Route 66: atravessar um país pela estrada fora
Francisco Louçã revisitou a história dos migrantes da Grande Depressão. Paulo Furtado aproveitou uma "tournée" para fazer parte do percurso, Patrícia Naves fez com os amigos a viagem das suas vidas. É a Route 66
Basta uma rápida pesquisa pelo Google para encontrar uma infinidade de referências à Route 66, a mítica estrada norte-americana que atravessa o país de Este a Oeste, ligando Chicago a Los Angeles, com uma história que atravessa alguns dos períodos mais marcantes dos Estados Unidos (EUA).
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Basta uma rápida pesquisa pelo Google para encontrar uma infinidade de referências à Route 66, a mítica estrada norte-americana que atravessa o país de Este a Oeste, ligando Chicago a Los Angeles, com uma história que atravessa alguns dos períodos mais marcantes dos Estados Unidos (EUA).
Em 1926 arrancou o projecto final que levaria à criação da maior autoestrada transcontinental da América, e só nesse ano receberia o nome que a popularizou, mas foi em 1912 que se lançaram as bases da Route 66.
Muitas dessas referências são blogues com diários de viagem, em texto e fotografia, testemunhos de quem já percorreu os milhares de quilómetros da Route 66, inspirados por um certo espírito de aventura e rebeldia que lhe está associado, muito construído em torno da obra de Jack Kerouac "On The Road" ("Pela Estrada Fora", na tradução em português), um registo autobiográfico que relata a viagem de carro que o autor fez com os amigos Allen Ginsberg, William Burroughs e Neal Cassidy - os vultos da geração "beat" ou "beatnik".
Francisco Louçã compreende o apelo de uma viagem de “projeção do passado”, mas garantiu que não foi isso que o levou aos EUA, ainda que Kerouac, que leu na adolescência, tenha sido uma espécie de “música de fundo” na viagem que fez há dois anos com os amigos, sobretudo para conhecer a rota das migrações durante a Grande Depressão.
“O nosso imaginário do interior dos EUA é muito marcado pelo cinema. É o Texas, o Arizona, são as grandes histórias de "cowboys" ou as grandes zonas industriais, é muito marcado por arquétipos e mitologias de Hollywood. O que depois encontramos são pessoas que vivem ali toda a vida, trabalham ali no campo, nos restaurantes, onde for, e que são extraordinariamente acolhedoras”, contou.
O imaginário e o mito à volta da Route 66 são as recordações mais vívidas de Paulo Furtado, o músico que encarna sozinho o projecto The Legendary Tigerman e que é também o "frontman" dos portugueses Wraygunn. "Na altura estava em 'tournée' pelos EUA, há muitos, muitos anos, e lembro-me de pensar no imaginário da América profunda, de passar por pequenas localidades onde quase não há nada, onde está tudo abandonado, que já vimos tantas vezes em filme. Foi também uma hipótese de poder ver isso tudo ao vivo", explicou à Lusa.
Paulo Furtado fez "uma partezinha" daquilo que resta da Route 66, perto de Albuquerque, no Estado do Novo México, "mais pela vontade de percorrer um bocadinho de história do que propriamente a emoção que seria na altura percorrer a Route", apesar de ser uma "das coisas que mais gostaria de ter feito".
Da estrada, o Tigerman, que fez uma versão da música Route 66 composta por Bobby Troup, recorda também o "merchandising"que acompanha o percurso original, que associa a uma "perda de inocência e do espírito da descoberta" ligado à viagem e que escritores e músicos ajudaram a imortalizar: "Acho que o Kerouac terá sido um dos grandes responsáveis pela criação do mito da "Route 66".
Viagem utópica?
"On the Road" foi o livro de viagem de Patrícia Naves, “a escolha óbvia”, e também repetida, já que há muito tinha sido lido pela jornalista, que há dois anos partiu com dois amigos em direção aos EUA, para a viagem das suas vidas. “Muita gente não vai, porque acha que é utópico. De facto é muito caro e de facto perde-se muito tempo de férias. Foram mais de três semanas. Estávamos a adiar, a adiar e decidimos que era agora ou nunca”, contou à Lusa.
Contas feitas, no final a viagem de uma vida ficou por cerca de 2.500 euros a cada, mas sem arrependimentos. Na memória ficaram muitas “terriolas, algumas delas completamente abandonadas, completamente 'kitsch', com dinossauros gigantes no meio da estrada, ou cartazes 'néon' muito antigos, com aqueles motéis que parecem tendas de índios”.
Pelo sim, pelo não, para evitar esquecimentos, registaram tudo também num blogue, ao qual ainda regressam para recordar as noites de escrita nos motéis e os episódios da viagem. Entre as muitas recordações que marcaram a viagem, Patrícia Naves agradece não “ter aceitado” a sugestão do GPS de seguir pela autoestrada paralela à velha 66, a Interstate 40.
“Dizemos que a frase das férias foi "recalculating". Ela [a voz feminina do GPS] não percebia porque não íamos pela Interstate. Às vezes tínhamos que a desligar só para não a ouvir, mas também não queríamos ir parar ao outro lado do mundo”, recordou.
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