“Quando a Cidade Dorme” (“The Asphalt Jungle”), de John Huston (1950)
“O filme é sobretudo uma lição de iluminação do director de fotografia Harold Rosson, que cria uma atmosfera persistente na nossa memória”
Do realizador de “The Maltese Falcon” (“Relíquia Macabra”), John Huston, vamos falar hoje de outro filme negro: “The Asphalt Jungle”. Com argumento adaptado pelo próprio John Huston, em parceria com Ben Maddow, a partir de um romance do famoso W. R. Burnett (“Little Caesar”, “High Sierra”), é, aparentemente, um “filme sem estrelas”: os actores principais são Sterling Hayden e Louis Calhern, seguindo-se, na hierarquia do elenco, Jean Hagen, James Whitmore e Sam Jaffe. Perdida, em 11.º lugar, aparece Marilyn Monroe, que viria, em poucos anos, a ofuscar todos os outros (em “All about Eve”, do mesmo ano, já é nona; em “Clash by Night”, de 1952, ascende a quarta figura). Mas aos espectadores de hoje diz alguma coisa o nome dos restantes?
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Do realizador de “The Maltese Falcon” (“Relíquia Macabra”), John Huston, vamos falar hoje de outro filme negro: “The Asphalt Jungle”. Com argumento adaptado pelo próprio John Huston, em parceria com Ben Maddow, a partir de um romance do famoso W. R. Burnett (“Little Caesar”, “High Sierra”), é, aparentemente, um “filme sem estrelas”: os actores principais são Sterling Hayden e Louis Calhern, seguindo-se, na hierarquia do elenco, Jean Hagen, James Whitmore e Sam Jaffe. Perdida, em 11.º lugar, aparece Marilyn Monroe, que viria, em poucos anos, a ofuscar todos os outros (em “All about Eve”, do mesmo ano, já é nona; em “Clash by Night”, de 1952, ascende a quarta figura). Mas aos espectadores de hoje diz alguma coisa o nome dos restantes?
Sterling Hayden, actor de “westerns”, policiais e filmes de guerra dos anos 40 e 50, desprezava a sua própria carreira. Incomodavam-no as câmaras e o salário excessivo. Mesmo assim, se alguém se lembrar do seu ar permanentemente constrangido, provavelmente será de o ter visto em “The Killing” (“Um Roubo no Hipódromo”), de 1956, ou em “Dr. Strangelove” (“Doutor Estranhoamor”), de 1961, ambos de Stanley Kubrick.
Louis Calhern é o oposto. Quer interpretando personagens honestas, quer desonestas, é sempre um modelo de cavalheiro distinto e sofisticado, de princípios que assomam ou acabam por assomar, de um à-vontade em cena que refresca como uma brisa. Eterna segunda figura — “A Life of Her Own”(”Seguirei o Meu Destino”), “The Blackboard Jungle” (“Sementes de Violência”), Notorious” (“Difamação”) —, demonstra bem como o segredo de um certo tipo de cinema também depende de um lote de muito bons actores secundários que sirvam de rede de segurança às “estrelas”, não se dê o caso de serem cadentes.
O mesmo se pode dizer de Jean Hagen — “Singing in the Rain” (“Serenata à Chuva”) —, James Whitmore — “Tora! Tora! Tora!” — e Sam Jaffe — “Gentleman’s Agreement” (“A Luz É para Todos”). Mas Sam Jaffe ultrapassa o seu quinto lugar no genérico e torna-se realmente na terceira figura da nossa atenção, para não dizer a segunda, já que as duas conclusões-chave da história são dele e do protagonista: este regressando definitivamente à terra de onde nunca teria saído por escolha, aquele regressando à prisão por falhas imprevisíveis num plano metodicamente construído e, finalmente, por alguns minutos de observação obsessiva de uma jovem. Por este papel, recebeu uma nomeação para melhor actor secundário.
Exemplo de conjunto sólido constituído pela judiciosa combinação de camadas finas, o filme é sobretudo uma lição de iluminação do director de fotografia Harold Rosson, que cria uma atmosfera persistente na nossa memória para a qual também contribuem a direcção artística de Randall Duell e Cedric Gibbons, a cenografia de Edwin B. Willis e a música de Miklos Rozsa.