Morreu o radialista António Sérgio
O velório realiza-se hoje, a partir das 18h00, na Basílica da Estrela, em Lisboa e o funeral segue amanhã para o Cemitério dos Prazeres, depois da missa de corpo presente, marcada para as 15h00.
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O velório realiza-se hoje, a partir das 18h00, na Basílica da Estrela, em Lisboa e o funeral segue amanhã para o Cemitério dos Prazeres, depois da missa de corpo presente, marcada para as 15h00.
"O António Sérgio era um grande profissional, uma referência da rádio, um mestre - como nós lhe chamávamos lá na rádio -, uma pessoa que deu um contributo muito grande para a divulgação da nova música, nomeadamente da música portuguesa - produziu o primeiro álbum dos Xutos & Pontapés, por exemplo -, tinha grande visão do futuro, era o homem do 'som da frente'", declarou Luís Montez.
"Ainda ontem à tarde esteve lá a gravar o programa da próxima semana", confirmou Luís Montez, adiantando que ele irá para o ar tal como previsto.
Zé Pedro, guitarrista dos Xutos&Pontapés, recordou igualmente ao PÚBLICO a influência que António Pedro exerceu na banda: “No início dos Xutos, o António Sérgio era a única personagem do meio que levávamos a ouvir as nossas cassetes, para sabermos a sua opinião. Foi ele o professor do nosso primeiro disco e dos nossos primeiros singles. Quando arranjou a editora [Rossil] produziu-nos logo e, desde cedo, estabelecemos com ele uma cumplicidade e amizade bastante fortes”.
“A morte do António Sérgio é uma perda enorme para a rádio e para a divulgação da música em Portugal. Ele foi pioneiro no trabalho que se propôs fazer como locutor e como divulgador de música”, lamentou o músico.
“Lembro-me que, desde 1977, comecei a seguir a carreira de divulgação musical do Sérgio através dos seus programas. Muitos dos nomes que hoje em dia são conhecidos no meio musical português vieram através do António Sérgio. Para mim o programa Rotação era sagrado e chegava a gravar algumas coisas em cassete”, recordou Zé Pedro.
“Ele sempre foi uma personagem e uma voz muito forte dessa divulgação de música e certamente terá deixado escola junto de muitos dos que hoje em dia são profissionais de rádio”, acrescentou o guitarrista.
Igualmente contactado pelo PÚBLICO, António Macedo recorda o seu velho companheiro de rádio sobretudo como um profissional dedicado, que "andava sempre a coscuvilhar, a escarafunchar o que ia saindo... Era um autêntico coca-bichinhos, e foi assim até ontem”. “Andava sempre à procura do novo, do diferente, do que podia interessar... às vezes acertava ao lado, mas as mais das vezes acertava em cheio”.
“António Sérgio manteve-se sempre à tona, sempre coerente, sempre convicto. Foi um idealista da música, um idealista da rádio. É completamente insubstituível”, recorda António Macedo.
João David Nunes, um dos fundadores da Rádio Comercial e o homem responsável pela sua ida para essa casa, em 1980, indicou ao PÚBLICO que António Sérgio sempre teve uma “capacidade enorme de estar à frente do seu tempo e estabelecer percursos alternativos onde outros não viam nada”.
“E depois a sua voz, que era inconfundível. Era discreto, mas tinha uma grande força. Vai continuar a ser uma marca indelével da história da rádio em Portugal”, recorda João David Nunes.
Para Adolfo Luxúria Canibal, ouvido pela Lusa, António Sérgio “sempre foi uma referência" durante a sua adolescência. “As memórias são muitas. Fazia parte do meu crescimento musical. Pessoalmente deixa-me muito boas memórias”, acrescentou Adolfo Luxúria Canibal, nome artístico de Adolfo Morais de Macedo, fundador, letrista e vocalista do grupo Mão Morta, desde 1984.
