Foram muitos os nervos do outro lado do Atlântico

Há o remate: quase golo. E neste quase-golo, aos 17", a Tânia começou a roer as unhas. Voltou a elas várias vezes. Prendeu o cabelo, mexeu no lenço atado ao pescoço com as cores da selecção portuguesa, levantou-se da cadeira e tirou a bandeira atada à cintura. Foi buscar mais uma cerveja para acalmar os nervos. Bebeu e não funcionou. Já não se sentou mais, solidária, com a meia centena de portugueses, que assistiam ao jogo Portugal-Brasil numa sala de uma pizzaria em São Paulo, em pé. Fervilhavam, de um lado para o outro, com pele de galinha.

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Há o remate: quase golo. E neste quase-golo, aos 17", a Tânia começou a roer as unhas. Voltou a elas várias vezes. Prendeu o cabelo, mexeu no lenço atado ao pescoço com as cores da selecção portuguesa, levantou-se da cadeira e tirou a bandeira atada à cintura. Foi buscar mais uma cerveja para acalmar os nervos. Bebeu e não funcionou. Já não se sentou mais, solidária, com a meia centena de portugueses, que assistiam ao jogo Portugal-Brasil numa sala de uma pizzaria em São Paulo, em pé. Fervilhavam, de um lado para o outro, com pele de galinha.

Ninguém se sentou nas cadeiras à volta da mesa. Espalharam-nas pelo centro da sala: "bagunçaram", para poder ver melhor o "onze" do "telão". Houve alguns "traidores": sentaram-se na janela, decorada com as cores da equipa canarinha, para fumar. Só os brasileiros, da sala ao lado, conseguiam conter a ansiedade do corpo. Barulhentos, mas sentados. Quando o José passou por eles, para descer as escadas e fumar um cigarro, como paliativo para o corpo suado, inquieto, relaxou. "E aí, portuga, você vai levar um cartão amarelo, se voltar a passar aqui". Sorriu, gracejou com eles e já não desceu as escadas. Ficou "batendo um papo" para "não levar um amarelo" e juntou-se à torcida da equipa de Dunga, do outro lado da sala. Quando a bola dos navegantes roçou ao lado da baliza da selecção brasileira, não se conteve. Gritou: "A culpa é da Jabulani. Aquela rotação está errada! Isto tem de acabar, temos de marcar". Culpa: tinha encontrado o bode expiatório para a tensão que estava na ponta da língua, pronta a disparar, depois da desilusão que não o beneficiava no marcador. Aí, os brasileiros da sala ficaram tensos. Não acharam "engraçado" ter um português na mesma sala que eles. Deram-lhe um cartão vermelho. "Melhor você voltar para lá, junto com seus amigos", ouviu-se. Voltou. Encontrou o Alfredo a mexer no telemóvel, irritado: "A ligarem-me a uma hora destas, com o jogo a decorrer?".

Mais calmo, o brasileiro Rodrigo, descendente de portugueses, torcia por Portugal em silêncio. Só se denunciava aqui, desassossegado: enrubescia sempre que o Brasil tomava a posse da bola. Susteve a respiração, inúmeras vezes. Tal como o Justin, luso-americano que cirandava pela sala, entre os "tugas". O oxigénio voltou no final: marcador "zerado" foi, no fundo, "um alívio". É que, no futebol, como na vida, os nervos não têm nação. Ganham sempre!