Morreu o escritor americano John Updike
O escritor norte-americano John Updike morreu ontem, de manhã aos 76 anos, no Massachusetts, vítima de cancro de pulmão. Acreditava que escrever o ajudava a tornar o mundo mais real - para si próprio e para os leitores.
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O escritor norte-americano John Updike morreu ontem, de manhã aos 76 anos, no Massachusetts, vítima de cancro de pulmão. Acreditava que escrever o ajudava a tornar o mundo mais real - para si próprio e para os leitores.
"Era um dos nossos maiores escritores e vamos sentir muito a sua falta", disse à imprensa Nicholas Latimer, da editora Alfred A. Knopf. Pelos romances "Coelho Enriquece" (1982) e "Rabbit at Rest" (1991) da famosa pentalogia Coelho, Updike recebeu dois Pulitzer e ao longo da vida nunca lhe faltaram prémios. Recebeu ainda, entre outros, o National Book Award in Fiction, o American Book Award e o National Book Critics Circle Award For Fiction. É verdade que nunca recebeu o Nobel mas deu-o a Henry Bech, uma das suas personagens carismáticas, um escritor judeu que aparece em alguns dos seus livros ("Bech, a Book"; "Bech Is Back" e "Bech at Bay").
O seu último romance, publicado em Outubro nos EUA. é "The Widows of Eastwick", em que regressa às histórias das três bruxas de Eastwick. Alexandra, Jane e Sukie, que conhecemos em "As Bruxas de Eastwick" (1984). Agora, 30 anos depois, elas são viúvas. "The Widows of Eastwick"é a sequela de um livro que foi adaptado ao cinema, em 1987, por George Miller, com Jack Nicholson, Susan Sarandon, Michelle Pfeiffer e Cher.
Regressar às mesmas personagens ou acompanhá-las ao longo das sinuosas curvas da vida era uma das características do escritor. Elas envelheciam, ele acompanhava-as. Pelos seus livros passavam os subúrbios norte-americanos, os casamentos, os divórcios e o sexo. As "pequenas cidades americanas, a classe média protestante", como disse um dia. Mas também se aventurou pelo Brasil e escreveu um romance que se passa em África.
Um artigo no "site" da Academy of Achievement cita um ensaio autobiográfico em que Updike identifica "o sexo, a arte e a religião" como os três grandes segredos da experiência humana. Autor de mais de 50 obras, prolixo, dedicou-se a todos os géneros. Escreveu romances, contos, poesia, ensaios, memórias e fez crítica literária. Ficou famoso com a publicação em 1960, de "Corre, Coelho", onde aparece pela primeira vez a personagem Harry "Coelho" Angstrom, ex-estrela de basquetebol que começa a sentir que a sua vida não faz sentido. Foi com esse livro, já se disse, que libertou a escrita norte-americana da utilização das formas verbais do passado, utilizando sempre o presente - o que passou a ser, depois, um"cliché" entre os autores mais novos.
Updike acompanhou Harry "Coelho" Angstrom ao longo de vários livros. O seu editor, Alfred A. Knopf, aconselhou-o a fazer algumas alterações nesse livro às descrições da vida sexual de Harry para não ser acusado de obscenidade. Ele assim fez e anos mais tarde a edição britânica decidiu publicar o texto original.
John Updike nasceu na Pensilvânia em 1932. Na adolescência era gago e acreditava que a capacidade de escrita lhe vinha dessa dificuldade em falar. Foi a mãe, aspirante a escritora, que o incentivou a escrever e a desenhar. O pai era professor de matemática. Acabou por se licenciar em Harvard (em língua inglesa) e estudou depois Artes Plásticas em Oxford, Inglaterra. A sua carreira de escritor começou em 1954, quando a revista "The New Yorker" publicou um dos seus contos e um dos seus poemas. Foi depois de regressar de Inglaterra que aceitou o convite para fazer parte da equipa da revista. Ali ficou dois anos, altura em que se mudou para o Massachusetts (" a América real parecia-me estar ali", disse mais tarde). Decidiu ser escritor a tempo inteiro.
A revista "Time" colocou-o na capa de um dos seus números depois da saída, em 1968, do romance "Casais Trocados" - retrato das relações complicadas entre vários casais dos subúrbios. E regressou aos 50 anos."Updike é um dos melhores, mais consistentes e mais humanos escritores de língua inglesa da segunda metade do século XX", escreveu o "The Independent on Sunday" Por vezes foi acusado de ser misógino, racista e apologista do "establishment" (Norman Mailer atacou-o por considerar que do ponto de vista literário era um autor apreciado pelos leitores que não percebiam nada de literatura).
Membro da American Academy of Arts and Letters desde 1976, recebeu em em 2003 a National Medal for Humanities, na Casa Branca, juntando-se a um grupo restrito de notáveis que foram contemplados com a medalha. "O Centauro", " O Terrorista" e "Procurai a Minha Face", "Regressa, Coelho", "Brasil" são outras das suas obras traduzidas em português.