Eliminação sistemática de indígenas na Guatemala comprovada em documentação do exército

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A "Operação Sofia" decorreu na região de Quiché, no noroeste do país Doriam Morales/Reuters

Naqueles ficheiros – coligidos pela directora documentalista do Arquivo de Segurança Nacional dos Estados Unidos Kate Doyle – é descrito, com enorme pormenor, a forma de actuação dos militares na chamada “operacíon Sofia”, que decorreu entre 15 de Julho e 19 de Agosto de 1982 na região de Quiché, e em particular no município de Nebaj, no noroeste do país, contra os indígenas locais.

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Naqueles ficheiros – coligidos pela directora documentalista do Arquivo de Segurança Nacional dos Estados Unidos Kate Doyle – é descrito, com enorme pormenor, a forma de actuação dos militares na chamada “operacíon Sofia”, que decorreu entre 15 de Julho e 19 de Agosto de 1982 na região de Quiché, e em particular no município de Nebaj, no noroeste do país, contra os indígenas locais.

As missões eram executadas pelo corpo de pára-quedistas a mando do Estado-maior do exército guatemalteco, cujo comandante geral era o Presidente – o qual cumulava ainda a pasta da Defesa – e com conhecimento das mais altas esferas de poder no país: “Senhor chefe do Estado-maior, comandante da Força Aérea, Comandante da Brigada Militar GMLB” e um total de outros 15 postos elevados militares surgem mencionados em documentos classificados como “ultra secretos” dando luz verde aos massacres dos civis designados como “inimigos”.

“Estava uma mulher escondida numa ravina, e o homem da frente [em referência ao pára-quedista que seguia à cabeça do pelotão], ao dar-se conta daquela presença estranha, fez fogo eliminando-a a ela e a dois chocolates [referindo-se a duas crianças]” – pode ler-se num dos documentos, do total de 359 páginas recolhidas, citado pelo “El Mundo”.

Noutro: “Foi eliminado um indivíduo sem documentação de aproximadamente 17 anos de idade, que fugia da patrulha junto com outros homens que se escaparam”. Noutro ainda: “foi eliminada uma pessoa sem documentos que saiu detrás de umas pedras com os braços no ar depois de termos lançado uma granada na sua direcção”.

A existência destes ficheiros, recebidos em Março passado de uma fonte anónima pela investigadora norte-americana, com mais de década e meia de experiência na descodificação de documentação da América Latina, foi negada a princípio pelo Estado-maior guatemalteco às instâncias judiciais do país.

Mais tarde os militares admitiram à Audiencia Nacional – um dos tribunais de topo na Guatemala, só secundarizado pelo Tribunal constitucional, onde decorre a investigação a estes massacres – que os relatórios existem mas alegaram não conhecer o seu paradeiro.