Três quartos das pensões de reforma estão abaixo do salário mínimo nacional

Fotogaleria

O outro quarto reparte-se entre aqueles que têm pensões entre um e dois salários mínimos e os que recebem mais do que dois salários mínimos. Os dados compilados revelam, segundo o estudo, uma distribuição de pensões "profundamente desequilibrada".

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O outro quarto reparte-se entre aqueles que têm pensões entre um e dois salários mínimos e os que recebem mais do que dois salários mínimos. Os dados compilados revelam, segundo o estudo, uma distribuição de pensões "profundamente desequilibrada".

No sector privado, o grupo de pensionistas com pensões abaixo de um salário mínimo nacional (SMN, 426 euros em 2008) abrange 1,9 milhões de pessoas, num total de 2,1 milhões de pensionistas por velhice e invalidez. Destes, um quinto são pessoas que pouco descontaram ao longo da sua vida activa - agricultores e outros regimes fracamente contributivos. Mas três quartos, ou seja, cerca de 1,4 milhões de pessoas, vêm do regime geral da Segurança Social. Efectuaram os devidos descontos sociais, mas recebiam salários tão baixos que se traduziram em pensões baixas. A este grupo juntam-se ainda 94 mil ex-funcionários públicos.

No segundo grupo de reformados - com pensões entre um e dois SMN - encontram-se 200 mil reformados do sector privado e 80 mil ex-funcionários públicos.

Finalmente, vem o terceiro grupo com pensões mais elevadas (acima de 2 SMN). São mais de 300 mil portugueses, dois terços dos quais vindos da Função Pública, a que se juntam entre 100 mil e 120 mil pessoas do sector privado. Este total não inclui os bancários que têm - ainda - um esquema de protecção social à parte. Em Dezembro de 2007, as pensões acima de 750 euros abrangiam 239 mil ex-funcionários públicos, ou seja, cerca de 60 por cento do total de pensionistas da função pública. Desses, 80 mil recebiam pensões acima dos dois mil euros mensais.

Na base desta distribuição estão diversas situações. É o caso da diferente fórmula de cálculo das pensões entre o sector privado e o público (diferença atenuada desde 1993); os baixos salários no sector privado e os salários mais elevados na Função Pública relativos a profissões com maiores habilitações médias (saúde, educação, etc); a omissão de rendimentos à Segurança Social, a relativa juventude do sistema de protecção social que se traduz em pequenas carreiras contributivas e, consequentemente, em baixas pensões. Dados que, aliás, nem sempre são pacíficos (ver caixa).

Mas o desequilíbrio na distribuição das pensões retrata, sobretudo, o problema do elevado peso das pensões mínimas, as suas actualizações e a situação social de centenas de milhares de pessoas, associada a níveis elevados de pobreza.

Pensões mínimas

As pensões mínimas do regime geral estão actualmente fixadas em quatro escalões. Variam entre 220,99 euros (para quem tenha entre cinco e 12 anos de descontos) e 388,19 euros (mais de 30 anos de descontos). E, em muitos casos, o Estado tem de complementar com dinheiro dos impostos para que os pensionistas recebam a respectiva pensão mínima que, de outra forma, ficaria abaixo desse limite mínimo.

Em Dezembro de 2007, havia 906 pensionistas de velhice e invalidez do regime geral com pensões mínimas. E destes 382,9 mil tinham feito menos de 15 anos de descontos e 216,5 mil entre 15 e 20 anos. Na Função Pública, apenas uma minoria recebia pensões mínimas.

Além de afectar grandes grupos de pensionistas, o problema - segundo a CGTP - prende-se com a actualização das pensões. De 2001 a 2007, a pensão média cresceu 39 por cento, atingindo os 437 euros. Mas a pensão mínima passou de 180 euros em 2001 para 230 euros em 2007 - ou seja, mais 27 por cento. Em 2009, as pensões mínimas vão variar entre 243,36 euros (menos de 15 anos de descontos) e 374,36 euros (mais de 30 anos de descontos).

Na Função Pública, as actualizações foram mesmo abaixo da inflação desde 2000. A maior quebra verificou-se em 2003 (Governo PSD/PP). As pensões superiores a 1008 euros foram congeladas e as restantes tiveram um aumento de 1,5 por cento.

A CGTP salienta, por outro lado, que desde 1995 foram adoptadas medidas para atacar a pobreza - criação do rendimento mínimo garantido (1995), actualizações extraordinárias de pensões degradadas, melhoria das pensões dos agricultores, complemento extraordinário de solidariedade (2001) e complemento solidário para idosos (2006).

Mas desde 2008 a evolução da pensão mínima - tanto no sector privado como no público - passou a ser determinada pela evolução do Indexante dos Apoios Sociais (IAS). O IAS foi criado com o apoio das centrais sindicais e visou desarticular a evolução do SMN do crescimento das pensões, permitindo uma recuperação do poder de compra do SMN.

Mas se o IAS criou um automatismo na actualização das pensões, por outro lado, impede a evolução mais rápida das pensões em momentos depressivos. O IAS está dependente da evolução do produto interno bruto (PIB) e da inflação. Quando o PIB cresce pouco (menos de 2 por cento, como tem acontecido nos últimos anos), o IAS sobe de acordo com a inflação, ou seja, apenas mantém o seu poder de compra.

IGFSS vai corrigir Conta da Segurança Social

O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS) vai corrigir os valores publicados na Conta da Segurança Social de 2006 e de 2007, relativos à carreira média de descontos dos pensionistas, na sequência de uma questão do PÚBLICO.

Até 2005, a evolução do número de anos de descontos sociais de um pensionista era ascendente e reflectia a progressiva maturidade do sistema. Quem se reformava tinha cada vez mais anos de descontos, mesmo que ainda longe dos 40 anos necessários para ter uma pensão completa. Em 2005, era de 23,4 anos de descontos para a Segurança Social.

Ora, segundo os dados do IGFSS citados pela CGTP, essa carreira média caiu para 21 anos em 2006 e para 21,5 anos em 2007, valores próximos dos verificados em 2002.

Qual era a razão dessa quebra? Significava que mais pessoas se estavam a reformar "antes de tempo", de forma antecipada, mesmo que com quebras de rendimento? E porquê? Mas o Ministério do Trabalho rebateu os valores: "Não correspondem a dados oficiais divulgados por este ministério". Em vez desses, o ministério enviou ao PÚBLICO duas séries de números - uma relativa à carreira contributiva dos pensionistas que em cada ano entraram na reforma e uma outra relativa aos pensionistas existentes em cada ano. Na trajectória que mais se aproximava do IGFSS, a evolução mantinha a trajectória contínua e ascendente (ver gráfico).

O PÚBLICO pediu então ao ministério para explicar a discrepância entre os "dois" valores oficiais, que supostamente teriam a mesma fonte de informação (Centro Nacional de Pensões). O gabinete de imprensa respondeu que a questão do PÚBLICO alertara para um erro que passara desapercebido - durante dois anos - e que o IGFSS iria elaborar uma errata à Conta da Segurança Social de 2006 e de 2007.