Lista de "espiões" disponível nos computadores da Presidência do Conselho de Ministros
Uma falha de segurança que faz lembrar a revelação, em 1999, dos espiões do então SIEDM (a antecessora do actual serviço), numa lista enviada a deputados da Assembleia da República e que resultou na demissão do ministro da Defesa Veiga Simão.
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Uma falha de segurança que faz lembrar a revelação, em 1999, dos espiões do então SIEDM (a antecessora do actual serviço), numa lista enviada a deputados da Assembleia da República e que resultou na demissão do ministro da Defesa Veiga Simão.
A situação agora verificada foi criada depois de o director-geral do SIED, Jorge Silva Carvalho, ter feito um pedido "não classificado", em Agosto, à PCM de cartões de livre-trânsito para todos os dirigentes daquela "secreta", pedido que fez acompanhar dos nomes e das respectivas fotografias.
A secretaria-geral da PCM despachou o pedido em Outubro, solicitando um parecer jurídico sobre o pedido de livre-trânsito "a distribuir pela PCM até CD [Conselho Directivo] inclusive", afirmando ter prometido que iria ponderar a questão "até porque 'de mistério' não há nada". Acrescentava ainda que se devia "confrontar o que existe com o que a lei prevê para tentar organizar uma proposta que preveja os SIRP/SIS/SIED".
Os serviços da PCM elaboraram em Dezembro um parecer considerando que, de acordo com a lei, só o secretário-geral do SIRP tem competência para "determinar os meios de identificação dos membros do seu gabinete, funcionários e agentes do SIED, do SIS e das estruturas comuns". Mas os cartões pedidos acabaram por ser emitidos, não se sabe por quem, por que motivos e em que condições, e reproduzidos no sistema informático da PCM. Este caso já originou um pedido de esclarecimentos do BE.
"A assumida não confidencialidade dos cartões emitidos para os dirigentes do SIED e a divulgação das respectivas fotos no sistema informático da PCM corresponde a uma nova forma de apresentação dos ditos funcionários? Ou corresponde a mais um lapso caricato e bem elucidativo do nível de eficiência e confidencialidade dos hiperserviços de segurança do hipersecretário-geral?", questiona em requerimento o deputado bloquista Fernando Rosas.
Ao PÚBLICO, Rosas levanta dúvidas sobre a motivação do pedido de livre-trânsito, que tanto pode dar acesso a cantinas, recintos desportivos ou de espectáculo - como de facto dão -, como servir de "segunda identidade" para encobrir os "espiões". O que, aliás, pode acontecer à luz da lei orgânica do SIRP, que prevê mesmo a emissão de "documentos legais de identidade alternativa", mas apenas para operacionais e não para dirigentes das "secretas", e ainda mediante protocolo entre o serviço de informações e a entidade pública responsável.
A lista que esteve disponível na intranet da PCM - a que o PÚBLICO teve acesso - identifica o director-geral e a directora-geral adjunta do SIED, ambos de nomeação governamental, assim como sete directores de serviços e 14 chefes de divisão. É possível que estas categorias possam não corresponder à realidade, uma vez que a própria lei prevê a possibilidade de as identidades e categorias serem codificadas "por motivos de conveniência de serviço e segurança".
O PÚBLICO perguntou à PCM para que fins podiam ser utilizados os livre-trânsitos emitidos por aquela instituição e se esses cartões estavam disponíveis na intranet da Presidência, mas não obteve qualquer resposta, sendo encaminhado para o SIRP, apesar de na pergunta não ter sido feita qualquer referência aos serviços de informações.
Colocadas as questões ao SIRP e ao SIED, também não obteve qualquer esclarecimento. No entanto, segundo a agência noticiosa Lusa, o SIRP considera do "foro disciplinar e criminal" a eventual divulgação da identificação de elementos dos serviços secretos militares no sistema informático da Presidência do Conselho de Ministros.
Contactado pelo PÚBLICO, o presidente do Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações, o deputado socialista Marques Júnior, afirmou desconhecer totalmente a situação. Mas face aos dados descritos, garantiu que o órgão a que preside, que funciona na AR, analisará o caso e as medidas mais adequadas a tomar.
A centralização dos serviços de informações da República e de toda a cúpula do sistema de segurança interna na PCM, através de dois secretários-gerais que dependem directamente do primeiro-ministro, tem sido muito criticada pela oposição. Mas tanto a Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa, aprovada já pelo anterior Governo PSD/CDS-PP no tempo de Durão Barroso, como a Lei Orgânica do SIRP, de 2007, e a Lei de Segurança Interna, aprovada no ano passado, acentuaram este modelo.