Ágora de Bruxelas prepara-se para a indignação
David da Silva tem 24 anos e é português embora tenha vivido praticamente toda a sua vida em Espanha. Os pais emigraram para Barcelona quando tinha três anos. Encontramo-lo no átrio da Ágora Bruxelas, a “casa” dos indignados nestes dias pré-manifestação, no noroeste de Bruxelas.
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David da Silva tem 24 anos e é português embora tenha vivido praticamente toda a sua vida em Espanha. Os pais emigraram para Barcelona quando tinha três anos. Encontramo-lo no átrio da Ágora Bruxelas, a “casa” dos indignados nestes dias pré-manifestação, no noroeste de Bruxelas.
David não é um indignado típico. Não estava desempregado e nem sequer recebia mal. “Trabalhava como consultor de marketing e desenhava websites. O último salário que recebi foi de 1800 euros. Mas não era feliz. Prefiro ter pessoas ao meu lado e fazer um trabalho diferente”.
Por altura da criação do movimento 15M David largou tudo. Esteve “acampado” várias semanas na Praça da Catalunha, em Barcelona, e há cerca de dois meses pôs-se em marcha para Bruxelas. Chegou à capital belga no sábado passado. A sua missão, durante estes dias, tem sido recolher propostas e pô-las à consideração do Parlamento Europeu.
“Sinto que este movimento precisa de mais conhecimento. Não podemos ter - como tem acontecido aqui nas assembleias-gerais -, pessoas a bloquearem propostas só porque não conhecem determinados assuntos ou porque têm medo”, diz David ao PÚBLICO.
Depois desta jornada de luta, David quer voltar a Espanha e continuar a fazer trabalho em prol deste movimento. A sua ideia é começar um périplo pelas universidades espanholas - e talvez portuguesas - falando sobre o movimento e sobre a necessidade de uma mudança no actual status quo, dominado pelo PIB, pelo dinheiro e pelas dívidas.
Antes de mais, David é um defensor da liberdade de opinião, da horizontalidade e da responsabilidade individual. “Pretendo afastar-me um pouco dos indignados. Não gosto destes rótulos que os media nos põem. Que me chamem pelo nome - David da Silva - que é por isso que tenho um. Cada um de nós tem de ser responsável pelos seus actos. Basta de delegar as nossas responsabilidades aos políticos. Nós é que temos a responsabilidade final pelos nossos actos”, defende o português.
Uma marcha que se espera pacíficaTodas as apostas são válidas para o número de pessoas que desfilarão hoje pelas ruas de Bruxelas, onde estão sedeadas as instituições europeias. O “Le Soir” indicava hoje que é possível que a manifestação venha a agregar 3.000 pessoas.
Francisco Javier, um espanhol de 35 anos que caminhou desde Madrid até Bruxelas, considera que o movimento de hoje não é uma manifestação. É antes um “direito democrático dos cidadãos”.
Quer Francisco quer David consideram que a jornada de hoje será pacífica, mas temem que as coisas possam aquecer quando a polícia obrigar os indignados a saírem do quartel-general onde têm estado instalados até agora.
À porta do edifício da Hogeschool-Universiteit Brussel, onde estão instaladas várias centenas de pessoas, a polícia deixou nas últimas horas um edital deixando claro que os indignados terão de abandonar o edifício ainda hoje.
“Há algumas pessoas que gostavam de ficar com este edifício. Aquelas que se recusarem a sair vão levar. Aqui a polícia trabalha, não é como em Espanha”, opina David.
Na quarta-feira já houve problemas entre os manifestantes e a polícia. Um agente belga deu um pontapé na cara de uma manifestante, de origem grega, e foi imediatamente suspenso das suas funções.
Encontramos Barbara, uma espanhola de 23 anos, à porta da Ágora Bruxelas. Está a enrolar um cigarro e não teme. Acha que a manifestação de hoje vai decorrer sem problemas. Pacificamente.
Veio para Bruxelas reclamar o que é seu. Quer trabalhar e não consegue. Mas quer trabalhar com condições. “Não quero receber 600 euros e trabalhar 12 horas por dia, incluindo sábados e domingos”, diz a jovem, que estudou cozinha.
Bárbara veio até Bruxelas porque quer que as gerações futuras sejam diferentes. “Gostava que as próximas gerações aprendessem com os mais velhos. Que vivessem em comunidade. Que em vez de trabalharem oito horas por dia numa coisa, trabalhassem só quatro horas por dia fazendo coisas diferentes. Eu sei que soa a utopia, mas não sou a única a pensar assim”, diz.