Passagem dos fundos de pensões da banca para o Estado de novo discutida

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Debate realiza-se num momento crítico para o sector, um dos mais penalizados com Basileia II Paulo Ricca/PÚBLICO

O debate reabre-se num momento crítico para o sector financeiro nacional que será um dos mais penalizados com a entrada em vigor de Basileia II, que vai colocar às instituições novas exigências ao nível do capital e da liquidez.

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O debate reabre-se num momento crítico para o sector financeiro nacional que será um dos mais penalizados com a entrada em vigor de Basileia II, que vai colocar às instituições novas exigências ao nível do capital e da liquidez.

Ontem realizou-se a segunda reunião do grupo de trabalho da banca, constituído no quadro da Associação Portuguesa de Bancos (APB), para começar a abordar o tema das pensões dos bancários. A passagem das responsabilidades dos fundos de pensões do sector (mecanismo que assegura o sistema de reforma da banca) para o regime geral da segurança social pública é uma das soluções que os dirigentes das instituições com quem o PÚBLICO falou admitem como incontornável.

Em causa estão os activos que cobrem as responsabilidades que os grupos têm para com os seus pensionistas e para com muitos dos seus colaboradores. Os novos bancários já estão abrangidos pela Segurança Social, num acordo estabelecido em 2008.

O património sob gestão dos fundos de pensões da banca totaliza activos na ordem dos 12 mil milhões de euros, o equivalente a sete por cento do PIB português. Um valor, que a ser transferido para a Segurança Social, tem o potencial para influenciar positivamente as contas públicas no curto prazo, mas com impactos negativos a longo prazo (ver caixa).

São estas matérias que estão a ser de novo reavalidas pelo sector. As conclusões do grupo de trabalho da APB, constituído por directores dos principais bancos, deverão ser apresentadas numa próxima reunião da direcção. Neste órgão, liderada por António de Sousa, estão sentados os presidentes dos grandes grupos, nomeadamente, da CGD, BCP, BES, Santander, BPI e Banif.

A integração dos bancários no regime público tem sido uma medida reclamada pelos banqueiros portugueses há já algum tempo, pois alegam que a garantia da sustentabilidade das reformas dos seus trabalhadores afecta a "saúde" das instituições.

Basileia II pressiona banca

Este problema ganha força na actual conjuntura de urgência para o sector bancário nacional. Um dos factores a pressionar mais fortemente os bancos a resolver esta situação é a entrada em vigor (inicialmente prevista para este ano) das novas orientações do Comité de Basileia. Em destaque está a nova regulamentação que prevê que os défices dos fundos de pensões dos bancos passem a ser deduzidos aos capitais próprios. Até aqui, o Banco de Portugal admitia um corredor de 10 por cento para o diferencial entre o valor dos activos que constituem os fundos e os compromissos futuros assumidos pela banca. Com Basileia II etsa norma desaparecerá. É por isso que este tema é crítico para os bancos portugueses.

Além disso, ao contrário do que se passa no resto dos países, em Portugal os bancos são responsáveis por garantir a solvabilidade das reformas dos seus empregados. Em momento de queda das bolsas, as responsabilidades do banco para com os seus trabalhadores devem estar integralmente cobertas pelos activos do fundo de pensões.

A aplicação de Basileia II terá forte impacto no BCP, que tem sob sua gestão o maior fundo de pensões do sector, com activos de 5,6 mil milhões de euros, sendo que cerca de um terço são acções. O fundo tem posições relevantes nos mercados bolsistas. Só a título de exemplo: tem 10 por cento da Cimpor e, em Outubro de 2009, comprou à EDP 3,4 por cento Sonaecom [dona do PÚBLICO].

Bolsas afectam fundos

A descida das cotações registada desde o início da crise financeira internacional tem colocado problemas adicionais aos bancos, que vêem os seus fundos de pensões ficar mais longe das exigências. No final de 2008, já com o impacto negativo da instabilidade dos mercados, os bancos portugueses registavam défices substanciais nos seus fundos de pensões. O BCP enfrentava um desvio actuarial de 1,6 mil milhões de euros. No BES, a deferença era de 765 milhões e no BPI de 271 milhões. Para 2009, ainda não há contas publicadas, mas os bancos têm garantido que os fundos estão equilibrados, muito à custa de um novo esforço financeiro destas entidades.

Esta matéria terá sempre de ser discutida em sede do contrato colectivo de trabalho (ACTV) e, embora não necessite de autorização legislativa, precisa do acordo das partes envolvidas.

Hoje os bancos têm mais trabalhadores reformados e pensionistas do que colaboradores no activo, o que implica que os seus fundos de pensões tenham mais beneficiários do que contribuintes. O sistema conta com cerca de 45 mil colaboradores (só a CGD emprega em Portugal 10 mil pessoas), tendo o dobro de pensionistas. Esta situação leva as instituições a fazer entregas periódicas para assegurar o provisionamento dos fundos, facto que as obriga a repensar o actual esquema de pensões de reforma.