Começar de novo

Quiseramos nós ser mauzinhos ediríamos que Comprámos um Zoo! é a versão fofinha e ternurenta dos Descendentes de Alexander Payne, com Matt Damon no lugar de George Clooney, bichinhos e criancinhas, e um final feliz onde todos viveram felizes para sempre. Só há um problema com sermos mauzinhos dessa maneira: é que, mesmo sendo inteiramente verdade, Comprámos um Zoo! é fita mais sincera e espontânea, para não dizer marginalmente mais interessante, do que Os Descendentes. E, decaminho, é filme que se enquadra na perfeição na carreira de quem o dirige: Cameron Crowe, o antigo jornalista-prodígio da Rolling Stone que ainda é hoje mais recordado por Jerry Maguire(1996) mas que, ao longo dos anos, tem assinado uns quantos filmes bem interessantes sobre o que significa hoje em dia crescer e tornar-se adulto na América moderna (Say Anything..., 1989, Vida de Solteiro, 1992, Quase Famosos, 2000).

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Quiseramos nós ser mauzinhos ediríamos que Comprámos um Zoo! é a versão fofinha e ternurenta dos Descendentes de Alexander Payne, com Matt Damon no lugar de George Clooney, bichinhos e criancinhas, e um final feliz onde todos viveram felizes para sempre. Só há um problema com sermos mauzinhos dessa maneira: é que, mesmo sendo inteiramente verdade, Comprámos um Zoo! é fita mais sincera e espontânea, para não dizer marginalmente mais interessante, do que Os Descendentes. E, decaminho, é filme que se enquadra na perfeição na carreira de quem o dirige: Cameron Crowe, o antigo jornalista-prodígio da Rolling Stone que ainda é hoje mais recordado por Jerry Maguire(1996) mas que, ao longo dos anos, tem assinado uns quantos filmes bem interessantes sobre o que significa hoje em dia crescer e tornar-se adulto na América moderna (Say Anything..., 1989, Vida de Solteiro, 1992, Quase Famosos, 2000).


O tema da reinvenção e do sonho tem sido central no cinema de Crowe e, depois do conturbado Elizabethtown (2005), Comprámos um Zoo! é a nova iteração dessa necessidade de reinvenção crucial à sociedade americana, ficcionando sobre a história verdadeira de Benjamin Mee, jornalista que, após a morte da mulher, se muda com os dois filhos para um jardim zoológico em ruínas onde investe tudo o que tem para repôr a funcionar. Crise de meia-idade, loucura de viúvo, leia-se o que quiser - para Crowe e para o seu ex-jornalista (Matt Damon cada vez melhor nestes papéis de gente normal apanhada na curva) é a aventura da vida que conta, os “vinte segundos de coragem” em que tudo pode acontecer, o momento em que à pergunta “porquê?” se responde com “porque não?”. De certo modo, Comprámos um Zoo! é o “gémeo positivo” de Elizabethtown. Se ambos partilham a ideia da morte de alguém próximo como catalista para a grande mudança de uma vida, fazem-no de modos diferentes - Elizabethtown era um filme à sombra do falhanço, Comprámos um Zoo é uma fábula gentil sobre o regresso à comunidade que está mais próximo de Capra do que do Billy Wilder que Crowe endeusou. Mas a pontaria certeira do realizador para imbuir o seu cinema com uma essência emocional feita de experiências universais transporta o novo filme para uma dimensão de vulnerabilidade e humanidade que equilibra os lugares-comuns do drama familiar e da comédia românticacom uma delicadeza quase diáfana.

Já não é de agora, os filmes de Crowe exigem do espectador uma disponibilidade arregalada que nem sempre se consegue encontrar - e este não é uma excepção. Mas o leão que faz caretas, para o urso deprimido e para o tigre desdentado apenas explicam que Crowe está a falar de gente à procura de uma segunda oportunidade para fazer os outros felizes, para quem um simples sorriso pode ser a maior aventura do mundo. É um bonito filme de um classicismo quase artesanal como hoje começaa ser difícil encontrar pelo meio das patacoadas que Hollywood nos quer vender. Isso devia chegar para lhe prestarmos atenção; nonosso caso, chega e sobra.