Futebolistas que recusaram regressar à Eritreia pediram asilo no Quénia

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A Eritreia é o segundo país do mundo que mais refugiados gera Darrin Zammit Lupi/Reuters

Quando não se apresentaram no avião que os devia levar de regresso a Asmara, foi desencadeada uma caça ao homem, mas os 12 atletas, ainda com os fatos de treino oficiais, conseguiram chegar na tarde de quarta-feira à delegação do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), que os encaminhou para os serviços de Imigração.

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Quando não se apresentaram no avião que os devia levar de regresso a Asmara, foi desencadeada uma caça ao homem, mas os 12 atletas, ainda com os fatos de treino oficiais, conseguiram chegar na tarde de quarta-feira à delegação do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), que os encaminhou para os serviços de Imigração.

“O processo [de pedido de asilo] já foi iniciado e os 12 estão em segurança”, disse uma fonte da polícia queniana. O responsável, que pediu para não ser identificado, adiantou que o grupo “tem um caso forte” e que é provável que o pedido de asilo venha a ser aprovado.

Outra fonte adiantou à agência AP que os atletas temem ser presos ou mesmo mortos caso sejam repatriados. Contaram que, antes de abandonarem o país, fizeram um juramento que não iriam desertar e que a quebra desse juramento pode ter graves consequências.

Ameaças que são desmentidas pelo ministro da Informação eritreu que, numa entrevista terça-feira à BBC, garantiu que os jogadores seriam “bem recebidos” se regressassem a casa, apesar da “traição” feita ao país. “Este é o país deles. Eles têm direito a viver e a trabalhar aqui”, disse Ali Abdu.

Milhares de refugiados

Esta não é a primeira vez que atletas da Eritreia aproveitam estadias no estrangeiro para fugir ao regime repressivo de Asmara que. Em 2006, quatro membros do clube de futebol Red Sea desapareceram em Nairobi, onde estavam para um jogo de qualificação para da Liga dos Campeões de África. No ano passado, seis membros da equipa nacional de atletismo conseguiram asilo depois de terem abandonado a delegação oficial, durante o campeonato do mundo de corta-mato.

Para impedir estas fugas, o regime de Isaias Afwerki criou, em 2007, uma norma que obriga todos os atletas a pagar uma caução de 100 mil nafka (4600 euros) antes de se ausentarem do país e só o podem fazer com acompanhantes oficiais.

Os atletas são, contudo, a parte mais visível de um enorme fluxo de refugiados que todos os anos arrisca a vida para fugir do país, muitas vezes a pé através da fronteira com o Sudão e a Etiópia.

Dezasseis anos após ter conduzido o país à independência, Afwerki lidera hoje um dos regimes mais repressivos do mundo: a oposição e a imprensa livre foram esmagadas, a minoria cristã é perseguida e a economia de base estatal deixou a grande maioria dos seus cinco milhões de habitantes dependente das ajudas externas.

Entre os milhares que procuram asilo, a grande maioria são jovens que procuram fugir ao serviço militar obrigatório que o Presidente Afwerki decidiu tornar estender por tempo indefinido, alegando que o conflito fronteiriço com a Etiópia obriga o país a manter-se em estado de alerta permanente. Um relatório divulgado em Abril pela Human Rights Watch conclui que a maioria da população adulta do país está actualmente recrutada.

Para impedir as fugas, o Governo limitou a concessão de vistos para os cidadãos com menos de 50 anos (num país onde a esperança média de vida dos homens é de 57 anos) e deu ordens aos soldados para "atirarem a matar" contra quem tente a fuga pela fronteira com o Sudão.

Mas muitos continuam a fugir – segundo o Guardian a Eritreia é o segundo país do mundo que mais refugiados gera – e, em retaliação, os seus familiares podem ser obrigados a pagar multas avultadas ou a ser presos. E aqueles que, depois da fuga, acabam por ser repatriados pelas nações vizinhas são detidos e torturados – uma situação tão grave que já levou o ACNUR a pedir aos países para não deportarem refugiados eritreus.