Universidades fintam crise no Erasmus com aposta em alunos da lusofonia
O Brasil é o ponto de encontro entre os dois novos mercados de captação de alunos de intercâmbio pelo sistema de ensino superior nacional. Os estudantes dos países da América do Sul e da lusofonia têm um peso cada vez maior nas universidades e politécnicos, uma aposta que está a ter bons resultados financeiros para as instituições. Ao mesmo tempo, permite que o país esteja menos exposto à crise de financiamento por que passa o programa europeu Erasmus.
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O Brasil é o ponto de encontro entre os dois novos mercados de captação de alunos de intercâmbio pelo sistema de ensino superior nacional. Os estudantes dos países da América do Sul e da lusofonia têm um peso cada vez maior nas universidades e politécnicos, uma aposta que está a ter bons resultados financeiros para as instituições. Ao mesmo tempo, permite que o país esteja menos exposto à crise de financiamento por que passa o programa europeu Erasmus.
Em Coimbra, concentra-se metade dos estudantes brasileiros em Portugal, segundo dados da embaixada do Brasil. São cerca de dois mil, dos quais 400 viajaram ao abrigo de um programa de formação de professores do ensino secundário. "Estas formas de mobilidade têm muita importância para nós", sublinha o vice-reitor da Universidade de Coimbra (UC), Joaquim Ramos de Carvalho. Além das parcerias com o Brasil, a instituição tem acordos com vários outros países lusófonos, recebendo estudantes de Angola (cerca de 200), Moçambique e Timor.
A mobilidade tem sido associada ao intercâmbio entre estudantes europeus, sobretudo ao abrigo do programa Erasmus. Porém, as principais instituições nacionais começam a diversificar os países de origem dos estudantes estrangeiros que as frequentam. "Na sua estratégia de abertura internacional, a Universidade do Porto [UP] trabalha com outros programas", esclarece o vice-reitor António Marques. Ao abrigo do programa "Ciência Sem Fronteira", do Governo brasileiro, chegaram àquela instituição 340 alunos só este ano.
A UP gere também sete grandes projectos de mobilidade de professores, alunos e investigadores para a América Latina e países lusófonos. "Tudo isto está a trazer muita gente", sustenta António Marques. Ao abrigo desses programas, a instituição gere, durante quatro anos, 28 milhões de euros, que representam sete a 10% do seu orçamento.
O mercado brasileiro é também uma das apostas dos institutos politécnicos. Nos próximos três anos, 4500 estudantes vão estudar em Portugal ao abrigo de um acordo entre o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) e o Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica do Brasil, no âmbito do programa "Ciência Sem Fronteira".
No início de 2013, chegam a Portugal os primeiros alunos que vão estudar ao abrigo deste acordo, que o presidente do CCISP, Sobrinho Teixeira, vê como "simbólico" da "capacidade de afirmação do sector politécnico". Um terço dos estudantes de politécnicos brasileiros no estrangeiro virá para Portugal, o que terá um impacto directo em propinas e outras taxas de cinco milhões de euros nos orçamentos das instituições nacionais. A estes acrescentam-se os três milhões de euros de impactos indirectos estimados com os gastos mensais em alimentação e alojamento.
A este programa, os politécnicos acrescentam um outro projecto de mobilidade na lusofonia, envolvendo instituições de Macau e África. A iniciativa faz-se sem financiamento para os alunos, assumindo as instituições de acolhimento os gastos com alojamento.
A aposta noutros mercados deixou as instituições nacionais menos expostas aos problemas que afectam o Erasmus, o principal programa de mobilidade europeu. A Universidade do Porto, por exemplo, é a universidade portuguesa que mais estudantes envia e recebe ao abrigo desse programa, mas essa já não é a principal iniciativa de mobilidade em que a instituição participa.
Porém, uma crise no Erasmus seria "desastrosa", avalia Teresa Cerveira Borges, pró-reitora da Universidade do Algarve. Principalmente para os alunos: "O financiamento é muito baixo. Hoje, quem não tiver apoio das famílias, dificilmente vai em Erasmus e sem apoio será ainda pior".
Menos alunos a sairDurante o último ano lectivo, pelo menos 700 alunos portugueses desistiram de embarcar numa experiência de mobilidades depois de já se terem inscrito, apontando as dificuldades financeiras como principal motivo para a decisão. Ainda assim, quase seis mil portugueses estudaram na Europa no ano lectivo de 2010/11, ao abrigo deste programa. Já a procura das instituições nacionais por parte de estudantes estrangeiros tem vindo sempre a crescer e atingiu, nesse ano, o máximo histórico de 7582 alunos.
Por isso, o programa é visto como uma "importante forma de promoção" das universidades e politécnicos nacionais como destino de formação, salienta o reitor da Universidade do Minho, António Cunha. "Muitos dos que cá vêm em Erasmus regressam depois para fazer mestrados e doutoramentos", ilustra.
As verbas pagas por formações pós-graduadas têm um impacto grande nas contas das instituições nacionais. Já o peso do Erasmus nos orçamentos das universidades "não é muito significativo", reconhece o vice-reitor da UC. Todavia, valoriza o mesmo responsável, os estudantes em mobilidade têm um "impacto enorme na cidade e na vida académica".
O programa Erasmus é uma das mais bem-sucedidas experiências de mobilidades na União Europeia (UE). A iniciativa engloba 33 países europeus e já permitiu a mobilidade de quase três milhões de pessoas desde que foi criada, em 1987. Apesar das dificuldades sentidas com o seu financiamento nos últimos meses, a UE apresentou há um ano o programa "Erasmus para todos", destinado ao período 2014-2020. A iniciativa passará a dispor de um orçamento total de 19 mil milhões de euros e o objectivo é alargar o número de beneficiários do programa, abrangendo cinco milhões de pessoas nesses sete anos.