Entre a falta de espaço e a qualificação excessiva

São a geração mais qualificada de sempre. Mas o mercado não tem lugar para todos. Há desmotivação e cada vez mais revolta

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Maria João contorna o desemprego com vendas num mercado do Porto MCP

No início do ano, Maria João dos Reis foi a uma entrevista de emprego para um trabalho no teleférico de Vila Nova de Gaia. Discretamente, disseram-lhe que era demasiado qualificada. Não a contrataram. Os currículos que enviou para gabinetes de arquitectura, área na qual tem um mestrado, não tiveram melhor fim: é qualificada, sim, mas não há lugar para ela.

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No início do ano, Maria João dos Reis foi a uma entrevista de emprego para um trabalho no teleférico de Vila Nova de Gaia. Discretamente, disseram-lhe que era demasiado qualificada. Não a contrataram. Os currículos que enviou para gabinetes de arquitectura, área na qual tem um mestrado, não tiveram melhor fim: é qualificada, sim, mas não há lugar para ela.

A realidade de Maria João é a realidade de muitos jovens licenciados em Portugal: o mercado que os devia receber não tem espaço, o outro não os recebe por serem demasiado qualificados para o lugar.

O retrato desta geração pode ser isto: “São mais qualificados, com mais conhecimentos, na maior parte das vezes completamente integrados nos novos contextos sócio-económicos”, explica Carlos Gonçalves, investigador que tem estudado a questão da empregabilidade dos licenciados.

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A maior parte das vezes, nem sequer obteve resposta aos CV que enviou MCP

Mas, à boleia da crise, a mesma geração não descola de outra realidade: “Foi-se percebendo que a licenciatura, ao contrário do que acontecia nas décadas de 70 e 80, deixou de ser garantia de emprego e de rápida inserção no mercado de trabalho”, continua o investigador.

200 euros por mês

É Sábado. Na Praça Carlos Alberto, no Porto, Maria João cumpre o ritual semanal: monta uma barraquinha no mercado Porto Belo, no qual vende a bijutaria e acessórios que faz durante a semana. Ao fim do mês junta 200 euros. Contorna desta forma o estatuto de desempregada que lhe colaram desde que terminou o mestrado em Arquitectura, em 2009.

Admite que perdeu a conta exacta aos currículos que enviou: “Uns 30 em Portugal, uns 20 para fora”. Respostas positivas: zero. Nunca foi a uma entrevista de emprego da área para a qual estudou.

Em Portugal, o mais comum é a completa ausência de respostas. Algo que a jovem de 31 anos não compreende: “Sei que os gabinetes de arquitectura recebem dezenas de propostas todos os dias, mas há uma coisa que se chama resposta automática...”, lamenta.

A fase da revolta 

Maria João está magoada, desiludida. Diz que já desistiu de ser arquitecta - “Já não me interessa” –, porque se sente desvalorizada. “O que mais me desiludiu foi perceber que ninguém quer pagar, só procuram estagiários”. E completa: “Não trabalho de graça, é uma questão de princípio”.

O perfil da jovem é bem conhecido por Carlos Gonçalves: “As pessoas não veêm reconhecidos aspectos como estabilidade e uma carreira profissional e isso cria insatisfação e desmotivação”.

A etapa seguinte, a da “revolta”, já se faz sentir em Portugal – “Os jovens reagem cada vez pior a isto”, admite o investigador. Mas não é, para já, o caso de Maria João, embrulhada na desmotivação: “Se protestos de rua resultassem já se tinha visto, depois do 12 de Março”, conclui.