Governo já tem calendário para entregar suburbanos de Lisboa e Porto a privados

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As receitas da CP Lisboa cobrem quase 90 por cento das despesas Foto: Pedro Cunha

Está assim quebrado um dos tabus do Governo acerca da eventual privatização da CP, que neste caso passa apenas pela concessão, e só nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. O que envolve quatro linhas a sul (Cascais, Sintra, Azambuja e Sado) e outras quatro a norte (Braga, Guimarães, Caíde e Aveiro). E o que pode mudar para os passageiros? Pode mudar apenas a cor dos comboios e a farda dos revisores, ou pode mudar absolutamente tudo, desde horários ao tarifário.

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Está assim quebrado um dos tabus do Governo acerca da eventual privatização da CP, que neste caso passa apenas pela concessão, e só nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. O que envolve quatro linhas a sul (Cascais, Sintra, Azambuja e Sado) e outras quatro a norte (Braga, Guimarães, Caíde e Aveiro). E o que pode mudar para os passageiros? Pode mudar apenas a cor dos comboios e a farda dos revisores, ou pode mudar absolutamente tudo, desde horários ao tarifário.

Tudo depende do modelo utilizado pelo Governo para concessionar estes serviços - que se caracterizam por uma elevada procura. Ao contrário do serviço ferroviário regional (que definha à míngua de passageiros), os suburbanos constituem um mercado interessante para os privados desde que o Estado não os obrigue a praticar o tarifário reduzido que impõe à CP ou, então, que lhes pague indemnizações verdadeiramente compensatórias, como não tem feito com a CP.

Nos suburbanos de Lisboa viajaram em 2009 mais de 92 milhões de passageiros. As receitas desta unidade de negócios cobre quase 90 por cento das despesas, ou seja, a CP Lisboa está quase a ter lucros e já os teria tido se a empresa não tivesse estado impedida durante dois anos de aumentar os bilhetes e não sofresse ainda hoje da má distribuição das receitas do passe social, que favorece a rodovia em detrimento da ferrovia.

Sul paga mais

No caso do Porto, a taxa de cobertura aproxima-se dos 60 por cento, mas tem vindo a crescer de forma consolidada. Os suburbanos transportaram no ano passado quase 21 milhões de passageiros, gerando proveitos de 21 milhões de euros contra despesas de 36,6 milhões. Também aqui a CP é obrigada a praticar tarifas reduzidas que não espelham os seus custos, sendo uma incógnita como tal poderia ser feito com um operador privado sem que o Estado aumentasse a sua despesa a compensá-lo.

Em média, um passageiro do Porto paga 3,4 cêntimos por quilómetro sobre carris, contra um de Lisboa que paga 6,1 cêntimos por cada quilómetro percorrido. Na Fertagus. empresa que detém a concessão dos suburbanos Lisboa-Pragal-Setúbal, a base tarifária média é de cinco cêntimos.

A braços com uma dívida crescente, e perante um accionista Estado pouco generoso, sucessivas administrações da CP têm proposto ao Governo a contratualização do serviço público. Isto é, a empresa compromete-se a prestar um serviço em determinados horários com frequência, preços de bilhetes e índices de pontualidade preestabelecidos, em troca de uma indemnização que compense o défice.

As futuras concessões poderão incluir o próprio pessoal e comboios da CP ou, em alternativa, trabalharem com recursos próprios. No primeiro caso não teriam a flexibilidade laboral dos privados, pois estariam sujeitos aos acordos colectivos de trabalho dos ferroviários; no segundo, deixariam a empresa estatal, já sobredimensionada, com ainda mais excedentários.

"Partir" as linhas

O modelo de concessão pode incluir toda a rede da CP Lisboa e da CP Porto, ou pode ser partido linha a linha, "vendendo-se" cada uma isoladamente. Foi o que aconteceu na Inglaterra, onde se criaram microconcessionárias que logo se deram conta das dificuldades que isso criava na articulação do sistema ferroviário e da falta de dimensão crítica para poderem operar. Nesse caso, o próprio mercado se encarregou de provocar fusões entre empresas, que funcionam hoje com razoável agrado dos passageiros.

Na corrida para as concessões portuguesas dois grupos manifestaram já o seu interesse: a Barraqueiro (que já detém a Fertagus) e a Arriva.