"Burnout": quando já não aguentas mais o teu trabalho
É a síndroma da exaustão. O chamado "burnout" está associado a um conjunto de sintomas relacionados com o cansaço, quer físico, quer emocional, provocados pelo ambiente profissional
Catarina Marques, 22 anos, trabalhava numa empresa onde se sentia profundamente desmotivada: o volume de trabalho era enorme, passava demasiadas horas sozinha no escritório e não via o seu trabalho a dar frutos. "Andava sempre mal disposta, triste e carrancuda, o que fazia de mim uma pessoa antipática, característica que não faz parte da minha personalidade", conta Catarina. Este cenário que muitos interpretam como uma simples depressão era, na verdade, um caso de "burnout".
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Catarina Marques, 22 anos, trabalhava numa empresa onde se sentia profundamente desmotivada: o volume de trabalho era enorme, passava demasiadas horas sozinha no escritório e não via o seu trabalho a dar frutos. "Andava sempre mal disposta, triste e carrancuda, o que fazia de mim uma pessoa antipática, característica que não faz parte da minha personalidade", conta Catarina. Este cenário que muitos interpretam como uma simples depressão era, na verdade, um caso de "burnout".
A síndroma de "burnout" é um quadro clínico, uma perturbação psicológica ou uma alteração do comportamento que tem como principal fonte um desajustamento do indivíduo ao seu trabalho. Resulta do stress crónico provocado por razões laborais, podendo, em determinado momento, haver uma mudança em algum aspecto do trabalho ou até mesmo da vida pessoal que espoleta a crise.
Cristina Queirós, professora da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto, explica que "o 'burnout' é equivalente ao copo de água que vai enchendo gota a gota e que, a certo momento, transborda".
"Burnout": um copo que transborda
Catarina sabe bem o que é sentir o copo a transbordar. A jovem licenciada em Ciências da Comunicação, na vertente de assessoria, trabalhava como Administrativa num centro de formação. O facto de passar muitas horas sozinha e de serem poucos trabalhadores fez com que se começasse a sentir o trabalho como um fardo. Na sua rotina diária, sentiu modificações ao nível do seu "sentido de humor" e consequentemente, na forma como se "relacionava com os outros".
A jovem acabou por deixar o trabalho não só porque se sentia deprimida mas também porque tinha "consciência de que a empresa se encontrava em dificuldades económicas e que não tinham capacidade de sustentabilidade".
Situações como a de Catarina são fenómenos que, segundo Sónia Gonçalves, investigadora do Instituto Piaget, começaram a ser estudados e diagnosticados "em profissionais em que uma boa parte da sua tarefa implicava contacto com os outros, como profissionais de saúde, médicos, enfermeiros, profissionais de segurança e também professores. Hoje em dia já se começa a assistir a um conjunto de investigações com outros profissionais, em parte devido às "mudanças laborais a que temos vindo a assistir", afirma.
Fases do "Burnout"
A professora Cristina Queirós explica que o "burnout" tem "três características clássicas que são, numa fase inicial, a exaustão emocional, depois a despersonalização, cinismo ou desumanização e, numa última fase, a falta de realização pessoal".
Numa primeira etapa, a pessoa passa por uma fase de irritabilidade, de falta de resposta aos pedidos que chegam. Cristina Queirós explica que os "recursos emocionais e capacidade de adaptação" se esgotam.
Numa segunda fase, as pessoas tendem a pensar que o defeito é delas e, para se defenderem, tendem a tratar os outros de maneira cínica. "A maneira de o sujeito lidar com essa frustração é criar uma barreira que torna os actos mais desumanos e daí prejudica não só o sujeito mas também os cuidados e a interacção com os outros, colocando em causa os serviços da instituição na qual trabalha", explica Cristina. Já na fase de falta de realização pessoal, a pessoa afectada deixa de "ter prazer no trabalho e de se sentir eficaz".
Para Cristina Queirós, há uma confluência final dos três aspectos. "Não tem recursos, trata os outros como objectos impessoais para se defender e não tem prazer no trabalho. Aí, o sujeito entra num estado de 'burnout'. Só naquele momento atingiu um ponto de viragem identificado pelo próprio ou pelos outros colegas de trabalho ou utentes do serviço", explica a investigadora.
Prevenir é essencial
Em termos de prevenção e de intervenção de crise, Sónia Gonçalves defende que há a necessidade de pensar nestas situações divididas em vários campos de actuação — sobre a pessoa e sobre a empresa empregadora.
No caso do indivíduo, tem de haver uma "formação em termos de estratégia de gestão de conflitos e de stress, uma vez que o 'burnout' tem estado associado ao facto de a pessoa ter estado exposta a fontes de stress muito intensas e durante muito tempo", explica Sónia.
Num contexto de empresa, Sónia admite que "a intervenção focada no trabalho está ainda muito além das expectativas". "As práticas de gestão de recursos humanos, mais transparentes, acabam por transmitir mais segurança e uma sensação de maior controlo à pessoa", explica Sónia. "Acredito fortemente que uma política interna forte é o factor chave", corrobora.
"O 'burnout' nem sequer é considerado como uma doença profissional e é mais facilmente diagnosticado como depressão", explica Cristina Queirós. "'Burnout' não significa fragilidade, mas sim um problema nas características do trabalho. É algo que leva à erosão da alma do profissional e que o consome ou 'queima pelo trabalho'", sublinha.