Técnicas que lideraram avaliação ambiental do Freeport ignoram reunião com José Sócrates e os promotores
Segundo alegações contidas na investigação ao licenciamento, a reunião terá decorrido dia 17 de Janeiro e contado com a participação também de técnicos ambientais e autárquicos. Na semana passada, Sócrates confirmou ter estado no encontro.
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Segundo alegações contidas na investigação ao licenciamento, a reunião terá decorrido dia 17 de Janeiro e contado com a participação também de técnicos ambientais e autárquicos. Na semana passada, Sócrates confirmou ter estado no encontro.
Mas Fernanda Vara, ex-directora regional do Ambiente, que na altura tutelava a avaliação do Freeport, disse ontem que não se recorda do encontro e que estranha o facto. "Reuniões como estas não havia às centenas, e eu não me lembro", afirmou ao PÚBLICO. "Não sei se estive lá."
Fernanda Vara, hoje ligada ao Turismo de Portugal, só ouviu falar da reunião agora, com as notícias sobre a investigação. "Também andei a tentar perceber o que era esta reunião. Mas não consta do processo, não existe nenhuma referência", afirma.
Já Antonieta Castaño, técnica que presidia à comissão de avaliação, tem mais certezas: "Não esteve na reunião do ministério, nem se recorda se terá havido", segundo informação da assessoria de imprensa da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo.
O licenciamento ambiental do Freeport está a ser investigado em Portugal e no Reino Unido, por suspeitas de corrupção. Num pedido de informações de Londres aos investigadores portugueses, é referida, como alegação, a realização de outra reunião, no mesmo dia, apenas com Sócrates e os promotores, onde terá sido apresentado um pedido de "luvas" para a aprovação ambiental.
Até agora, ninguém confirmou a data exacta da primeira reunião, que a carta rogatória da polícia britânica situa a 17 de Janeiro. O ex-secretário de Estado do Ambiente, Rui Gonçalves, afirma que esteve presente, mas rejeita aquela data. "Tenho a certeza absoluta", disse ao PÚBLICO, explicando que estava no Japão, numa conferência, e só regressou dia 19.
José Inocêncio, ex-presidente da Câmara de Alcochete, também não sabe apontar uma data concreta para o encontro, que ele próprio afirma ter pedido. "Não me lembro. Terá de ter sido depois do dia 7, depois que tomei posse. Mas o Ministério do Ambiente é que deve saber a data." No ministério, porém, não há qualquer registo da reunião, segundo o assessor de imprensa Joaquim Calé.
O estudo de impacte ambiental do Freeport - que viria a ser aprovado a 14 de Março de 2002 - foi entregue pelos promotores à Câmara de Alcochete no dia 18 de Janeiro. A sua avaliação, coordenada pela Direcção Regional do Ambiente, começou no mesmo dia e terminou em menos de dois meses. Foi o processo mais rápido desde 1995, segundo dados da Agência Portuguesa do Ambiente.
Fernanda Vara confirma a existência de um despacho seu a pedir "urgência" na análise, mas frisa que este é um procedimento "habitual entre os altos funcionários da administração pública", quando há uma solicitação neste sentido. No caso, acrescenta Vara, foi a câmara a solicitar "urgência, dados os antecedentes do processo". O primeiro estudo ambiental foi devolvido aos promotores em 2000 e o segundo chumbado em Dezembro de 2001.
Mas José Inocêncio também não se lembra de ter feito tal pedido. "Não faço a mínima ideia. Foi uma coisa que se passou há sete anos. Para mim já passou, o que ficou foi a obra que fiz", disse ao PÚBLICO.
O caso Freeport foi um dos assuntos abordados, ontem, numa reunião entre Cavaco Silva e o procurador-geral da República, Pinto Monteiro, no Palácio de Belém. À saída, Pinto Monteiro limitou-se a afirmar que tinham sido abordados "variadíssimos casos" de justiça que "mais interessam ao país".