Câmara de Portimão aprova quase o dobro da construção depois de o terreno mudar de proprietário

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Prédio que se vê encostado à fábrica demolida foi autorizado com apenas três pisos Foto: Melanie Map's

A Câmara de Portimão aprovou em Março a construção de um bloco de habitação com uma área de pavimento superior em 83 por cento à que viabilizara em 2002 para o mesmo local, mas para outro dono. O terreno onde o projecto vai ser erguido situa-se na estrada que liga a cidade à Praia da Rocha e foi comprado em 2004 pelo grupo imobiliário e hoteleiro RR. Entre os administradores e proprietários deste grupo encontra-se Fernando Rocha, o presidente do Portimonense que foi vice-presidente da câmara local em 2002 e 2003, eleito pelo PS.

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A Câmara de Portimão aprovou em Março a construção de um bloco de habitação com uma área de pavimento superior em 83 por cento à que viabilizara em 2002 para o mesmo local, mas para outro dono. O terreno onde o projecto vai ser erguido situa-se na estrada que liga a cidade à Praia da Rocha e foi comprado em 2004 pelo grupo imobiliário e hoteleiro RR. Entre os administradores e proprietários deste grupo encontra-se Fernando Rocha, o presidente do Portimonense que foi vice-presidente da câmara local em 2002 e 2003, eleito pelo PS.

Meses depois de adquirirem os 10.250 m2 onde funcionou durante décadas a fábrica de conservas Facho, por cima da marina e das ruínas classificadas do Convento de São Francisco, os anteriores proprietários apresentaram, em 2002, uma proposta de urbanização para toda a parcela. Considerando que ela se encontrava numa zona de expansão urbana, a câmara viabilizou, ainda em 2002, a construção de quatro edifícios de apartamentos, com 2640 m2 numa primeira fase, do lado da Praia da Rocha, e de mais quatro edifícios, com 2485 m2 numa segunda fase, na parte restante.

Ambos os conjuntos previam prédios com um máximo de quatro pisos, sendo que o da segunda fase teria de deixar um espaço livre entre dois blocos, por forma a permitir a visualização da chaminé da antiga fábrica no eixo do convento. O coeficiente de ocupação do solo (COS - quociente entre a área de construção e a área da parcela) então aceite era de 0,5 em cada uma das fases e no conjunto das duas - o máximo previsto no Plano Director Municipal de 1995 para as zonas de expansão urbana.

Já em 2004, depois de finda a construção da primeira fase, os então donos do terreno, Jaqueline Dimas e familiares, venderam as quotas da sociedade proprietária a Fernando Rocha e aos seus sócios. Passados cinco anos, estes apresentaram um novo projecto para os 4970 m2 disponíveis.

Em vez dos 2485 m2 aprovados em 2002, a proposta previa 4545 m2, com um COS de 0,91, distribuídos pelos cinco pisos de um bloco contínuo do qual desaparecia a abertura para visualização da chaminé. A primeira informação da Divisão de Urbanismo foi claramente negativa, salientando que o terreno se encontrava numa zona de expansão urbana (COS de 0,5). No despacho proferido em Dezembro passado sobre esta informação, o director do Departamento de Urbanismo, Agostinho Escudeiro, escreveu: "Concordo com a classificação do espaço urbano, uma vez que a mesma foi dada em 2002 e nunca houve contestação da mesma." Quem não concordou foi um arquitecto exterior à câmara, que coordenou a elaboração do PDM, e que, ainda em Dezembro, subscreveu um "esclarecimento" pedido dias antes pelo mesmo director que concordara com a classificação de 2002. De acordo com aquele arquitecto, que invocou a insuficiente escala das plantas usadas na câmara para justificar a interpretação contrária, a fábrica Facho, afinal, não está em zona de expansão urbana (COS 0,5), mas sim num "espaço urbano consolidado". Como nestas zonas se determina a área de construção em função do COS da área envolvente - e a média calculada pelos actuais donos (com dados errados) é de 1,13 -, Escudeiro propôs em Março a aprovação do novo projecto. O argumento foi o de que aos 4545 m2 de construção pedidos equivale um COS de 0,91, o que é muito menos do que os 1,13 apontados pelo promotor. E mesmo corrigindo um erro óbvio que o PÚBLICO detectou nos cálculos, o gabinete do presidente da câmara, Manuel da Luz (PS), concluiu que o COS aprovado é "inferior" ao da área envolvente. Depois da correcção, salienta o autarca, o coeficiente desce para 0,95. Assim, a câmara considerou que está tudo certo.