Casas portuguesas

O principal trunfo de "As Operações SAAL" está na clareza com que aborda um tema particular e circunscrito, entendendo-o e integrando-o, em simultâneo, como parte de um processo mais vasto. Explicando melhor: o filme de João Dias investiga, trinta e tal anos depois, o que foram, como se fizeram e que efeitos tiveram as "operações SAAL [Serviço Ambulatório de Apoio Local]", um projecto lançado durante os governos do PREC com o objectivo de responder, rapidamente, às necessidades de alojamento ou realojamento das populações mais carenciadas.

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O principal trunfo de "As Operações SAAL" está na clareza com que aborda um tema particular e circunscrito, entendendo-o e integrando-o, em simultâneo, como parte de um processo mais vasto. Explicando melhor: o filme de João Dias investiga, trinta e tal anos depois, o que foram, como se fizeram e que efeitos tiveram as "operações SAAL [Serviço Ambulatório de Apoio Local]", um projecto lançado durante os governos do PREC com o objectivo de responder, rapidamente, às necessidades de alojamento ou realojamento das populações mais carenciadas.


Na prática, tratava-se de pôr os arquitectos e os engenheiros no terreno, em colaboração directa com as pessoas que depois iam habitar as casas, em cuja construção acabavam, em muitos casos, por ter um papel determinante. Estruturando-se em torno dos depoimentos e das memórias de muitíssimos intervenientes (de Nuno Portas, então Secretário de Estado da Habitação e Urbanismo, a moradores, passando pelos arquitectos, Siza Vieira, Souto Moura, Manuel Vicente, Alexandre Alves Costa, entre muitos outros), "As Operações SAAL" reaviva um pedaço pouco divulgado da história portuguesa recente, e fá-lo de maneira séria e, sobretudo, atenta às suas implicações e ramificações no contexto do PREC: as minudências (ou o que hoje parecem minudências) de carácter político e burocrático, frequentemente fontes de conflito, ou os pormenores idiossincráticos (que levam a que seja possível distinguir um "SAAL Norte" e um "SAAL Sul"). E sobretudo as questões ideológicas, que se hoje parecem microscópicas naquele contexto podiam ter uma amplitude desmesurada, mas que encaminham o filme para um entendimento do SAAL como uma espécie de "interpretação da Revolução" na área do urbanismo e da arquitectura - como quando se fala da necessidade de envolver as populações nos próprios projectos de concepção arquitectónica, por se entender que o conhecimento científico especializado não devia ser "imposto". Por tudo isto, é um contributo documentalmente interessantíssimo; só é pena que careça de outro tipo de habilidade, ou de agilidade, que o arrancasse à sua estrutura formatada e por vezes demasiado próxima da que encontraríamos num programa concebido para TV. Por outro lado, é verdade que na televisão há cada vez menos lugar para este tipo de trabalho aprofundado sem empolamento nem "espectáculo" gratuito - pelo que, provavelmente, para o ver será mesmo preciso aproveitar esta semana única de exibição.