Cartéis da droga mexicanos expandem-se com violência

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Laboratório de metanfetaminas do cartel Sinaloa, no México Foto: Jorge Dan Lopez/Reuters

Em pouco mais de dez anos, desde que se escapou da cadeia, escondido por entre a roupa suja a caminho da lavandaria, Joaquin Shorty Guzmán transformou o cartel Sinaloa, o maior grupo mexicano envolvido no tráfico de droga, num império multinacional alegadamente com ramificações em mais de 50 países.

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Em pouco mais de dez anos, desde que se escapou da cadeia, escondido por entre a roupa suja a caminho da lavandaria, Joaquin Shorty Guzmán transformou o cartel Sinaloa, o maior grupo mexicano envolvido no tráfico de droga, num império multinacional alegadamente com ramificações em mais de 50 países.

A sede desta poderosa organização, que segundo a insuspeita revista Forbes inscreveu o nome de Guzman na lista das fortunas de mais de mil milhões de dólares, fica na cidade de Culiacan, no Norte da costa pacífica - bem longe da zona fronteira da Guatemala, que se converteu, por ora, na sua mais sangrenta filial.

É ali que o cartel de Guzmán trava actualmente a guerra territorial contra o seu igualmente temível rival, os Zetas. Os Sinaloa estabeleceram as suas bases na região oeste da Guatemala, e os Zetas estão a explorar o corredor norte, que abre directamente para o estado mexicano de Chiapas. Algures pelo caminho, o confronto tornou-se inevitável.

A violência na zona de fronteira levou o Governo do presidente Álvaro Colom a declarar estado de sítio na província de Alta Verapaz em Dezembro, uma medida tomada para permitir às autoridades efectuar detenções ou levar a cabo buscas sem mandado judicial. Em menos de um mês, a polícia deteve 18 traficantes de droga, apreendeu 150 armas, cinco avionetas e mais de 60 mil dólares em notas.

A resposta surgiu no princípio deste ano. "Esta é uma mensagem para o Presidente da Guatemala. Somos o grupo Los Zetas e queremos que saiba que o país começará a pagar. Vai começar a guerra, em centros comerciais, escolas e esquadras da polícia", dizia uma missiva deixada numa rádio da cidade de Cóban, com a seguinte advertência: "Se não transmitirem o recado, queimamos a estação e matamos os seus donos e familiares."

Activistas de direitos humanos citados sob anonimato pela Associated Press dizem que "as coisas estão bem pior do que nos anos 80", quando a Guatemala viveu uma devastadora guerra civil. "Há mais de dois anos que andamos a pedir protecção contra estas pessoas de fora que vieram instalar-se aqui", recordam.

Colom manteve-se firme e admitiu mesmo alargar o estado de sítio às outras quatro províncias que fazem fronteira com o México. O Presidente reagiu à ameaça sem dizer palavra sobre uma das acusações dos Zetas: a de que teria aceite mais de 11 milhões de dólares dos traficantes para se fazer eleger em 2007.

O tempo dos marras

Além da Guatemala, os Zetas estão já instalados na costa caribenha das Honduras e em El Salvador - os três países que constituem o triângulo norte da América Central são agora um dos locais mais violentos do mundo. No México, terreno de violência brutal dos cartéis da droga, a taxa de homicídios é de 12 por 100 mil habitantes, de acordo com as estatísticas coligidas pelas Nações Unidas. Na Guatemala, é consideravelmente mais alta: uma média de 45 assassinatos por 100 mil habitantes (os números reportam-se ao ano de 2008).

E a elevada taxa da Guatemala não difere muito da dos países vizinhos: El Salvador, com 52 homicídios por 100 mil habitantes, ou Honduras, onde o valor é de 61 mortos por 100 mil pessoas. Os responsáveis por tanta violência são os chamados "marras", grupos de jovens delinquentes "que não respeitam ou valorizam a vida ou a liberdade e se tornaram recrutas dos cartéis da droga", explica a dirigente do Conselho Nacional de Segurança de El Salvador, Aída Santos de Escobar.

Os marras são aliados naturais para os traficantes de droga, explica Eric Olson, editor de um estudo do Woodrow Wilson Center e da Universidade de San Diego, nos Estados Unidos, sobre a expansão dos cartéis, acossados no México, para os países empobrecidos da América Central. "Os Sinaloa e os Zetas basicamente subcontrataram as redes marginais que já existiam, mas que se dedicavam a outro tipo de tráfico: de contrabando, de filmes pirateados ou roupas", refere.

Os cartéis compram ou ocupam propriedades rurais e usam-nas simultaneamente como campos de treino. Os Zetas, um spin-off das brigadas de tropa especial mexicanas, aliaram-se aos Kaibiles, unidades de elite do exército da Guatemala, confrontados com o desemprego.

A pobreza é uma das razões que explica a fácil penetração dos traficantes nesses países. A fragilidade dos governos e instabilidade política é outro factor de atracção. Os Sinaloa marcaram a sua entrada nas Honduras com o assassínio do responsável nacional pelo combate ao tráfico de droga (2009).

Mas o império gerido por Guzmán é mais global e estende-se do México pela América Central até à Colômbia, e para bem mais longe: Europa, Índia, China. Como explicou à Reuters um dirigente da DEA, agência antidroga norte-americana, a marijuana é cultivada no México, a cocaína chega da Colômbia e as metanfetaminas são fabricadas na China. Os Estados Unidos são o grande destino de todos estes produtos - e o cartel Sinaloa detém uma quota maioritária de 60 por cento do mercado.

Padres exorcistas no combate ao crime

A Igreja católica do México decidiu formar mais padres exorcistas para combater a crescente "influência de Satanás e do maligno" que, na sua opinião, está por trás da violência e criminalidade que causaram a morte de mais de 30 mil pessoas nos últimos quatro anos.

O objectivo é ter um sacerdote especializado em exorcismos em cada paróquia do país. Esse religioso não lidará directamente com as forças da autoridade, mas contribuirá para o combate ao narcotráfico, "oferecendo resgate aos que foram influenciados pelo mal", explicou o coordenador do grupo de exorcistas da Cidade do México, Pedro Mendoza Pantoja, à BBC Mundo.

"O trabalho do demónio tornou-se demasiado fácil", diz o sacerdote, referindo o recurso ao espiritismo, ocultismo, bruxaria e venerações semipagãs, como o culto da Santa Morte por parte dos cartéis da droga. "Há muita gente que se afasta de Deus e busca o mágico como saída fácil para os problemas", lamenta.