Tolkien treinou para ser espião mas recusou a mítica equipa de Bletchley Park

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A história do centro de decifração britânico que funcionou em Bletchley Park durante a Segunda Guerra Mundial tornou-se célebre através do best-seller de Richard Harris Enigma, depois adaptado ao cinema por Michael Apted. O que até agora não se sabia é que J.R.R. Tolkien, o autor de O Senhor dos Anéis, poderia ter sido um dos seus protagonistas, caso tivesse aceitado o convite do Governo para se tornar um espião.

Documentos recém-descobertos mostram que, em Março de 1939, nas vésperas da segunda guerra mundial, Tolkien se treinou durante três dias no quartel-general do então GCCS, um departamento governamental criado após a guerra de 1914- 18 para concentrar os serviços britânicos de decifração de códigos e cifras. Os ofi ciais responsáveis pela escolha dos candidatos mais dotados elogiaram-lhe o talento, mas quando propuseram a Tolkien um lugar como espião, recebendo 500 libras por ano - um ordenado considerável para a época -, o escritor recusou. Ninguém sabe porquê, ainda que a explicação mais lógica pareça ser a de que preferiu prosseguir a carreira literária que já iniciara com a publicação de O Hobbit, em 1937.

Se fosse Mordor...

Um especialista na história do GCCS, comentando a recusa de Tolkien ao diário inglês Telegraph, propôs, no entanto, uma explicação mais divertida: "Talvez tenha sido por termos declarado guerra à Alemanha, e não a Mordor"(nome dos domínios do arquivilão Sauron em O Senhor dos Anéis).

Durante a Primeira Guerra - na qual Tolkien participou, tendo sobrevivido à sangrenta batalha de Somme, que fez meio milhão de mortos -, os reitores das Universidades de Cambridge e Oxford colaboraram estreitamente com os serviços secretos britânicos, que voltaram a recorrer aos seus serviços no fi nal dos anos 30, quando começava a tornar-se claro que Hitler se preparava para a guerra. Consciente de que era vital criar um centro de decifração efi caz, o GCCS pediu a estes responsáveis das duas principais universidades inglesas que indicassem os professores e estudantes mais dotados.

Alastair Denniston, o carismático director do departamento, cuja aversão à burocracia e a tarefas administrativas era célebre, recebeu uma lista de 50 nomes, entre os quais se incluía o de Tolkien, então professor de Anglo- Saxão em Oxford, que foi um dos 13 escolhidos que aceitaram submeter-se a treinos e testes para eventualmente vir a integrar o GCCS. Que o reitor de Oxford se tenha lembrado de Tolkien, não admira. Além do inglês, Tolkien conhecia a fundo mais de uma dúzia de línguas vivas e mortas, incluindo o grego antigo, o latim, o galês, o gótico, o islandês antigo ou o finlandês, para só referir algumas das menos óbvias. E, claro, já andava a criar algumas da sua própria lavra, como o quenya campeões de xadrez ou especialistas de palavras cruzadas. Está documentado que um dos testes de aptidão colocados aos candidatos a Bletchley Park, onde funcionou, durante a Segunda Guerra, o principal centro do GCCS, consistia em se ser capaz de resolver as palavras cruzadas do Telegraph em menos de doze minutos.

Apesar de se ter candidatado aos treinos e de o seu talento ter sido imediatamente reconhecido, Tolkien recusou o convite. Se tivesse aceitado, teria feito parte da épica batalha intelectual travada pelos homens e mulheres de Bletchley Park - no fi nal da guerra, trabalhavam lá nove mil pessoas -, que conseguiram desvendar os códigos criados pelas máquinas de cifra Enigma e Lorenz, usadas pelos nazis nas suas transmissões, o que permitiu, por exemplo, salvar comboios de navios aliados dos ataques dos submarinos alemães.

Mas a verdade é que Tolkien, que criara uma aversão à tecnologia durante a Primeira Guerra, testemunhando nas trincheiras o fim que lhe podia ser dado - não é por acaso que a missão do protagonista de O Senhor dos Anéis, Frodo, não é a de lutar directamente com o mal, mas sim a de destruir a tecnologia que lhe confere poder -, talvez não tivesse apreciado muito trabalhar com o gigantesco e ruidoso computador Colossus, criado sob a supervisão do matemático Alan Turing para decifrar os códigos nazis: uma máquina que perfurava símbolos em tiras de papel a uma velocidade de 25 mil caracteres por segundo.

Esses três dias em que Tolkien treinou para espião talvez não tenham sido, no entanto, tempo perdido. Basta pensarmos em algumas personagens de O Senhor dos Anéis, como o repulsivo espião free-lancer Gollum ou o traidor Grima, que espiava o seu rei ao serviço do mago Saruman. Já para não falar desse momento crucial da narrativa, quando, à entrada das minas de Mória, é preciso decifrar não apenas as runas gravadas na porta, mas também a charada que elas escondiam.

