Dennis Hopper: Morreu o realizador de "Easy Rider" e actor de "Veludo Azul"
É um pouco da história de Hollywood que desaparece com a morte de Dennis Hopper. Ainda hoje recordado por "Easy Rider", um dos filmes-chave da “nova Hollywood” que abanou os alicerces do sistema dos grandes estúdios, Hopper foi contudo também o fotógrafo alucinado do "Apocalypse Now" de Coppola ou, sobretudo, o vilão psicótico de "Veludo Azul", depois de ter sido actor nos anos de 1950 na televisão e em filmes como "Fúria de Viver" e "Duelo de Fogo".
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É um pouco da história de Hollywood que desaparece com a morte de Dennis Hopper. Ainda hoje recordado por "Easy Rider", um dos filmes-chave da “nova Hollywood” que abanou os alicerces do sistema dos grandes estúdios, Hopper foi contudo também o fotógrafo alucinado do "Apocalypse Now" de Coppola ou, sobretudo, o vilão psicótico de "Veludo Azul", depois de ter sido actor nos anos de 1950 na televisão e em filmes como "Fúria de Viver" e "Duelo de Fogo".
Mas a verdade é que este ícone da contra-cultura psicadélica dos anos 1960 e 1970, vilão “de serviço” a êxitos como "Speed" ou "Waterworld", não tinha muito a ver com essa imagem de rebeldia. O verdadeiro Dennis Hopper estava muito mais próximo do artista nova-iorquino que interpretou em "Elegia" (2008) de Isabel Coixet, ou do seu general na série televisiva "E-Ring – Centro de Comando".
Pintor, escultor e poeta, simpatizante do Partido Republicano (para cujas campanhas eleitorais contribuiu repetidamente, embora nas últimas eleições tenha apoiado Barack Obama para Presidente), Dennis Hopper foi fotógrafo aclamado, documentando a Hollywood cujas conturbadas transformações acompanhou ao longo de quase 60 anos de carreira.
E foi também coleccionador de arte, proprietário de originais de Andy Warhol, Jasper Johns, Roy Lichtenstein ou Jean-Michel Basquiat (curiosamente, Hopper faria parte do elenco da biografia de Basquiat rodada em 1996 pelo artista Julian Schnabel).
“Lista negra” dos estúdios
Era, aliás, para uma carreira artística que Hopper, nascido em Dodge City em 1936, parecia fadado.
Mas, “mordido” no liceu pelo “bichinho” da representação, estudou no lendário Actor’s Studio, e estreou-se como actor em 1955; na televisão, alinhando em todas as grandes séries da época, e no cinema com um contrato com a Warner Bros., iniciado com um papel secundário no lendário "Fúria de Viver" (1955), de Nicholas Ray, onde se travou de amizade com James Dean. A sua guerra surda com o veterano Henry Hathaway nas rodagens de "O Homem que Não Queria Matar" (1958), contudo, pô-lo na “lista negra” dos estúdios, levando-o a regressar à fotografia como actividade principal.
O que salvou Hopper foi a contra-cultura psicadélica da Costa Oeste e o seu encontro com dois outros actores emergentes, Peter Fonda e Jack Nicholson. O resultado foi a sua estreia na realização, "Easy Rider" (1969) — road movie de um novo tipo, onde dois hippies motociclistas (Fonda e Hopper) atravessavam as paisagens míticas dos EUA e encontravam o oposto do “sonho americano”.
Influenciado por cineastas experimentais como Bruce Conners e filmado independentemente por 400 mil dólares, "Easy Rider" tornou-se num fenómeno estético e cultural gigantesco (e global, vencendo o prémio de Melhor Primeira Obra em Cannes). Juntamente com o êxito de "Bonnie and Clyde" (1967), de Arthur Penn, o filme abriu as portas à “nova Hollywood” - a geração de cineastas que, encabeçada por Martin Scorsese, Francis Ford Coppola, Peter Bogdanovich ou William Friedkin, tomaria de assalto a “Meca do Cinema” nos anos seguintes.
Mas o desastre crítico e comercial do seu segundo filme, "The Last Movie" (1971), cuja rodagem turbulenta no Peru foi acompanhada por um prodigioso consumo de álcool e drogas, tornou-se numa antevisão do que aconteceria a essa geração de cineastas, literalmente intoxicados pelo poder.
“Queimado” em Hollywood, Hopper passou os anos 1970 a alinhar papéis de subsistência em filmes de baixo orçamento, com participações em "O Amigo Americano" (1976), de Wim Wenders, ou "Apocalypse Now" (1979), de Coppola, a mostrarem que o seu talento andava a ser subaproveitado.
“Eu sou o Frank Booth”
A verdadeira reabilitação viria depois da sua desintoxicação, quando insistiu com David Lynch para que o deixasse interpretar o psicótico Frank Booth em "Veludo Azul" (1986) — porque, segundo reza a história, Hopper teria dito a Lynch que “eu sou o Frank Booth”, numa referência velada às suas vivências extremas dos anos 1960 e 1970.
A força da sua interpretação, combinada com a nomeação nesse mesmo ano para o Oscar de melhor actor secundário no filme "A Raiva de Vencer" de David Anspaugh, ressuscitou-o para Hollywood. Permitiu-lhe regressar à realização (com "Los Angeles a Ferro e Fogo", de 1988, "Testemunha Involuntária" e "Ardente Sedução", ambos de 1990, e "Guardas Prisionais", 1994) e filmar com gente tão díspar como Alex Cox, Tony Scott, John Dahl, Abel Ferrara, Allison MacLean, Ron Howard, George A. Romero ou Wim Wenders.
A sua última prestação como actor ocorreu na comédia de Linda Yellen "The Last Film Festival", ainda inédita.
Hospitalizado de urgência em Setembro de 2009, foi diagnosticado com cancro da próstata em estado avançado, e fez a sua última aparição em público a 26 de Março último, quando da colocação da sua estrela no Hollywood Walk of Fame, o célebre “Passeio das Estrelas”.
Dennis Lee Hooper morreu em sua casa em Los Angeles na manhã de 29 de Maio de 2010, aos 74 anos de idade. Casado por cinco vezes, deixa quatro filhos e dois netos.