O símbolo de Angola está em perigo
Sendi Baptista é uma bióloga angolana que se tem dedicado à conservação destes animais endémicos de Angola. Em Dezembro passado, defendeu a tese de mestrado na Universidade de Lisboa sobre este tema e sabe que as palancas são agora poucas. Muito poucas. “No Parque Nacional da Cangandala (PNC) serão cerca de 10 animais, e na Reserva Integral do Luando (RIL) esperamos que existam aqui cerca de 100 a 150 animais, dada a maior área dessa reserva.” Sendi diz “esperamos” porque “a estimativa para a RIL é um pouco mais grosseira devido a dispormos de menos dados”.
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Sendi Baptista é uma bióloga angolana que se tem dedicado à conservação destes animais endémicos de Angola. Em Dezembro passado, defendeu a tese de mestrado na Universidade de Lisboa sobre este tema e sabe que as palancas são agora poucas. Muito poucas. “No Parque Nacional da Cangandala (PNC) serão cerca de 10 animais, e na Reserva Integral do Luando (RIL) esperamos que existam aqui cerca de 100 a 150 animais, dada a maior área dessa reserva.” Sendi diz “esperamos” porque “a estimativa para a RIL é um pouco mais grosseira devido a dispormos de menos dados”.
A palanca negra gigante está protegida desde 1933 quando, em Londres, se assinou a Convenção para a Protecção da Flora e Fauna Africana. Desde há muitos anos que a sua população tem vindo a diminuir e diversos investigadores têm proposto medidas para a sua conservação. Grande parte dos apelos caíram em saco roto. Entre esses investigadores estiveram João Augusto Silva e Crawford Cabral que propuseram a transferência de alguns animais para outras zonas de Angola, de forma a permitir a sua sobrevivência.
“Entre 1975 e 2002, Angola esteve em guerra, tendo sido afectado quase todo o território nacional, incluindo as áreas de conservação. Durante esse período, houve apenas rumores de terem sido avistadas palancas negras gigantes”, escreve Sendi Baptista na sua tese. “Até muito recentemente, as últimas observações confirmadas foram as realizadas em 1982 por Richard Estes no Parque Nacional da Cangandala.”
Em Setembro de 2003, a Universidade Católica de Angola, com o apoio do Governo angolano, de empresas e organizações sem fins lucrativos, iniciou o Projecto de Conservação da Palanca Negra Gigante, no qual trabalha agora Sendi Baptista. Câmaras ocultas, accionadas por infra-vermelhos, colocadas por investigadores deste projecto junto a morros de térmitas conseguiram, em 2005, o que ninguém conseguia há mais de 20 anos: fotografar uma manada de palancas negras gigantes, enquanto de se alimentavam de solo. “Desde essa altura, novas fotografias da manada são obtidas regularmente todos os meses”, disse ao PÚBLICO Sendi Baptista. “A situação poderá ser considerada controlada mas ainda assim muito preocupante devido ao reduzido número de animais.”
O hábito das palancas negras de ingestão de solo é precisamente o tema da tese de Sendi Baptista. As palancas não são os únicos animais a comer terra e as hipóteses defendidas pelos investigadores para este comportamento são essencialmente duas: suplemento nutricional ou desintoxicação. A tese de Sendi Baptista enquadra-se mais na primeira hipótese e defende que as palancas negras gigantes consomem solo como suplemento nutricional, preferindo áreas com grande concentração de sal. Estas salinas, conclui Sendi Baptista, “são essenciais para a distribuição da palanca negra gigante”.
Actualmente, Sendi Baptista já regressou a Angola e continua envolvida no projecto de conservação da palanca negra gigante. Acredita que é possível salvar a espécie, mas reconhece que é uma tarefa muito difícil. “Os números no PNC são realmente muito baixos e contando só com essa população, a conservação desta subespécie seria bastante difícil”, diz. “Pensamos que o futuro está na RIL, que sempre foi a área com maior número de animais, onde os números serão ainda suficientes para manter a variabilidade genética. O futuro da população da Cangandala deverá passar pela introdução de animais provenientes da RIL.”
Sobre as propostas feitas há alguns anos de reintrodução da palanca negra gigante em algumas zonas de Angola que não contêm estes animais, Sendi Baptista é cautelosa: “Nunca houve estas trasladações e achamos que este não seria o momento apropriado para o fazer. É importante concentrarmo-nos nas áreas onde a palanca existe e conservar a partir daí”.
A palanca negra gigante enfrenta inúmeros desafios à sua sobrevivência, entre os quais os caçadores furtivos. Às primeiras imagens de 2005, seguiram-se diversas observações de manadas em estado selvagem. Pedro Vaz Pinto, coordenador do projecto de conservação, e Sendi Baptista já viram os animais ao vivo, mas sabem que a sua observação e monitorização não basta para os salvar da extinção.
Uma das ameaças mais recentes é a hibridação com a palanca vermelha, espécie que ocorre na mesma área, reflexo dos números muito reduzidos da população. A própria organização da espécie, com manadas constituídas essencialmente por fêmeas e crias, pode propiciar o contacto com machos desta espécie. “Há mais de um ano que não vemos machos adultos de palanca negra gigante e toda esta situação preocupa-nos muito”, diz Sendi Baptista.
Apesar das dificuldades, Pedro Vaz Pinto e Sendi Baptista estão confiantes que este projecto pode ajudar a sobrevivência da palanca negra gigante. “Neste momento o projecto já actua no sentido de reverter a situação actual. A monitorização da população do PNC está a ser feita, será criado um santuário para manter a população e controlar a sua reprodução. O trabalho de sensibilização para a situação do animal é contínuo”, explica Sendi Baptista.“A situação da palanca negra gigante é crítica, mas acreditamos que, se o esforço continuar como até aqui, é possível salvá-la da extinção”.