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A história do centro de decifração britânico que funcionou em Bletchley Park durante a Segunda Guerra Mundial tornou-se célebre através do best-seller de Richard Harris Enigma, depois adaptado ao cinema por Michael Apted. O que até agora não se sabia é que J.R.R. Tolkien, o autor de O Senhor dos Anéis, poderia ter sido um dos seus protagonistas, caso tivesse aceitado o convite do Governo para se tornar um espião.

Documentos recém-descobertos mostram que, em Março de 1939, nas vésperas da segunda guerra mundial, Tolkien se treinou durante três dias no quartel-general do então GCCS, um departamento governamental criado após a guerra de 1914- 18 para concentrar os serviços britânicos de decifração de códigos e cifras. Os ofi ciais responsáveis pela escolha dos candidatos mais dotados elogiaram-lhe o talento, mas quando propuseram a Tolkien um lugar como espião, recebendo 500 libras por ano - um ordenado considerável para a época -, o escritor recusou. Ninguém sabe porquê, ainda que a explicação mais lógica pareça ser a de que preferiu prosseguir a carreira literária que já iniciara com a publicação de O Hobbit, em 1937.

Se fosse Mordor...

Um especialista na história do GCCS, comentando a recusa de Tolkien ao diário inglês Telegraph, propôs, no entanto, uma explicação mais divertida: "Talvez tenha sido por termos declarado guerra à Alemanha, e não a Mordor"(nome dos domínios do arquivilão Sauron em O Senhor dos Anéis).

Durante a Primeira Guerra - na qual Tolkien participou, tendo sobrevivido à sangrenta batalha de Somme, que fez meio milhão de mortos -, os reitores das Universidades de Cambridge e Oxford colaboraram estreitamente com os serviços secretos britânicos, que voltaram a recorrer aos seus serviços no fi nal dos anos 30, quando começava a tornar-se claro que Hitler se preparava para a guerra. Consciente de que era vital criar um centro de decifração efi caz, o GCCS pediu a estes responsáveis das duas principais universidades inglesas que indicassem os professores e estudantes mais dotados.

Alastair Denniston, o carismático director do departamento, cuja aversão à burocracia e a tarefas administrativas era célebre, recebeu uma lista de 50 nomes, entre os quais se incluía o de Tolkien, então professor de Anglo- Saxão em Oxford, que foi um dos 13 escolhidos que aceitaram submeter-se a treinos e testes para eventualmente vir a integrar o GCCS. Que o reitor de Oxford se tenha lembrado de Tolkien, não admira. Além do inglês, Tolkien conhecia a fundo mais de uma dúzia de línguas vivas e mortas, incluindo o grego antigo, o latim, o galês, o gótico, o islandês antigo ou o finlandês, para só referir algumas das menos óbvias. E, claro, já andava a criar algumas da sua própria lavra, como o quenya campeões de xadrez ou especialistas de palavras cruzadas. Está documentado que um dos testes de aptidão colocados aos candidatos a Bletchley Park, onde funcionou, durante a Segunda Guerra, o principal centro do GCCS, consistia em se ser capaz de resolver as palavras cruzadas do Telegraph em menos de doze minutos.

Apesar de se ter candidatado aos treinos e de o seu talento ter sido imediatamente reconhecido, Tolkien recusou o convite. Se tivesse aceitado, teria feito parte da épica batalha intelectual travada pelos homens e mulheres de Bletchley Park - no fi nal da guerra, trabalhavam lá nove mil pessoas -, que conseguiram desvendar os códigos criados pelas máquinas de cifra Enigma e Lorenz, usadas pelos nazis nas suas transmissões, o que permitiu, por exemplo, salvar comboios de navios aliados dos ataques dos submarinos alemães.

Mas a verdade é que Tolkien, que criara uma aversão à tecnologia durante a Primeira Guerra, testemunhando nas trincheiras o fim que lhe podia ser dado - não é por acaso que a missão do protagonista de O Senhor dos Anéis, Frodo, não é a de lutar directamente com o mal, mas sim a de destruir a tecnologia que lhe confere poder -, talvez não tivesse apreciado muito trabalhar com o gigantesco e ruidoso computador Colossus, criado sob a supervisão do matemático Alan Turing para decifrar os códigos nazis: uma máquina que perfurava símbolos em tiras de papel a uma velocidade de 25 mil caracteres por segundo.

Esses três dias em que Tolkien treinou para espião talvez não tenham sido, no entanto, tempo perdido. Basta pensarmos em algumas personagens de O Senhor dos Anéis, como o repulsivo espião free-lancer Gollum ou o traidor Grima, que espiava o seu rei ao serviço do mago Saruman. Já para não falar desse momento crucial da narrativa, quando, à entrada das minas de Mória, é preciso decifrar não apenas as runas gravadas na porta, mas também a charada que elas escondiam.