Ex-presidente da AFIA acusado de falência culposa de empresa

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Empresa produz componentes para automóveis Nélson Garrido

Em parecer anexo ao processo de insolvência da empresa, com 5,4 milhões de euros de créditos reclamados, a administradora nomeada pelo tribunal, Maria do Céu Carrinho, pede a classificação do processo de insolvência como "culposa e fortuita" e enumera um conjunto de dados que fundamentam esse pedido, assentes em "má gestão e desvio de dinheiro".

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Em parecer anexo ao processo de insolvência da empresa, com 5,4 milhões de euros de créditos reclamados, a administradora nomeada pelo tribunal, Maria do Céu Carrinho, pede a classificação do processo de insolvência como "culposa e fortuita" e enumera um conjunto de dados que fundamentam esse pedido, assentes em "má gestão e desvio de dinheiro".

O parecer da administradora de insolvência, que aguarda contraditório da administração da empresa, é contestado por Pedro Valente de Almeida, que o classifica como "inquinado".

Do parecer da administradora de insolvência, que deve ser entregue ao Ministério Público, o qual pode pedir certidão para efeitos criminais, destaca-se o facto de o fornecimento da principal matéria-prima utilizada (aço) pela David Valente de Almeida (DVA) ser assegurado por uma empresa de Vigo, a CMC, que tem como sócia Maria Manuela Terrível Pinto Bastos, que é directora operacional e foi administradora (até Março do corrente ano) da DVA e é ex-mulher de Pedro Valente de Almeida. O outro sócio da empresa de Vigo é Pedro Miguel Alves Gomes, que é director de compras e de logística da metalúrgica em processo de insolvência.

O parecer refere que, do seu local de trabalho, o director de compras encomendava a matéria-prima ao fornecedor Torre Lamier SPA, com indicação para ser facturada em nome da CMC, de Vigo, que depois facturava a mesma mercadoria à DVA "a um preço acrescido". Ao fazer repercutir o preço do aço mais elevado nas encomendas, a metalúrgica foi perdendo clientes como, segundo o PÚBLICO apurou, a Mitsubishi, a espanhola Dytech, e a inglesa Covpress, o que gerou uma drástica redução da facturação. Em 2007 a empresa facturou 8,7 milhões de euros, em 2008 facturou 8,2 milhões e em 2009 deverá ficar pelos 2,8 milhões.

O parecer refere ainda uma elevada discrepância entre as receitas da venda de sucata (gerada no processo de fabrico) e as peças vendidas, negócio que estava na dependência directa do presidente da empresa e da ex-mulher (ver texto ao lado).

Contactado pelo PÚBLICO, o empresário nega as acusações de que é alvo, queixa-se de não ter sido ouvido no âmbito da elaboração do parecer, considera-o "inquinado desde o início", garante ter "documentação que prova o contrário" e que o parecer "está sustentado no testemunho, por vingança, de três ex-trabalhadores", despedidos recentemente. Pedro Valente de Almeida justifica que constituiu a CMC para ultrapassar a falta de crédito bancário em Portugal, por a DVA ter entrado em insolvência e alega que os preços mais elevados, referidos no relatório, "são inquinados, a maioria deles são suposições de volumes de facturação".

Ex-sogra envolvida

No âmbito do processo de insolvência, requerido por uma ex-funcionária, o presidente e accionista da empresa, Pedro Valente de Almeida, propõe a venda do estabelecimento comercial e industrial à empresa Stampconnection, SA, cujo primeiro administrador único foi Maria Manuela Terrível Pinto Bastos, ex-mulher de Pedro Valente de Almeida. Entretanto, esta administradora renunciou, tendo sido nomeado para o cargo a sua mãe, Maria Manuela Rocha Terrível.

Nesta primeira proposta, já apresentada aos credores, e que deveria ser votada na próxima segunda-feira, são garantidos 55 postos de trabalho, mais de uma dezena alegadamente associada à família do administrador, e por três meses. Quanto ao pagamento de créditos, os trabalhadores receberiam uma parte, ficando os restantes credores sem direito a qualquer percentagem de crédito, refere a proposta.

Pedro Valente de Almeida disse ao PÚBLICO que vai apresentar uma nova proposta, garantindo os postos de trabalho por um ano e parte dos créditos do Estado (fisco e Segurança Social). Há ainda uma proposta de uma empresa espanhola que, no entanto, ainda não reuniu os créditos necessários para poder ser votada (ver texto ao lado), estando dependente da decisão dos maiores credores, entre eles a Segurança Social.

Contactado pelo PÚBLICO, o vice-presidente do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, Nélson Ferreira, escusou-se a prestar esclarecimentos sobre o caso concreto, mas adiantou que, "em qualquer processo de insolvência, o interesse da Segurança Social é manter postos de trabalho, desde que sejam cumpridos os requisitos legais". E entre os requisitos legais refere "o cumprimento do pagamento dos créditos à Segurança Social, incluindo prestação de garantias", e, em caso de venda, "a avaliação da idoneidade do comprador".