"Não há desculpas para não intervir já nas áreas de regeneração natural do pinheiro"
Hectares de floresta de pinheiro jovem, que está abandonada e exposta a novos incêndios, podem ser valorizados, contribuindo para diminuir o défice natural de matéria-prima nas indústrias da fileira do pinho. O Centro Pinus convidou o secretário de Estado das Florestas, Rui Barreiro, no final da semana passada, para lhe fazer uma proposta que ajude a resolver o principal problema da fileira do pinho: o défice de matéria-prima.
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Hectares de floresta de pinheiro jovem, que está abandonada e exposta a novos incêndios, podem ser valorizados, contribuindo para diminuir o défice natural de matéria-prima nas indústrias da fileira do pinho. O Centro Pinus convidou o secretário de Estado das Florestas, Rui Barreiro, no final da semana passada, para lhe fazer uma proposta que ajude a resolver o principal problema da fileira do pinho: o défice de matéria-prima.
O que é que de novo quis o Centro Pinus mostrar ao secretário de Estado das Florestas?Não é uma questão de ter algo novo para mostrar. A visita centrou-se na falta de matéria-prima que existe em toda a fileira e que se tem vindo a agravar. O Centro Pinus estima que o défice anual de matéria-prima se situa nos 2,7 mil milhões de metros cúbicos. Actualmente a fileira do pinho, que emprega cerca de 55.000 trabalhadores e representa 3,6 por cento das exportações nacionais, tem necessidade de importar mais de um terço do seu consumo. Há um decréscimo acentuado na área e no volume disponível e, contrariamente, houve um acréscimo de consumo. Andamos sempre a falar de sustentabilidade, mas nesta fileira não a temos, criamos indústria sem ter suporte, o recurso base não acompanha.
Fez alguma proposta em concreto ao Governo?Fizemos uma proposta de intervenção imediata, na qual vemos muitas vantagens e nenhum inconveniente ou impedimento. Propomos que as áreas de regeneração natural do pinheiro sejam alvo de uma intervenção para a qual existem verbas (as do Proder ou do Fundo Florestal Permanente, caso não se possa aumentar a execução do Quadro Referência Estratégico Nacional neste objectivo). Acredito que não podemos perder tempo e que não há desculpa para não avançar com ela. Até porque a bondade do pinheiro tem limites.
A bondade do pinheiro? Ou a bondade dos financiamentos?Estou a falar da bondade da floresta de pinho. Quando um pinhal arde e existe semente com capacidade germinativa, ele regenera e dá lugar a um novo povoamento em potência, na sequência dos incêndios. De acordo com os dados do último Inventário Florestal Nacional, a área de povoamentos ardidos de pinheiro bravo é de 116.400 hectares. Se lhe somarmos os mais de 15,4 mil hectares de áreas alvo de corte, perfaz uma área total potencial de regeneração natural de quase 132 mil hectares. Estes jovens povoamentos de pinheiro-bravo só estão à espera de duas coisas: ou de alguém que os acarinhe e torne produtivos, ou então ficam à espera do próximo incêndio, do qual já não resultará uma nova floresta.
Qual a intervenção em concreto que sugere?Fazer uma intervenção seria criar linhas com espaçamento da técnica florestal. Passado algum tempo passará a haver a necessidade de fazer uma selecção das árvores. Penso que isto é uma oportunidade maravilhosa e que o país merece.
Não, porque estou a falar, obviamente, de uma intervenção onde seja possível mecanizar a 100 por cento e isso seria relativamente barato. Seria uma maneira de aumentar a execução dos apoios financeiros, do QREN, através do Proder. Do ponto de vista de utilização do Fundo Florestal, se ele é utilizado para a prevenção de fogos, esta acção pode ter dois nomes: prevenção de fogos, porque de facto vamos reduzir para menos de um terço a biomassa que está lá disponível para arder e também vamos conseguir marcar de facto a riqueza que lá existe. Só que vai passar a valer dinheiro.
Pretende convencer os privados a intervir?A proposta é que a intervenção arranque nos terrenos baldios, comunitários. Depois, as áreas dos privados poderiam também ser englobadas, desde que se desse o real valor e importância a esta acção. Já existem ferramentas de intervenção em área privada, como os cortes sanitários por doenças, ou paredes divisionais corta-fogos, que estão nos planos municipais.Aqui estamos a falar de criar valor efectivamente.
E quanto pode valer essa floresta?A Autoridade Florestal Nacional estabeleceu uma média de cinco metros cúbicos por hectare por ano de crescimento da madeira de pinho. Se estivermos a falar de um pinhal, com cinco anos, numa área de cem mil hectares, estamos a falar de 2 milhões e 500 mil metros cúbicos... Se dermos um valor a essa matéria-prima de 20 euros por metro cúbico estamos a falar, números redondos e acanhados, de 50 milhões de euros. Se formos importar esses 2,5 milhões de metros cúbicos, a diferença é enorme. E esse dinheiro sai da balança de exportações, e sai-nos do bolso.
Conseguiu compromissos por parte do Governo?As responsabilidades têm de ser assumidas. As responsabilidades se decidirem avançar - e esta é uma oportunidade de mostrar obra no terreno - e as responsabilidades de não avançar. Não fazer nada é contribuir para o prejuízo do património do país.
Quando é que deveria começar a intervenção e quem deve liderar o processo?Esta acção tem de começar já, para ter efeitos imediatos. Não sou pessimista, mas não seria realista se não dissesse que em alguns casos já vamos tarde. A Autoridade Nacional Florestal é quem tem competência para o fazer, atribuindo cadernos de encargos a terceiros, como associações florestais, e assumindo a coordenação geral do projecto.
Portugal foi reconhecido como um país grande produtor de madeira de pinho. Ainda merece esse epíteto?Diria que estamos a perdê-lo. O que se passa hoje é que a indústria da fileira do pinho está com graves problemas de abastecimento. A importação, em alguns deles, chega a ser de 50 por cento das necessidades. É muito grave, quando falamos em valores destes e a perda de competitividade é acentuada.
A necessidade de importar tem alguns anos. Estamos no pico de crise?Sim e ainda não estamos em pleno consumo. Já estamos a importar fortemente e ainda não estamos a produzir fortemente. Falo da fileira tradicional do pinho, obviamente, isto é, falo de serração, de aglomerados de fibra e partícula, da pasta de papel branqueada e do papel para embalagem.
Porque a pressão da procura tem sido acentuada, ultimamente, com o surgimento de novas indústrias consumidores de pinho, que surgiram numa situação em que já havia défice. Falo, por exemplo, da nova indústria de produção de pellets, que exporta, mas que basicamente tritura madeira, aglomera e exporta.
Nos 38 por cento de área florestal existentes no território, o pinheiro-bravo tinha o primeiro lugar. Mantém-no?Espero que sim, mas já não acredito muito.
Em termos de potencial florestal, toda a zona de pinhal interior, norte e centro, são zonas de forte aptidão de pinheiro. O que verificámos na ultima década é que houve um decréscimo em área assustador. Em dez anos a redução de área de pinho foi de 27 por cento.