribenho, asiático ou sul-americano. Mas poucos têm ascendência portuguesa. E os que têm são realmente os nossos principais embaixadores.

 


Muitos indicam que o sucesso de uma língua é o desejo de a dominar. Seja por querermos ler um autor na sua língua original, seja por querermos dizer umas palavras na língua de origem dos nossos avós, seja por nos querermos orientar no mundo, seja por querermos impressionar um potencial namorado. Mas se não nos dermos a conhecer enquanto país, se não assumirmos a nossa identidade, como nos podemos tornar relevantes? A interligação da língua e da cultura é forte.

 


Durante a minha estadia, tive o privilégio de conhecer duas realidades muito distintas, mas igualmente fascinantes. Por um lado, uma “nova” geração de emigrantes que se estabeleceu em Manhattan e trabalha em imponentes torres de 100 andares em Midtown ou em galerias de arte no Soho, por outro, um grupo de jovens luso-descendentes, de primeira ou segunda geração, residentes em Elisabeth, New Jersey.

 


E o que vi, o que conheci, o que explorei, não me podia deixar mais sensibilizada. Mundos e histórias diferentes, mas a mesma paixão, a mesma dedicação ao esforço de ser português. Do lado de Manhattan, uma jovem empreendedora que, com o seu esforço e dedicação conseguiu levar uma nova geração de artistas portugueses aos parques, teatros e galerias de Downton com o seu Arte Institute (arteinstitute.org, vejam, porque vale a pena), e por outro, um grupo de Elisabeth autointitulado ‘Nova Geração’, com jovens na casa dos 20, alguns nascidos cá e outros já lá, portugueses nos EUA, americanos em Portugal. A eles dedico este texto. À sua vontade de espalhar a cultura portuguesa através de festas populares na Associação Recreativa de Elisabeth ou exibição de filmes portugueses em Manhattan. Dedico-o às dificuldades em progredir através de um apoio que nunca chega à dificuldade em absorver uma cultura que também custa a chegar.

 


A eles dedico este texto. Sobretudo no ano em que a palavra Emigração foi utilizada até à exaustão. Porque o valor de ser português mantém-se com quem sai do país. Com quem procura melhores (já nem utilizo a palavra boas) condições de vida. Se só “expulsarmos” os jovens portugueses para o estrangeiro com medidas desumanas e politicas extremadas, vamos ganhá-los enquanto emigrantes, mas perdê-los enquanto embaixadores.