Pequena nota sobre emigrar para a África portuguesa
Viver em África não é fácil, nem mesmo em terra de herança portuguesa e boa gente. Clima, hábitos, cultura, dia-a-dia, aspectos tão simples mas com o poder de complicar tudo o resto
Muito se fala sobre Moçambique e pouco se sabe. Cahora Bassa, ONGs, ilhas desertas, praias quentes, bananas, oportunidades. Contudo, é prudente tentar saber um pouco mais antes de vender tudo e apanhar um voo da TAP para o calor colante de Maputo.
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Muito se fala sobre Moçambique e pouco se sabe. Cahora Bassa, ONGs, ilhas desertas, praias quentes, bananas, oportunidades. Contudo, é prudente tentar saber um pouco mais antes de vender tudo e apanhar um voo da TAP para o calor colante de Maputo.
Viver em África não é fácil, nem mesmo em terra de herança portuguesa e boa gente. Clima, hábitos, cultura, dia-a-dia, aspectos tão simples mas com o poder de complicar tudo o resto. Mesmo assim, a geração de 80 emigra para Moçambique em massa. Oh!, se emigra. Seguindo os passos dos avós, vem ver como é a África das estórias de infância, atrás de sonhos e projectos de vida congelados em Portugal.
No entanto, nem tudo são rosas na terra das acácias rubras, ex-Lourenço Marques. Digamos que os desafios são constantes. Dos banais gestos, como atravessar a rua sem perder a sola do sapato, aos mais complexos, como conseguir visto de trabalho, o processo rumo ao caos pode alastrar-se qual mato. Passo a explicar.
Quotas e preços "gourmet"
Em Maputo não há passeios como os conhecemos, nem caixotes do lixo, nem transportes públicos. Há, antes, o "chapa" que outrora foi carrinha ou mini-van e agora se resume ao nome. Também não há casas a 500 euros, aquelas a que esta mesma geração não tinha acesso em Portugal, pelo menos, não no centro de cimento. Há antes a mil e muitos dólares americanos que aqui nada fazem a não ser pautar os preços proibitivos de um mercado imobiliário que cresce à medida dos estrangeiros que chegam e dos benefícios dos expatriados, essa raça a que todos aspiram mas que só um ou dois consegue.
Também não há Pingo Doce ou Continente, apenas a mercearia indiana e os super sul-africanos que uma vez ou outra lá têm a lista completa, mas a preço de "gourmet" do Corte Inglês. Há quem diga que é o preço a pagar por andar de chinelo no pé todo o ano – atenção que Moçambique teve, no ano passado, o Inverno mais rigoroso dos últimos 60 anos, com direito a cobertores improvisados, seguranças com gorros e luvas e meninos com frio na rua, quando as t- shirts das calamidades não cobriram os braços e os chinelos não aqueceram os pés. Finalmente, há a dificuldade em conseguir trabalho, seja pela quota fixada para estrangeiros (cerca de 10% dos funcionários da empresa), seja pela dificuldade em conseguir o contacto certo, aquele de quem decide.
O preço a pagar por uma experiência única? Ou, somado à saudade de casa, demasiado elevado? Apenas o justo a pagar por manga e papaia perfumadas, camarões do tamanho de tigres e pés nus de molho em mar morno. Tudo todo o ano.
Notícia corrigida às 15h13 do dia 18 de Abril. O termo "monhé" foi substituido pela palavra indiano.