Da justiça como paliativo
Como bom "liberal", Robert Redford ainda anda às voltas com as histerias americanas do pós-11 de Setembro. "A Conspiradora" é puro "trompe l''oeil": a acção passa-se no século XIX, mas é para ser vista com um molho de chaves do século XXI. Narra um episódio sucedido na sequência do assassinato de Abraham Lincoln, aqui guindado à condição de acontecimento traumático exemplar, disponível para todas as analogias com esse mais recente trauma orquestrado pelo falecido Osama Bin Laden.
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Como bom "liberal", Robert Redford ainda anda às voltas com as histerias americanas do pós-11 de Setembro. "A Conspiradora" é puro "trompe l''oeil": a acção passa-se no século XIX, mas é para ser vista com um molho de chaves do século XXI. Narra um episódio sucedido na sequência do assassinato de Abraham Lincoln, aqui guindado à condição de acontecimento traumático exemplar, disponível para todas as analogias com esse mais recente trauma orquestrado pelo falecido Osama Bin Laden.
Demora tempo até que se perceba onde quer Redford chegar, contudo. Nos anos 30 filmava-se o assassinato de Lincoln como uma elipse (Ford, DeMille), por pudor, por economia narrativa, ou simplesmente para não fazer chover no molhado. Em 2011 a papa tem que ser bem moída: é certo que serve para ir apresentando personagens, mas a meia-hora inicial de "A Conspiradora", pachorrenta recriação da noite da morte de Lincoln, é praticamente inútil. Arrancar, arrancar, só depois dessa meia-hora: é quando, na impossibilidade de deitar a mão a John Wilkes Booth, se reúnem os suspeitos que estão à mão e se os leva a julgamento (novo toque de campainhas).
Entre esses suspeitos, a gerente da pensão (Robin Wright) onde os conspiradores sulistas se acolitavam, acusada de ser tão conspiradora quanto eles. Para a defender é destacado um jovem oficial "yankee" (James McAvoy), inicialmente não muito convicto da sua tarefa. Começa o "courtroom drama", em ambiente agreste destinado a expor o conflito central do filme, mais uma vez aberto a todas as ressonâncias contemporâneas: deve a justiça servir-se apenas e só a si mesma (ou seja, procurar ser "justa", nos métodos e nas conclusões) ou ceder aos ares do tempo, pondo-se ao serviço de um patriotismo instintivo, funcionar como mero instrumento de reparação emocional colectiva? Todos sabemos qual é a resposta certa, e também todos sabemos que as coisas são o que são. Enunciada a premissa, "A Conspiradora" não tem mais para dar além da sua ilustração, academicamente encenada como vulgar "filme de tribunal" apenas adaptado às circunstâncias, sem chama nem desejo de cinema. Um dia pegar-se-á em "A Conspiradora" como exemplo sintomático do que foi o princípio do século XXI americano; por agora, é só um filme maçador de um cineasta, Redford, que quase não os tem de outra espécie.