Amy Winehouse: uma vida no fio da navalha
O talento não se finge. E nesse aspecto Amy era verdadeiramente talentosa como só conseguem ser aqueles que actuam a partir das entranhas. Como se não pudesse ser de outra maneira. Amy não fingia. Não era uma estrela pop confeccionada à medida do consumidor. Era errática e cambaleante. Era assumida. Era verdadeira.
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O talento não se finge. E nesse aspecto Amy era verdadeiramente talentosa como só conseguem ser aqueles que actuam a partir das entranhas. Como se não pudesse ser de outra maneira. Amy não fingia. Não era uma estrela pop confeccionada à medida do consumidor. Era errática e cambaleante. Era assumida. Era verdadeira.
Nascida a 14 de Setembro de 1983 no seio de uma família judia instalada em Finchley, no norte de Londres, Winehouse cresceu a ouvir álbuns de jazz que lhe chegavam às mãos através do seu pai Mitch, taxista. Ele e a mãe de Amy, Janis, acabaram por se divorciar mas isso não impediu que, aos oito anos, Winehouse já se apresentasse em palco a cantar e a representar. Sabe-se que chegou a frequentar a prestigiada escola de teatro Sylvia Young, no centro de Londres, da qual acabou por ser expulsa por não se aplicar nos estudos.
Os seus instintos rebeldes despontaram cedo: aos 16 anos fez a primeira tatuagem e começou a fumar cannabis. “Os meus pais depressa perceberam que eu faria tudo o que me apetecesse e basicamente foi isso”, explicou Amy, citada pelo “The Guardian”.
Entretanto a sua voz profunda, cheia de soul, começou a fazer-se ouvir com crescente insistência e um namorado de então resolveu enviar uma demo de Amy a um estúdio musical. O letrista Felix Howard, que ouviu a voz da jovem, ficou impressionado. “Aquilo era diferente de tudo o que já me tinha passado pelas mãos”, recorda, citado pelo “The Guardian”.
Depressa Amy assinou um contrato com uma das maiores produtoras musicais do mundo: a Universal, sob a alçada directa de Simon Fuller, o homem que está por detrás de gigantes de popularidade como o “American Idol”.
Esta proximidade com o epicentro dos fenómenos pop mundiais tornou Amy ainda mais defensiva e marginal. O “The Guardian” recorda que, quando foi acusada de ser um dos fantoches de Fuller, terá dito, de forma menos polida, que o produtor era “esperto o suficiente” para saber que não se podia “meter” com ela.
O álbum “Frank” foi lançado logo após o vigésimo aniversário de Amy e não foi além do 13º lugar nas tabelas de popularidade, mas a voz da cantora fez-se notar.
Foi quando Amy acabou de promover este álbum e se começou a preparar para escrever e interpretar o seu segundo álbum que a cantora conheceu o homem que viria a ser seu marido: Blake Fielder-Civil (um assistente de videoclips musicais).
A atracção foi instantânea mas os dois terminariam a sua relação daí a poucos meses (sempre tiveram um relacionamento on-off), tendo Amy caído numa depressão da qual resultou o multi-premiado álbum “Back to Black”.
Nos meses a seguir à separação, Amy confessou: “Nunca tinha sentido por ninguém o que senti por ele. Eu achava que nós nunca mais nos veríamos. Quis morrer”.
O álbum foi finalmente lançado em 2006 e quando Winehouse começou os concertos promocionais, o sucesso foi quase instantâneo.
Por essa altura a música “Rehab” - premonitório do que seria a sua vida a partir daí - esteve 57 semanas no top.
O público descobria por esta altura uma artista que cantava directamente das profundezas da sua alma e expunha as suas feridas à vista de todos. Sem medos.
Mas a partir de 2007 Amy começou a abraçar o seu lado mais auto-destrutivo. Passou a ser notícia por causa dos seus excessos de álcool e drogas, potenciados pelo facto de ter reatado a sua reacção com Blake Fielder-Civil, que também consumia estupefacientes. Os dois casaram-se em Miami em Maio de 2007.
Em Londres, os paparazzi seguiam-na para todo o lado, filmando os seus modos erráticos, as suas tatuagens e a sua imagem de marca: o enorme apanhado de cabelo que lhe compunha o topo da cabeça.
O casamento de Amy e Blake criou um mostro de duas cabeças alimentado a drogas duras. No Verão de 2007 Amy sofreu uma primeira overdose e começou uma série de tratamentos de reabilitação.
Em Novembro, Fielder-Civil foi detido por ter agredido o dono de um bar e mais tarde lhe ter oferecido dinheiro para se manter calado acerca do incidente. Durante a sua ausência, Amy tentou manter-se à tona como podia, mas chegou a cancelar alguns concertos. Em Fevereiro de 2008, a sua consagração mundial chegou sob a forma de cinco Grammy.
A relação entre Amy e Blake terminou quando Fielder-Civil foi condenado, em Julho de 2008, a uma pena de 27 meses de prisão. Apesar de ter dito que iria esperar por ele, os dois divorciaram-se em 2009 e ela mudou-se temporariamente para a ilha de St. Lucia, nas Caraíbas, para fugir ao ambiente de Londres, com demasiadas tentações.
Depois de Blake, Amy encetou uma série de outras relações, a mais recente das quais com o realizador Reg Traviss.
Winehouse estava igualmente a preparar o seu novo álbum. Lucian Grainge, director da editora Universal e que tem em sua posse algumas músicas que deveriam constar do novo trabalho, já declarou que as amostras são “fantásticas”.
Entretanto Amy tinha lançado a sua própria editora, a Lioness, cuja primeira cantora a apoiar foi a sua afilhada Dionne Bromfield, de 13 anos.
Mas Winehouse continuava, nos últimos tempos, a viver no fio da navalha: foi detida diversas vezes por desordem pública, foi hospitalizada por causa de um enfisema, foi na sequência de uma infecção causada pelos implantes mamários... Mais recentemente, em Belgrado, Amy apareceu em palco completamente embriagada. O concerto foi apelidado pelos espectadores de vergonhoso e os agentes de Amy viram-se obrigados a cancelar o resto da sua digressão europeia, incluindo a sua vinda a Portugal, agendada para Agosto no Festival do Sudoeste.
A última vez que foi vista em público foi em Camden, o bairro londrino em que vivia, e a sua mais recente gravação em estúdio foi um dueto com Tony Bennett, que consta de um álbum de duetos deste cantor que será lançado em Setembro.