Turismo gay: esta noite, Lisboa sai do armário
Lisboa é uma capital gay em ascensão, mas o Turismo de Portugal não considera prioritário o mercado LGBT
O novo ano está a chegar e, com ele, múltipas propostas em todo o país. Há as que chovem no molhado, com os habituais vestidos compridos e os êxitos dos anos 80. Há as alternativas, em que as passas são trocadas por M&M's e o champanhe por gin. E há outras que incluem sapateiras arco-íris, bailarinos, concorrentes da Casa dos Segredos, o menino do guia Spartacus e um bocadinho de quarto escuro (ver coluna à esquerda).
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O novo ano está a chegar e, com ele, múltipas propostas em todo o país. Há as que chovem no molhado, com os habituais vestidos compridos e os êxitos dos anos 80. Há as alternativas, em que as passas são trocadas por M&M's e o champanhe por gin. E há outras que incluem sapateiras arco-íris, bailarinos, concorrentes da Casa dos Segredos, o menino do guia Spartacus e um bocadinho de quarto escuro (ver coluna à esquerda).
É mais uma noite de folia, em particular para os turistas gay que todas as semanas entram no país — quatro mil, de acordo com os estudos de mercado da Be Out. "Portugal é um destino gay", diz, assertivamente, Diogo Vultos, director da agência especializada no mercado LGBT (Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgéneros), criada este ano pelo grupo Geowinds para responder àqueles números. E a outros — o turista gay padrão pertence a uma classe social alta e tem um elevado poder de compra. Este mercado está, por isso, muitas vezes associado ao turismo de luxo, daí o interesse das agências.
O grupo internacional Almeida Viagens, por exemplo, apostou no segmento ao criar o produto LGBT Dreams. Num e-mail enviado ao P3, justificam o investimento: "É uma área rentável pois (...) o tipo de cliente [está] muito associado às classes de rendimento mais elevadas. Existe, sem dúvida, um grande crescimento associado ao sector, principalmente devido a uma afirmação social cada vez maior deste tipo de comunidades, mas também por a crise não afectar tanto as classes de rendimento mais elevadas."
Diogo Vultos só lamenta que o Turismo de Portugal não demonstre o mesmo interesse. "Portugal é 'gay friendly'. Aceita o casamento entre pessoas do mesmo sexo e tem um bom 'rating' de hospitalidade. Devia haver uma estrutura para mostrar o país como 'gay-friendly' e assim entrar no mercado LGBT." Diogo fala em "alterações mínimas" para Lisboa rivalizar com grandes capitais gay como Amesterdão e Berlim, e atira mais números: "o mercado norte-americano investe por ano 162 biliões de dólares só no turismo LGBT."
O país tem de "acabar com os dogmas"
E o que seria preciso fazer? Sair do armário, "acabar com os dogmas", preparar uma estrutura. Diogo está a preparar um Guia Gay de Portugal e são poucos os espaços que se assumem como LGBT, apesar de serem frequentados por gays e lésbicas. Por outro lado, ainda há recepcionistas de hotéis que se riem quando um casal do mesmo sexo pede um quarto com uma cama.
O grupo Almeida Viagens refere também a necessidade de "investir na formação dos profissionais de turismo para saber lidar com este tipo de cliente". "O nosso país não reúne propriamente as condições ideais para se afirmar como um destino gay, mais por questões culturais, apesar de ser um povo de brandos costumes", concluem.
Numa nota enviada ao P3, o Turismo de Portugal explica que, apesar de "todos os segmentos de mercado" serem "importantes", o turismo gay, não sendo um dos dez "produtos turísticos estratégicos", não é prioritário.
Por causa do golfe, Lisboa não é Mykonos
O turismo de golfe é uma das apostas definidas pela entidade. Para este segmento, Portugal "preparou-se muito bem" ao "fazer mais campos" e ao "criar infra-estruturas". É deste género de investimento e estratégica que o país necessita para potenciar o turismo LGBT. A opinião é de Pedro Castro, fundador da Attitude Hotels, rede internacional de hotéis gays e lésbicos que terminou há três anos.
Sentindo na pele as dificuldades de ser um turista gay, Pedro criou o projecto em 2006, atraído pelo "potencial económico" do segmento LGBT. A ideia era "reunir proprietários independentes" de hotéis, criando uma cadeia de alojamentos gay. Ao recorrer aos serviços da Attitude, os viajantes sabiam que não iriam ter surpresas — o hotel seria de qualidade e "gay friendly". Pedro continua a achar que o conceito é "necessário" e "faz sentido", no entanto, na altura, não conseguiu encontrar um bom "equilíbrio financeiro". "É difícil trabalhar num segmento tão específico como o LGBT", reconhece.
Hoje, Pedro reside em Israel (saiu de Portugal em 1998) e trabalha na companhia aérea TAL Aviation, onde continua a apostar no turismo gay, mas não em exclusivo, até por uma questão de "integração". "Ver as coisas muito engavetadas nem sempre faz sentido", diz, dando o exemplo de Telavive, cidade cosmopolita, simultaneamente "religiosa" e "liberal", que atrai homossexuais e peregrinos, com praias para os dois grupos lado a lado. Tendo em conta esta experiência, afirma que Lisboa ainda não está inserida no mercado LGBT. "Não se posicionou neste tipo de turismo como Mykonos, Gran Canaria ou até Telavive. Como é que estas cidades chegaram até lá? Não sei bem, mas houve um apoio a iniciativas. O Gay Pride de Lisboa, por exemplo, é relativamente pequeno."