O maior depósito de marfim do país foi descoberto em Reguengos de Monsaraz
O que terá ocupado os 16 hectares do Complexo Arqueológico dos Perdigões, em Reguengos de Monsaraz, Évora, há 5500 anos? Um povoado ou um meeting point, parecido com o Stonehenge inglês? A resposta não é consensual, mas uma coisa é certa: o espaço reuniu muita gente, com conhecimentos astronómicos e técnicos avançados, e poderá ter funcionado como ponto de passagem para o comércio do marfim entre a Península Ibérica e o Norte de África.
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O que terá ocupado os 16 hectares do Complexo Arqueológico dos Perdigões, em Reguengos de Monsaraz, Évora, há 5500 anos? Um povoado ou um meeting point, parecido com o Stonehenge inglês? A resposta não é consensual, mas uma coisa é certa: o espaço reuniu muita gente, com conhecimentos astronómicos e técnicos avançados, e poderá ter funcionado como ponto de passagem para o comércio do marfim entre a Península Ibérica e o Norte de África.
As escavações mais recentes indicam que os dois sepulcros já estudados nos Perdigões têm o maior depósito de marfim do país. Os arqueólogos, que investigam o local desde 1997, registaram 300 elementos referentes a diversos objectos, sobretudo figuras de animais.
"Encontrámos estatuetas com um realismo notável, que reproduzem animais em tamanho pequeno, quando noutras comunidades predominava a arte esquemática", frisa António Valera, arqueólogo da ERA Arqueologia, a empresa responsável pelas escavações, em parceria com a empresa de vinhos Esporão. "A variedade destes animais é inédita em território nacional", sublinha. O passo seguinte é apurar a proveniência do marfim. Se for de origem indiana, comprova "a rede de contactos em que se integrava a Península Ibérica" no Calcolítico (3000 anos a.C.), disse o responsável, numa conferência, anteontem, em Lisboa.
O estudo dos rituais funerários daquela época está na base das escavações, desenvolvidas inicialmente numa zona de necrópole. Há três anos, os arqueólogos dedicaram-se aos fossos que delimitam o complexo. Nos dois locais encontraram ossadas humanas e animais, e nos últimos dias acharam esqueletos incinerados. "A diversidade na gestão da morte é uma das questões centrais para entender o que foi este local pré-histórico, ao longo dos 1500 anos em que esteve ocupado", diz Valera.
As pesquisas, em que participam investigadores de várias universidades internacionais, fornecem dados também sobre a organização social dos habitantes dos Perdigões. Por exemplo, para a escavação de cada um dos fossos, foi necessário retirar 55 toneladas de rocha. "Tudo isso escavado à mão ou apoiados com pedra, hastes e animais. Isso exige uma grande organização social e logística", explica Valera. Além disso, o complexo circular e com 500 metros de diâmetro está construído "com uma orientação astrológica e cosmológica". As portas, localizadas a nordeste e a sudeste, coincidem com os solstícios de Verão e de Inverno.
A investigação em curso nos Perdigões pouco tem a ver com as escavações arqueológicas tradicionais. Este é um projecto de "arqueologia em construção", afirma Miguel Lago, administrador da Era Arqueologia. Qual a diferença? "Não queremos apresentar um trabalho final após a escavação, mas sim inserir a população no processo de interpretação à medida que vamos descobrindo novos elementos", explica.
A Era Arqueologia e a Esporão, empresa de vinhos que adquiriu a Herdade dos Perdigões em 1996, querem tirar partido do potencial cultural do complexo, promovendo visitas guiadas aos locais das escavações.
Para isso, João Roquette, presidente da Comissão Executiva da Esporão, está à procura de parceiros que financiem o projecto. A ideia é criar um "pacote" que inclua turismo, gastronomia e vinhos, tirando partido dos empreendimentos turísticos em construção na zona do Alqueva. O objectivo é avançar em breve, depois de uma análise dos investimentos e infra-estruturas necessárias, garantem os responsáveis.