O pinga-amor erudito

Vincent Delerm ocupa, com Benjamin Biolay, o lugar de transportador da tocha da "nouvelle chanson française". Mas enquanto Biolay é todo sombras, lixo e luxo, Delerm é o burguês, limpo e erudito. Parece um pinga-amor trapalhão e demasiado lido, o tipo de homem a quem uma mãe confiaria a filha, enquanto Biolay é o tipo de homem que não só papava a filha como também a mãe. E para acentuar as diferenças, Biolay é o herdeiro legítimo do toque de Midas de Gainsbourg e um conhecedor profundo da canção francesa, enquanto Delerm é mais americano: nas fotos do libreto do seu novo disco, "Quinze Chansons", ele aparece a ler um livro chamado "J''aime Le Music-Hall" e a ler a biografia de Johnny Carson. Esse é o segredo de Delerm: o cruzamento dos ritmos e harmonias do music-hall com a simplicidade das melodias da "chanson", a aplicação de arranjos derivados da Broadway em melodias eivadas da falsa ingenuidade que Sylvie Vartan imortalizou.

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Vincent Delerm ocupa, com Benjamin Biolay, o lugar de transportador da tocha da "nouvelle chanson française". Mas enquanto Biolay é todo sombras, lixo e luxo, Delerm é o burguês, limpo e erudito. Parece um pinga-amor trapalhão e demasiado lido, o tipo de homem a quem uma mãe confiaria a filha, enquanto Biolay é o tipo de homem que não só papava a filha como também a mãe. E para acentuar as diferenças, Biolay é o herdeiro legítimo do toque de Midas de Gainsbourg e um conhecedor profundo da canção francesa, enquanto Delerm é mais americano: nas fotos do libreto do seu novo disco, "Quinze Chansons", ele aparece a ler um livro chamado "J''aime Le Music-Hall" e a ler a biografia de Johnny Carson. Esse é o segredo de Delerm: o cruzamento dos ritmos e harmonias do music-hall com a simplicidade das melodias da "chanson", a aplicação de arranjos derivados da Broadway em melodias eivadas da falsa ingenuidade que Sylvie Vartan imortalizou.

"Quinze Chansons" abre com as magníficas cordas de "Tous les acteurs s''appelllent Terence", olhar cínico sobre a imagem pública das estrelas de cinema. As cordas abrem espaço para o piano (imagem de marca), há flautas, coros e metais numa extraordinária canção que deve muito às bandas-sonoras dos anos 40. O jazz de Nova Orleães é a inspiração da perfeita "Je pense à toi", cujo refrão com cravo debruado a fio de ouro de cordas nos deixa com rebuçado a escorrer pelas orelhas. "Le coeur des volleyeuses" é todo música de saloon e o western invade "From a romm". Sempre pluri-referencial (o rapaz adora referências) escreve ainda uma grande canção, toda engalanada de metais estrepitosos, sobre o jogador de futebol Patrick Vieira. Amores falhados, vaudeville e pianada, órgãos prenhes de nostalgia (Delerm adora a nostalgia) a adornar melodias-chaise-long-com-martini, erudição e mundanidade (que inclui referências aos Tindersticks, aos Peugeuots e a Godart e a Wayne Rooney) e coros femininos, doces como uma carícia de uma amante sabida. Um grande disco de pop enciclopédica.