Águas Mil
Pronto há mais de dois anos, e mostrado, salvo erro, na edição 2009 do IndieLisboa, a segunda longa-metragem de ficção de Ivo M. Ferreira chega agora às salas comerciais. (Estas longas esperas pela estreia já foram normais para os filmes portugueses, depois deixaram de ser, e agora se calhar vão voltar a ser, porque o gargalo do parque de salas é cada vez mais estreito e todo o filme que não for uma pequena máquina de vender pipocas é, por regra, pouco desejado).
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Pronto há mais de dois anos, e mostrado, salvo erro, na edição 2009 do IndieLisboa, a segunda longa-metragem de ficção de Ivo M. Ferreira chega agora às salas comerciais. (Estas longas esperas pela estreia já foram normais para os filmes portugueses, depois deixaram de ser, e agora se calhar vão voltar a ser, porque o gargalo do parque de salas é cada vez mais estreito e todo o filme que não for uma pequena máquina de vender pipocas é, por regra, pouco desejado).
Adiante. "Águas Mil" é um evidente progresso em relação à primeira longa de Ivo Ferreira, "Em Volta", que era um "travelogue" demasiado amorfo e um inquérito cultural (sobre "o amor") demasiado naif. Seguramente menos amorfo e menos naif, "Águas Mil" preserva alguma coisa de "travelogue" - viagem pelo Sul de Portugal e Andaluzia - e de inquérito, neste caso, familiar. O protagonista, cujo pai se perdeu algures durante o PREC (ninguém sabe, ou ninguém quer contar, o que lhe aconteceu), descobre em casa da avó a memorabilia suficiente para lhe espicaçar a curiosidade e, muitos anos depois, ir tentar perceber o que se passou com o pai (e com a mãe, e com os amigos do pai e da mãe).
Os filhos do PREC a olhar para os pais e a tentar compreender o que é que eles foram, se quisermos resumir "Águas Mil" telegraficamente. A distância é tão grande que para chegar a essa compreensão é necessário como que montar um "puzzle", ou entrar numa espécie de "rally paper". Isto o filme sugere bem - com os três carros a seguirem-se uns aos outros, e com o aproveitamento de certos cenários (o episódio naquela absurda cidade "western" da Andaluzia, relíquia do tempo em que os italianos lá iam filmar as suas coboiadas "spaghetti"). Assim como sugere o esvaziamento ideológico: o único lugar para a "revolução" é o teatro, na peça em que o protagonista trabalha, e que é usada como uma espécie de coro.
Inteligente, às vezes fino (a enigmática "resolução" do mistério), só é pena que "Águas Mil" não seja capaz de evitar que a sobriedade da sua narração, muito "clássica", se deixe invadir (e desequilibrar) por alguma moleza demasiado convencional.