Mãe há só duas
As estrelas, as que incendeiam o ecrã, constituem uma espécie em vias de extinção. Por outro lado, a comédia romântica perdeu-se em caminhos repetitivos. Ora, "Os Miúdos Estão Bem" de Lisa Cholodenko, realizadora que passou pela televisão e que já nos dera um curioso "Atracção Acidental" (2002), possui desde logo duas interessantes facetas: repousa no poder comunicativo das vedetas possíveis, Annette Benning e Julianne Moore transformando-o num veículo para o seu carisma incontestável; reformula os mecanismos da comédia, deslocando-a para territórios inexplorados, os de uma fábula moral destinada a explorar novas sexualidades e diferentes conceitos de família.
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As estrelas, as que incendeiam o ecrã, constituem uma espécie em vias de extinção. Por outro lado, a comédia romântica perdeu-se em caminhos repetitivos. Ora, "Os Miúdos Estão Bem" de Lisa Cholodenko, realizadora que passou pela televisão e que já nos dera um curioso "Atracção Acidental" (2002), possui desde logo duas interessantes facetas: repousa no poder comunicativo das vedetas possíveis, Annette Benning e Julianne Moore transformando-o num veículo para o seu carisma incontestável; reformula os mecanismos da comédia, deslocando-a para territórios inexplorados, os de uma fábula moral destinada a explorar novas sexualidades e diferentes conceitos de família.
A ideia de jogar com o estafado conceito do triângulo amoroso no contexto de um par de lésbicas, que cria os filhos adolescentes (um rapaz e uma rapariga) num ambiente de abastada harmonia familiar, esboça um pano de fundo adequado para brincar com os conflitos de uma pacífica realidade suburbana e abre para parâmetros de discussão dos labirintos comportamentais. A cena de amor entre as duas mulheres tem a vantagem de gerar uma estranheza representativa que interroga, de modo radical, a existência de tabus e proporciona uma comicidade controlada (e renovada).
Tudo se complica quando os dois jovens decidem procurar o pai biológico (um Mark Ruffalo capaz de dar réplica condigna às estrelas), um dador de esperma que ignora o resultado factual da sua antiga contribuição envolvendo-se com uma das mães, uma arquitecta frustrada. O resultado é menos excitante do que pareceria à primeira vista: cedo caímos no "déjà vu", com o casal lésbico desavindo e os filhos revoltados com a intromissão do "macho" apaixonado. O que poderia resultar numa revisita revigorante a um género moribundo acaba por se esgotar em "clichés": a rapariga que vai para a universidade acompanhada pelo irmão e pelas mães; o amor "verdadeiro" que triunfa no epílogo algo forçado; uma moralidade que conforta pelo final feliz.
O que fica, pois, de todo o esforço para fazer diferente? Relativamente pouco. Instala-se um clima de doce modorra narrativa, sem que a realizadora consiga ultrapassar o previsível, numa receita bem comportada e recheada de abundantes lugares-comuns. Salva-se a função estelar de Moore e Benning. "Os Miúdos Estão Bem" vive delas, da sua química particular, das suas mudanças de registo e só existe porque elas entendem a fragilidade da proposta e se empenham em mostrar como o cinema ainda se alimenta de pequenos nadas, de olhares furtivos, de carícias escondidas.