Salgueiros: Um passado rico, um presente delicado
O início foi tão amador como o presente. Entusiasmado com um FC Porto-Benfica a que tinha assistido, um trio de amigos (João da Silva Almeida, Aníbal Jacinto e Antenor) resolveu fundar um clube. As primeiras reuniões foram realizadas à noite, junto a um candeeiro público, na esquina da Rua da Constituição com a Rua Particular de Salgueiros, e foi numa delas que se decidiu a denominação Salgueiros, provavelmente por causa da existência ali perto de uma fábrica com o mesmo nome. A proximidade do Natal criou a primeira oportunidade de financiamento: cantar as janeiras pelas ruas da cidade rendeu 2800 reis, investidos numa bola de futebol. Quanto às camisolas do Sport Grupo e Salgueiros, o primeiro nome da colectividade, “ficou decidido que estas seriam vermelhas, tal como as do Benfica, distanciando-se assim do futuro rival que vestia de azul e branco, o FC Porto”, segundo pode ler-se no site oficial do clube.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O início foi tão amador como o presente. Entusiasmado com um FC Porto-Benfica a que tinha assistido, um trio de amigos (João da Silva Almeida, Aníbal Jacinto e Antenor) resolveu fundar um clube. As primeiras reuniões foram realizadas à noite, junto a um candeeiro público, na esquina da Rua da Constituição com a Rua Particular de Salgueiros, e foi numa delas que se decidiu a denominação Salgueiros, provavelmente por causa da existência ali perto de uma fábrica com o mesmo nome. A proximidade do Natal criou a primeira oportunidade de financiamento: cantar as janeiras pelas ruas da cidade rendeu 2800 reis, investidos numa bola de futebol. Quanto às camisolas do Sport Grupo e Salgueiros, o primeiro nome da colectividade, “ficou decidido que estas seriam vermelhas, tal como as do Benfica, distanciando-se assim do futuro rival que vestia de azul e branco, o FC Porto”, segundo pode ler-se no site oficial do clube.
A primeira grande crise aconteceu sete anos depois da fundação. O clube, entretanto já conhecido como Sport Porto e Salgueiros, suspendeu a sua actividade depois de ser impedido de participar nas provas da Associação de Futebol do Porto por o seu campo, em Arca d’Água, não ter as medidas regulamentares. Em 1920 dá-se a fusão com o Sport Comércio, altura em que ganhou a actual designação, Sport Comércio e Salgueiros.
A equipa de futebol atingiu a categoria máxima do futebol português pela primeira vez em 1943/44 - alguns anos antes de ter permitido um comício da campanha de Norton de Matos em Vidal Pinheiro, irritando o regime de Salazar -, mas o convívio com os grandes não foi fácil. Nas seis primeiras presenças terminou quatro vezes em último, uma em penúltimo e outra em antepenúltimo. Só nas décadas de 1980 e 90, com 18 participações em 20 anos, o clube se fixou no escalão principal. “Fui presidente entre 1985 e 1995, e esse foi o período de maior glória da vida do clube”, afirmou ao PÚBLICO Carlos Abreu, actual líder da comissão administrativa do Sport Comércio e Salgueiros e presidente do Salgueiros 08. “Foi então que teve maior estabilidade na I Divisão, melhores resultados desportivos e que mais cresceu a todos os níveis.”
Em 1990/91 conseguiu a sua melhor classificação de sempre no campeonato, o 5.º lugar, e ganhou o direito de participar pela primeira e única vez nas competições europeias. Só disputou uma eliminatória na Taça UEFA, mas levou o duelo com o Cannes até ao desempate nas grandes penalidades. No Porto, no Bessa, venceu a primeira mão (1-0) com um golo de Jorge Plácido contra uma equipa que incluía figuras como Luis Fernández, o croata Asanovic, o camaronês François Omam-Biyik, famoso pelo remate que derrotou a Argentina no jogo inaugural do Mundial 1990, e um jovem Zidane, que fez a sua estreia europeia nesse encontro e nos anos posteriores seria considerado um dos melhores futebolistas de sempre.
Andebol e pólo aquáticoMas nem só de futebol, modalidade em que bateu os três grandes de Portugal, vive e viveu o Salgueiros. Os seus primeiros campeonatos nacionais surgiram através do andebol, modalidade em que chegou a ter grandes equipas. “Uma das primeiras recordações que tenho eram os jogos de andebol de 11 em Vidal Pinheiro a que o meu pai me levava”, conta Carlos Abreu. O Salgueiros foi campeão nacional desta variante em 1964/65 e 1965/66. No andebol de sete, o mais conhecido, foi mesmo o segundo campeão nacional da história (1952/53) e é uma de apenas sete equipas que foram capazes de vencer o campeonato.
Anualmente, sempre no aniversário do clube, realiza-se a Volta a Paranhos, uma prova com tradição no atletismo português e que ontem foi conquistada por Marisa Barros (Benfica) e pelo queniano Evans Kiplagat. Presentemente, representam o clube mais de 500 atletas, divididos por futebol, andebol, atletismo, futsal e pólo aquático. Esta última secção, apesar de ter surgido regularmente somente em 1985, é a que mais títulos detém e a de maior sucesso na modalidade no país. O pólo aquático salgueirista venceu 14 campeonatos nacionais, 12 deles seguidos, e 12 Taças de Portugal.
Salgueiros 08O presente do Salgueiros é, contudo, muito delicado. No início deste século, depois de anos de má gestão, o Salgueiros afundou-se numa crise financeira gravíssima, de que resultou a queda da sua equipa de futebol, a mais representativa do clube, nos escalões inferiores, que incluiu uma despromoção administrativa da Liga de Honra e terminou, em 2004, na extinção dos seniores, uma vez que o clube estava (e está) impedido de inscrever novos jogadores. Segundo Carlos Abreu, o Salgueiros tem uma dívida acumulada de cerca de 15 milhões de euros e tem como credores o fisco, a Segurança Social e vários antigos atletas. “Nos últimos anos, já abateu muitas centenas de milhares de euros dessa dívida, mas é uma situação muito complicada”, referiu o dirigente, que regressou ao clube em 2005, depois da saída de José António Linhares.
As modalidades funcionam sem casa própria. Vidal Pinheiro já não existe e o novo complexo em Arca d’Água nunca passou da fase de projecto. No local do antigo estádio, o Salgueiros, sem recintos próprios e património, vai usando um sintético com poucas condições num terreno que pertence à Metro do Porto e que não chega para as encomendas.
A solução para o Salgueiros reactivar a sua equipa sénior foi a criação de um clube clone, o Salgueiros 08, que surgiu em 2008/09 e não teve outro remédio que começar por baixo, na II Divisão da Associação de Futebol do Porto. Desde então, a equipa amadora, apesar de estar nos Distritais, arrasta consigo uma grande massa de adeptos, que recuperaram a famosa “alma salgueirista”, agradam aos tesoureiros dos adversários e desejam já esta época o regresso aos Nacionais - o Salgueiros ocupa o 1.º lugar da Divisão de Honra da AF Porto. No entanto, a desejada fusão com o Sport Comércio e Salgueiros só poderá acontecer quando solucionar o grande problema da dívida.