Banco público de células estaminais já tem 1400 oportunidades de salvar vidas
Matias, "Carmenzita", Afonso, Patrícia, Eduardo, são apenas alguns dos nomes que Helena Alves, directora do Centro de Histocompatibilidade do Norte (CHN), sabe de cor. São crianças com leucemia e que podem vir a precisar do Lusocord, o banco público de sangue do cordão umbilical, acolhido no CHN. Passado um ano do anúncio formal de José Sócrates que lançou a criação do esperado banco público, há já 1400 dádivas de sangue do cordão umbilical em Portugal para servir o mundo inteiro e que se destinam a transplantes e investigação. A meta de Helena Alves é conseguir a criopreservação de, pelo menos, três mil amostras até ao final do ano e integrar o banco na rede mundial no final do semestre. O sucesso depende apenas da vontade das grávidas do país.
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Matias, "Carmenzita", Afonso, Patrícia, Eduardo, são apenas alguns dos nomes que Helena Alves, directora do Centro de Histocompatibilidade do Norte (CHN), sabe de cor. São crianças com leucemia e que podem vir a precisar do Lusocord, o banco público de sangue do cordão umbilical, acolhido no CHN. Passado um ano do anúncio formal de José Sócrates que lançou a criação do esperado banco público, há já 1400 dádivas de sangue do cordão umbilical em Portugal para servir o mundo inteiro e que se destinam a transplantes e investigação. A meta de Helena Alves é conseguir a criopreservação de, pelo menos, três mil amostras até ao final do ano e integrar o banco na rede mundial no final do semestre. O sucesso depende apenas da vontade das grávidas do país.
No centro de tudo estão as preciosas células estaminais que podem ajudar a salvar uma vida ameaçada, por exemplo, com uma leucemia. Quando falham os tratamentos e a procura de um compatível dador adulto de medula óssea, a esperança de quem está doente bate à porta do sangue do cordão umbilical. Desde o ano passado que essa porta pública existe formalmente em Portugal atrás do nome Lusocord e com a morada do CHN, no Porto.
As dávidas guardadas no Lusocord ainda não podem ser usadas. Helena Alves explica que falta cumprir algumas formalidades que certificam a qualidade do processo e que o acesso às amostras poderá ser uma realidade no início do Verão. Para já, existe uma equipa que todos os dias recebe, prepara e guarda o conteúdo de dezenas de malas térmicas azuis que chegam de todo o país. "Os blogues e fóruns das grávidas têm ajudado muito a difundir a informação", agradece a directora do CHN.
A campanha - que tem o rosto de dois bebés chamados João e Joana e o lema "Ó mãe! O umbiguinho não é só para as cócegas!" - vai intensificar-se e será também criada uma linha de apoio para esclarecer dúvidas. Helena Alves adianta algumas respostas: entre 15 a 20 por cento das amostras serão usados para investigação (sobretudo na Medicina Regenerativa), as amostras passam por filtros de segurança (testes para afastar a hipótese de infecção e controlos para perceber se as células colhidas são viáveis e cumprem os critérios em termos de número e volume).
Todo o processo, desde a entrega à recolha do kit, é gratuito. E, para as grávidas interessadas, a responsável aconselha um contacto com a Lusocord no final da gestação, pelas 37 semanas. Por fim, Helena faz eco das palavras de quem já deu. "As mães encaram o nascimento como algo sagrado. A grandiosidade do momento duplica se sentirem que podem estar a dar vida também a alguém que está quase a morrer. O sangue do cordão que vai para o lixo pode ser a salvação de uma pessoa." Helena Alves não esconde as reservas sobre a iniciativa privada e o negócio nesta área. "Antes fosse verdade que era uma boa solução guardar as células só para si. Por exemplo, no caso de uma leucemia, a probabilidade de algum dia a própria amostra ser útil é inferior a um por cento", nota a especialista, que admite assistir a um "assédio e desinformação" das grávidas pela iniciativa privada.
Mas, sobre isso, não se quer alongar. Prefere falar da sua casa pública, onde vive o reconhecimento pela resposta das grávidas portuguesas e onde guarda muitas histórias. Algumas más. São aquelas que falam das crianças que não conseguiu salvar e viu morrer. Como o Simão. "Chamávamos-lhe "o puto-coragem"", lembra, comovida. Helena Alves sabe bem que há muitos "putos-coragem" a precisar do Lusocord. E muitas histórias boas. Como a de Lourenço, o primeiro dador do banco (numa fase ainda de ensaios) que já tem 20 meses.
Anabela Rodrigues descansava a barriga de mais de 30 semanas de gravidez no sofá em frente à televisão e conheceu a história de Tiago, uma criança com leucemia. Ouviu os apelos dos pais desesperados por um dador de medula óssea e não se limitou a emocionar-se com o caso. Fez mais. Foi à Internet, procurou o CHN e mandou um e-mail para Helena Alves. Disse que queria ajudar e que, em vez de guardar num centro privado, queria que ficassem com o sangue do cordão do Lourenço.
O CHN estava numa fase de ensaios. Ainda assim, Helena Alves aceitou a dádiva que foi guardada no IPO. Lourenço nasceu em Maio de 2008, na Maternidade de Júlio Dinis, no Porto. "Foi o pai do Lourenço que, no mesmo dia, trouxe a lancheira azul ao parque de estacionamento onde já o esperavam." Será difícil encontrar uma defensora da doação mais convincente do que Anabela. "Gostava que a recolha do sangue fosse parte do protocolo de um parto. É algo precioso de mais para acabar no lixo. Quem não quisesse doar é que assinava um papel. É um processo que não interfere no parto, na segurança da mãe e do filho. Só isto faz sentido", diz, atirando quase indignada: "Ninguém guarda o próprio sangue, pois não?"