“Ruptura Silenciosa”: são arquitectos a fazer cinema para mostrar arquitectura
Projecto de investigação quer mostrar obras arquitectónicas através de curtas-metragens. A segunda, ”A Casa do Lado”, estreia hoje, quarta-feira, no cinema Passos Manuel, no Porto
Emigração em massa, cenário político agitado, urbanização em curso – tudo isto faz parte do país pré-Revolução de Abril, nos anos 1960-1974. Mas há mais: no cinema e na arquitectura emergem neste período movimentos que alteram o panorama cultural dos últimos cinquenta anos.
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Emigração em massa, cenário político agitado, urbanização em curso – tudo isto faz parte do país pré-Revolução de Abril, nos anos 1960-1974. Mas há mais: no cinema e na arquitectura emergem neste período movimentos que alteram o panorama cultural dos últimos cinquenta anos.
É desta mudança que se fala em “Ruptura Silenciosa - Intersecções entre a Arquitectura e o Cinema. Portugal 1960-1974", um projecto de investigação que mostra, através de curtas-metragens, obras arquitectónicas relevantes desse período. “Não queríamos fazer documentários, como é habitual quando se filma arquitectura, propusemo-nos a fazer filmes de ficção sobre aquelas obras”, explicou ao P3 Luís Urbano, coordenador do projecto.
Ana Resende, bolseira do projecto da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, desenvolve: “A partir do ambiente criado pelo edifício, associado à história e ao que o edifício tem de diferente, criamos uma ficção que não tem propriamente a ver com factos históricos, mas que leva as pessoas a identificarem-se com o espaço”.
Objectivo: "Mostrar a arquitectura"
O fim último, clarifica Luís Urbano, é “mostrar a arquitectura”. E, até ao final do ano, a equipa – que tem como investigador principal Alexandre Alves Costa e junta outras faculdades (não só de arquitectura e não só portuguesas) – pretende fazer mais oito curtas-metragens. Fez até agora duas – “Sizígia” e “A Casa do Lado”.
Esta quarta-feira à noite, no Porto (cinema Passos Manuel, 22h e 23h), estreia “A Casa do Lado”, uma curta-metragem sobre a casa de Caminha de Sergio Fernandez. “Antes de a casa der construída era um sítio onde um grupo de pessoas se reunia para actividades políticas mais ou menos clandestinas politicamente”, explica o arquitecto Luís Urbano.
“A Casa do Lado” – curta sobre “uma obra muito visitada, que tem marcado sucessivas gerações de arquitectos” - cria uma narrativa à volta da casa como esse “lugar de encontro de pessoas que lutavam contra o antigo regime”.
A primeira curta-metragem do projecto, "Sizígia", retratou a incontornável Piscina das Marés, obra de Siza Vieira em Leça da Palmeira. "Queríamos filmar a piscina quando não está aberta ao público. A personagem seria uma pessoa que cuida do edifício e que está nove meses a preparar o espaço para os três meses de Verão", conta Luís Urbano. Quando foram fazer os primeiros testes no local perceberam que essa pessoa existia mesmo - "Havia um senhor, muito zeloso do edifício... mas ele não aceitou ser personagem do filme".
Curtas, mas não só
Os actores das curtas-metragens de "Ruptura Silenciosa" - que no final apresentará um documentário que junta todos os trabalhos - são amadores: professores e alunos da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto ou conhecidos dos responsáveis pelo proecto. A igreja do Sagrado Coração, de Nuno Teotónio Pereira e Nuno Portas, e o mercado de Santa Maria da Feira, de Fernando Távora, são as próximas obras a ser filmadas. Além das curtas, o projecto organiza seminários, workshops e cursos de Verão.
Como é que o cinema entrou na vida destes arquitectos? "Na verdade, com este projecto arriscamo-nos a passar para o outro lado", brinca Luís Urbano. "Mas a nossa formação em cinema é como espectadores", clarifica. "Os arquitectos têm um olhar relativamente treinado. Estamos habituados a desenhar espaços, a antecipar como vai ser um edifício antes de ele existir. Temos alguma capacidade nesse sentido: antecipamos com será o objecto cinematográfico antes de ele existir."