FC Porto precisa de lançar Valeri ou de ir ao mercado

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Valeri (à esq.), de 23 anos, tem sido pouco utilizado por Jesualdo nFactos/Fernando Veludo (arquivo)

Pode questionar-se o ponto de partida da visão de Jesualdo - e isso é principalmente verdade para os que preferem ver uma equipa moldada mais pela organização do que pela transição. O que não se pode é desvalorizar a lógica da explicação do técnico, que há muito defende as virtudes do modelo de jogo em que sustenta a estratégia primordial das suas equipas.

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Pode questionar-se o ponto de partida da visão de Jesualdo - e isso é principalmente verdade para os que preferem ver uma equipa moldada mais pela organização do que pela transição. O que não se pode é desvalorizar a lógica da explicação do técnico, que há muito defende as virtudes do modelo de jogo em que sustenta a estratégia primordial das suas equipas.

De uma penada, Jesualdo fez o diagnóstico do padecimento que nos últimos tempos mais condicionou o rendimento da sua equipa e que, por arrastamento, esteve também relacionado com os seus problemas de eficácia concretizadora - embora aqui se possa acrescentar o sub-rendimento de certas unidades, como Falcao. É que, muitas das vezes, até a falta de eficácia no posicionamento defensivo acaba por reflectir-se no desen-volvimento das jogadas ofensivas.

Talvez isso ajude a perceber, por exemplo, a razão por que Jesualdo deixou Rolando no "banco" e preferiu estrear Maicon frente ao Rio Ave. Rolando cometeu um autogolo perante o Marítimo e errou em termos posicionais no golo do Chelsea. Mas na sua saída da equipa terá pesado algo mais para além da infelicidade e dos erros individuais. Rolando é um bom jogador, mas não é um sobredotado. E a sua qualidade de jogo baixou alguns furos em resultado da sua chamada à selecção (onde não jogou, ficando assim demasiado tempo afastado da competição e dos treinos portistas). Num efeito de contágio e também de dependência, acabou igualmente afectado pelo facto de Bruno Alves não andar a funcionar ultimamente como a muleta perfeita, eventualmente por o capitão portista ter acusado o falhanço da sua tão propalada transferência para o estrangeiro. Rolando deve regressar hoje como titular, depois de um período que terá sido aproveitado para corrigir os erros, situação que poderá ser alargada a outros companheiros de equipa.

Mas os problemas que os portistas viveram nos tempos mais recentes passaram também pela deficiente produção do seu meio-campo. Num jogo, os 22 jogadores distribuem-se normalmente por cerca de sete mil metros quadrados, mas é naquela zona central que é necessária uma ocupação mais inteligente dos espaços. Isso tem a ver com a habitual densidade defensiva do adversário e com a necessidade de encontrar o balanço ofensivo adequado, algo sempre importante, mas absolutamente primordial quando a estratégia assenta em transições ofensivas rápidas.

Era provavelmente a isso que se referia Jesualdo quando disse ainda que "a pior coisa que pode acontecer a uma equipa quando está a defender é ganhar a bola e falhar o primeiro passe". Ora, é exactamente o que tem acontecido, com uma frequência incomum, ao FC Porto. Tanta falta de afinação, já se sabe, reflecte as várias lesões que afectaram a equipa, a participação e o desgaste inerentes às chamadas às selecções, mas também o sentido de orfandade que passou a afligir a equipa desde que Lucho preferiu partir para Marselha.

Sem o argentino, o FC Porto manteve o sistema (disposição dos jogadores, ou seja o desenho), mas o seu modelo (conjunto de princípios de comportamentos que definem a organização e dão identidade à equipa) ficou algo abalado. E isso é evidente por muito que se valorize o rendimento e a qualidade de Belluschi, que tem acções verdadeiramente desequilibrantes no ataque, mas que não entende os princípios básicos da estratégia ofensiva e, pior ainda, com os seus posicionamentos erráticos contribui para a desestabilização defensiva da equipa.

Como as restantes alternativas já testadas também não garantiram a necessária complementaridade ao triângulo formado ainda por Fernando e Raul Meireles, ao FC Porto só parece restar uma de três soluções: mudar o sistema táctico, exponenciar a muita qualidade que eu acredito ter Valeri ou ir ao mercado em Janeiro.

A primeira hipótese só faz sentido na cabeça de quem não conhece Jesualdo. Pragmático e estudioso como é, há muito que ele concluiu que as virtudes do 4x3x3 e das transições rápidas não só são mais adequadas ao plantel disponível, mas também as opções que, na sua opinião, garantem melhores resultados. Podem até argumentar-lhe que Belluschi já funcionou bem num esquema em que, ao serviço do River Plate, jogava nas costas precisamente de Farías e Falcao. Porque Jesualdo e quem segue o futebol internacional sabem bem que nem sempre o que é aplicável na Argentina (ou noutros países sul-americanos) pode ser transposto para os clubes de elite europeus, como se percebeu com as dificuldades que Belluschi teve para se impor nos gregos do Olympiakos. Por isso, mais do que pensar numa mudança táctica, Jesualdo acredita poder melhorar as coisas à custa da qualidade do seu trabalho. Foi isso que conseguiu nos outros anos à frente do FC Porto, e os últimos indícios até lhe dão razão: após um razoável período em que voltou a poder trabalhar com grande parte dos seus jogadores, já se notaram melhorias frente ao Chelsea e ao Rio Ave.

Valeri pode ser a solução - afirmei-o quando foi contratado ao Lanús e mantenho a opinião até que me provem o contrário. A sua adaptação ao futebol europeu terá sido prejudicada pelas lesões, mas continuo crente que não há no plantel jogador tão inteligente e tão dotado tecnicamente como este jovem de 23 anos para assumir o papel que já foi de Lucho. Veremos se o futuro me dará razão.

Caso esteja redondamente enganado, ou, por outro lado, se a urgência de somar bons resultados não for compatível com a necessidade de dar tempo a Valeri, outra opção não restará ao FC Porto do que ir às compras na reabertura do período de transferências. O problema é que o mercado de Janeiro raramente propicia negócios bons e verdadeiramente rentáveis. bprata@publico.pt