Fazer directas a estudar para os exames é um mau negócio

Muitos estudantes privam do sono para ganhar tempo de estudo. Cientistas dizem que não compensa: “A qualidade e a quantidade adequada de sono estão associadas a um melhor rendimento académico”

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Ana Allen Gomes concluiu que passar uma noite “em claro” é algo comum entre os universitários AdalbertoGP123/Flickr

Exames, trabalhos, diversão. Quando o tempo parece pouco para tudo isto, a opção dos jovens é, muitas vezes, tentar "esticar" o dia e cortar nas horas de sono. Fazer disto um hábito pode ter consequências nefastas quer para a saúde quer para os resultados académicos.

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Exames, trabalhos, diversão. Quando o tempo parece pouco para tudo isto, a opção dos jovens é, muitas vezes, tentar "esticar" o dia e cortar nas horas de sono. Fazer disto um hábito pode ter consequências nefastas quer para a saúde quer para os resultados académicos.

“[Cerca de] 25% da população portuguesa dorme menos de seis horas”, afirmou ao P3 Marta Gonçalves, presidente da Associação Portuguesa de Sono, com base num estudo levado a cabo em 2009/2010.

Quanto aos estudantes, um estudo de Ana Allen Gomes, na Universidade de Aveiro, concluiu que pouco mais de metade dos inquiridos costumava dormir o necessário. A investigadora percebeu também que “a qualidade e a quantidade adequada de sono estão associadas a um melhor rendimento académico”.

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Como a memória é consolidada durante o sono, não dormir para estudar acaba por não compensar Remara Photography/Flickr

Sono é essencial à memória

“Quando dormem pouco as pessoas estão a pôr em perigo o futuro toda a sua sustentabilidade cognitiva”, alerta a neurologista Teresa Paiva, uma das maiores especialistas portuguesas em medicina do sono. E explica que, “enquanto dormimos, são activados no nosso cérebro processos de aprendizagem e memória”, uma vez que é favorecida a conexão entre os neurónios, o que é fundamental também para “desenvolver a criatividade e a capacidade de responder a problemas”.

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Uma noite sem dormir tem consequências significativas a muito curto prazo. Um bom exemplo disso é a capacidade de condução, actividade em que os erros de quem fica acordado 24 horas são semelhantes aos que se verificam em condutores com taxa de alcoolemia de 1.0 g/l (dados divulgados em 2011 pela Associação Portuguesa de Sono).

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Na investigação divulgada em 2009, Ana Allen Gomes concluiu que passar uma noite “em claro” é algo comum entre os universitários: 47% dos inquiridos já tinha feito pelo menos uma directa desde o inicio do ano lectivo. Ora, “fazer uma directa antes de um exame é um disparate porque vai haver pior desempenho cognitivo e intelectual na manhã seguinte, é comum haver brancas, lapsos, erros”, explica Teresa Paiva.

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“O corpo é que paga”

Para o corpo, o sono é também indispensável, uma vez que é nessa altura que ocorre o arrefecimento, necessário em animais de sangue quente, a produção exclusiva de algumas hormonas (como a do crescimento, a prolactina ou a testosterona), a divisão celular e, por fim, a activação do nosso sistema imunológico. Não dormir, significa, então, abdicar destas funções fundamentais, podendo ainda desencadear problemas como a diabetes ou a obesidade.

Para além das consequências de não dormir, há que pesar os efeitos do que se faz para resistir ao sono. A substância mais consumida com este objectivo é a cafeína, que, em excesso, “pode causar complicações cardíacas semelhantes ao que acontece num ataque de pânico”, explica Ana Oliveira, estudante do mestrado em Toxicologia da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto.

Há também registo, embora em pequena escala no nosso país, de casos de consumo indevido de anfetaminas, ou medicamentos estimulantes como o metilfenidato ou o modafinil. Estas substâncias podem causar problemas que vão “desde as náuseas, vómitos, dores abdominais e cefaleias, à hipertensão, psicose, palpitações, ou taquicardias”, referiu Ana Oliveira.