Embora nunca tenha trabalhado com António Sérgio, Adolfo Luxúria Canibal destacou o facto dos Mão Morta sempre terem dado a conhecer em primeira-mão os seus trabalhos ao radialista. “Sempre lhe dei primazia nos trabalhos que íamos fazendo. Era uma espécie de agradecimento pelo trabalho que ele fez e pelo crescimento musical de gerações nas quais eu me incluo”, acentuou.
Lamento pelo fim da "Hora do Lobo"Em 2007, depois de dez anos no universo da Rádio Comercial onde dava voz à “Hora do Lobo”, o histórico programa de António Sérgio foi cancelado, por deixar de fazer sentido na nova grelha de programas.
O cancelamento do programa originou uma onda de reacções e protestos.
"As pessoas que foram responsáveis [pela Comercial] consideraram que a manutenção daquele programa de autor era prestigiante para a rádio, mas agora já não acham", lamentou António Sérgio nessa altura.
Miguel Esteves Cardoso dedicou por esses dias duas páginas do PÚBLICO ao seu lamento pelo fim do programa. "António Sérgio só durou até 2007 porque se recusou a ir embora. Desde os anos 70 que agentes sorrateiros se agacham atrás dele, tentando puxar-lhe a cadeira, a ver se cai. Mas o homem sempre esteve ocupado de mais para reparar. Fincou os pés, sacou dos discos e fez o que sempre fez: o que lhe estava na real gana" escreveu então o cronista.
João David Nunes recorda igualmente com pesar a saída de António Sérgio da Comercial: “Foi mau para o António Sérgio, foi mau para a Rádio Comercial e acho que foi desprestigiante para uma casa que ajudou, sem dúvida, o António a manter uma carreira, mas que também devia ter reconhecido o quanto o António lhe tinha dado. Ele não devia ter sido tratado daquela forma”.
Em Dezembro de 2007, António Sérgio mudou-se para a Radar FM, onde apresentava o programa "Viriato 25" (o nome da rua da sede da rádio e o número da porta).
António Sérgio começou a fazer rádio na Renascença, em 1968, tendo completado, até morrer, mais de 40 anos de vida frente aos microfones.
Os programas que marcaram a carreira de António SérgioRotação(entre 1977-1980): Foi o seu primeiro programa de autor, ainda na Rádio Renascença. Foi através deste programa que ajudou a lançar nomes cimeiros da música portuguesa, incluindo os Xutos&Pontapés.
Rolls Rock: o primeiro programa que fez na Rádio Comercial, que na altura ainda dava pelo nome de RDP – Canal 4. O conceito por detrás do programa - nas palavras de João David Nunes - era ser “uma coisa especial, edições muito específicas e muito boas”.
Som da Frente(1982 -1993): Como o próprio nome indica, tinha como missão estar na linha da frente das novidades; trazer até aos ouvintes portugueses o que de novo se fazia em Portugal e no Mundo e estar na vanguarda das novas sonoridades.
Lança-Chamas: programa dedicado à chamada
música pesadae ao
heavy metal.
Loiras, Ruivas ou Morenas: programa realizado pela mulher de António Sérgio, Ana Cristina Ferrão, em que António Sérgio passava apenas música interpretada por mulheres. De Ellis Regina a Janis Joplin.
Grande Delta: Entre 1993 e 1997, durante o interregno que o levou à XFM.
Hora do Lobo(1997-2007): O programa esteve no ar dez anos, entre a Comercial e a Best Rock FM, e dedicava-se a dar a conhecer as franjas menos conhecidas do pop-rock. Foi cancelado porque tinha deixado (segundo a direcção assumida pelo grupo Prisa) de se enquadrar na grelha. O fim do programa originou reacções e protestos. “Serviu como uma espécie de resumo de carreira. Porque o António Sérgio sempre foi um lobo solitário, mas de olhar penetrante”, define João David Nunes.
Viriato 25: O seu mais recente programa, na Radar FM, em cujos estúdios ainda ontem tinha estado a gravar.
Notícia actualizada às 17h50