"Finnegans Wake", de James Joyce, volta sem erros e com nove mil alterações
"Finnegans Wake" é um dos livros mais difíceis de sempre. O escritor irlandês James Joyce demorou 17 anos a completá-lo. Quando foi finalmente publicado, em 1939, as reacções foram negativas. O género literário e a própria língua usada eram difusos.
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"Finnegans Wake" é um dos livros mais difíceis de sempre. O escritor irlandês James Joyce demorou 17 anos a completá-lo. Quando foi finalmente publicado, em 1939, as reacções foram negativas. O género literário e a própria língua usada eram difusos.
O inglês original é entrecortado por invenções linguísticas de Joyce, que em vários momentos da obra inclui orações e parágrafos inteiros em 70 idiomas diferentes, para além do abandono das convenções de enredo e construção de personagens. "Finnegans Wake" já foi definido como uma frase de 700 páginas ou uma palavra de meio milhão de caracteres.
Mas uma nova edição é apresentada hoje em Londres, fruto dos 30 anos de trabalho de Danis Rose, linguista, e John O'Hanlon, físico. O próprio Joyce disse, na altura, que escreveu o livro "para manter os críticos ocupados por 300 anos". "A única exigência que faço aos meus leitores é que devem dedicar toda a sua vida à leitura dos meus trabalhos", disse.
Rose e O'Hanlon agruparam e analisaram 30 mil páginas de manuscritos, notas, esboços, documentos dactilografados e provas usados por Joyce. Rose disse ao jornal irlandês "The Irish Times" que o texto "foi sujeito a uma análise bibliográfica e crítica intensa". "Por causa da dificuldade da linguagem, a sintaxe não é clara à primeira vista e a coerência sintáctica do livro perdeu-se na impressão". "Esta coerência foi restaurada por completo na nova edição e resulta no que se pode chamar a primeira edição definitiva da obra-prima de Joyce", disse Rose.
Foram feitas nove mil pequenas mudanças e correcções à edição original, que já de si estava minada por erros e problemas de confusão entre várias cópias, revisões e versões que foram sido trabalhadas até à sua publicação. Esse processo de composição e edição durou 17 anos. Agora, trata-se de alterações aos sinais de pontuação, caracteres, espaçamento, erros ortográficos, frases trocadas, sintaxe errada. "Embora as alterações sejam pequenas individualmente, são cruciais para facilitar a leitura do livro", disse Anthony Farrel, director da Houyhnhnm (baptizada com o nome dos cavalos inteligentes de "As Viagens de Gulliver"), a editora inglesa que agora publica "Finnegans Wake". "Considero isto como um dos momentos mais importantes da minha carreira", disse Farrel ao "Irish Times".
Com esta edição, os autores pretendiam tornar o texto de Joyce mais leve e compreensível. A nova versão acabou por ter menos 120 páginas do que a original. David Norris, estudioso da obra de James Joyce, disse ao "Irish Times" que está contente com esta edição mas não sabe se ela vai ser mais acessível para os leitores do que a anterior. "O texto é tão denso. É escrito numa linguagem de sonho que é muito diferente da escrita comum em inglês. "Finnegans Wake" é como música. É o tipo de coisa que tem de se ouvir".
"Nunca pensei que este dia chegasse", disse Rose ao "Guardian". "A complexidade dos textos e a complexidade da situação social tornava isto muito difícil, mas conseguimos. Havia milhares de volumes daquilo que o Joyce estava a fazer. Para chegar ao texto, tínhamos de seguir Joyce e é muito mais difícil voltar atrás do que seguir em frente".
Para Rose, "o tempo de "Finnegans Wake" chegou. Agora "Ulisses" pode afastar-se, ele pertence ao século XX. "Finnegans Wake" é do século XXI. Acho que finalmente aprendemos a ser contemporâneos de Joyce".
Este "Finnegans Wake" revisitado existe em três versões. A edição limitada e de capa dura custa 900 euros, uma outra edição mais básica 300 euros e a Penguin vai lançar uma outra edição, versão de bolso, em data a anunciar.