Eduardo Catroga: "O PS quer ver-se livre de Sócrates mas precisa de perder as eleições"

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Catroga defende que o eleitorado tem de castigar Sócrates Daniel Rocha

O antigo ministro das Finanças de Cavaco Silva caracteriza-se a si mesmo como um gestor de empresas que fez "umas coisas" na universidade, pois gosta "de dar aulas e de estudar". E que está disponível para a política. Por isso, aceitou coordenar a elaboração do programa eleitoral do PSD. Que explica, insistindo na ideia de que o eleitorado tem que castigar eleitoralmente o PS e responsabilizar José Sócrates pela crise.

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O antigo ministro das Finanças de Cavaco Silva caracteriza-se a si mesmo como um gestor de empresas que fez "umas coisas" na universidade, pois gosta "de dar aulas e de estudar". E que está disponível para a política. Por isso, aceitou coordenar a elaboração do programa eleitoral do PSD. Que explica, insistindo na ideia de que o eleitorado tem que castigar eleitoralmente o PS e responsabilizar José Sócrates pela crise.

O programa do PSD sobrevive às soluções da troika?

Quando me reuni com a troika, comecei por dizer-lhes: ainda bem que esta missão é aberta, vai falar com os partidos políticos, com a sociedade civil, com representantes empresariais, etc. Lamentamos que a missão que a União Europeia e o BCE mandaram cá em Fevereiro, e que está na origem desta crise política, tenha sido uma missão clandestina. Entreguei também um documento em que fazemos a análise crítica do modelo grego. E apresentei as nossas medidas. A troika absorveu medidas mas não absorveu adequadamente a nossa filosofia de virar a austeridade agora totalmente para o Estado, para o sector empresarial do Estado, para as parcerias público-privadas. Mas continua a apostar no aumento de impostos. Somos contra isso.

Como putativo ministro, aceita ficar responsável pelas Finanças com este programa da troika?

O programa do PSD não põe em causa os objectivos de variações orçamentais nem os das políticas estruturais, mas nós garantimos uma coisa: se o PSD for Governo, fica com a liberdade de os convencer tecnicamente de propostas de medidas alternativas sem prejuízo dos objectivos. Ao contrário do PS, que aceitou passivamente tudo - e ao arrepio do que dizia o primeiro-ministro que nunca governaria com o FMI e que assinou sem restrições -, nós, na nossa carta deixamos essa condição. O país foi levado à bancarrota por um conjunto de políticas erradas e não tinha outra alternativa senão intensificar o plano de ajuda externa, porque ajuda externa já temos há um ano e tal, com 40 mil milhões de euros do BCE; agora são mais 78 mil milhões de euros. É apenas a segunda etapa.

Não teme que venha a haver mais desemprego e tensão social?

Não. Por isso é que faz parte do programa do PSD - e isto é inédito a nível mundial - um programa de emergência social. Toda a nossa estratégia é no sentido de virar a austeridade para o Estado e não para os grupos mais desfavorecidos, como queria o PS, congelando pensões de 200 euros e abarcando um milhão de pensionistas.

O senhor garante que o PSD não mexe nas prestações sociais?

Com certeza. O PSD é o defensor do Estado social. Quem está a destruir o Estado social é o PS.

Mas é o Estado social mínimo...

Não, não, não. É o Estado social sustentável pelos portugueses. Não podemos ter o Estado social que não seja sustentável pelas famílias e pelas empresas. A defesa do Estado social passa por pôr a economia a crescer, por criar emprego. Infelizmente temos de aceitar a pílula amarga para os próximos dois anos a que as políticas de José Sócrates conduziram este país. A troika salientou que o PEC IV era uma abstracção, que não servia, que o Governo devia ter pedido há mais tempo a ajuda externa. O facto de se ter atrasado teve sobrecustos financeiros, sobrecustos no desemprego e sobretudo sobrecustos da dureza das medidas. O que falta para responsabilizar quem levou o país à bancarrota?

O que falta então?

É o voto do povo.

Mas as sondagens...

Repare: o Hitler tinha o povo atrás de si até à derrocada, até à fase final da guerra. Faz parte das características dos demagogos conseguirem arrastar multidões. José Sócrates, honra lhe seja feita, é um grande actor, um mentiroso compulsivo, que vive num mundo virtual em que só ele tem razão. Tem uma máquina de propaganda montada há seis anos, poderosa. E o PSD tem uma máquina artesanal no campo da comunicação. Mas eu tenho esperança que o bom senso prevaleça entre os portugueses e que quem levou o país à falência não pode liderar o processo de recuperação.

A situação do país não pode obrigar o PSD a alguma forma de entendimento com o PS? No caso de o PSD ganhar, é suficiente um Governo de direita com o CDS?

Acho que não. Mas essa divisão esquerda/direita dos anos 60, à francesa, está ultrapassada. O PS é o quê? Hoje há conservadores que são os partidos à esquerda que não querem adaptar a sociedade, em termos de flexibilidade, ao mundo globalizado, que têm posições rígidas na economia e não adaptáveis aos ventos da mudança. E depois há os progressistas, que são aqueles que querem competitividade compatibilizada com a justiça social e com coesão social, aqueles que querem o Estado forte regulador, um Estado capaz de estar ao serviço dos cidadãos e das empresas, financeiramente sustentável pelas famílias e pelas empresas, que não tem dívidas.

Mas como é que consegue governar com uma pessoa que acaba de caracterizar como "mentiroso compulsivo"?

Era importante que os portugueses resolvessem esse dilema do PS. O PS quer ver-se livre de José Sócrates, mas só se vê livre de José Sócrates se perder as eleições por uma margem significativa.

Mas ele foi agora eleito em congresso.

Mas isso faz parte da mise en scène partidária. Falamos com vozes influentes no PS e estão desejosos que Sócrates perca e com uma diferença significativa. O país precisa da renovação do PS, que o PS tenha um líder que não seja alvo de chacota como foi ontem no Financial Times. O PS tem um problema, foi capturado por um segmento defensor dos interesses instalados na sociedade. Portugal está encurralado. Há um grupo de interesses - não digo que seja só no PS - com ramificações políticas, sobretudo concertado com quem está no poder, algumas grandes empresas, alguns grandes empresários que não quero discriminar, que controlam a alocação de recursos do país. Temos meia dúzia de anos para inverter esta situação, senão Portugal transforma-se na Itália do Sul, sem a Itália do Centro e do Norte a produzir riqueza.